João Santos Filipe Grande Plano MancheteFábrica de Curtumes | CCAC iliba Administração Pública de ilegalidades Apesar de o prazo para aproveitar o terreno ter sido prolongado várias vezes, sem recuperação do lote ou multas aplicadas “de forma rigorosa”, o Comissariado contra a Corrupção concluiu que o processo do terreno da Fábrica dos Curtumes foi tratado de acordo com a lei. Não foi revelado se ficaram por pagar multas à RAEM Apesar de a Administração Pública não ter aplicado “com rigor” as multas para atrasos na construção, nem ter recuperado o terreno da Fábrica de Curtumes na Rua dos Pescadores, o Comissariado contra a Corrupção (CCAC) considera que “não se verificaram aparentemente ilegalidades ou irregularidades administrativas”. A investigação à forma como foi gerido o processo da Fábrica de Curtumes começou em 2018, quando a Associação Novo Macau apresentou uma queixa sobre o terreno, e as conclusões foram dadas a conhecer na sexta-feira. Num comunicado, o CCAC afirma ter recebido denúncias de “diversas associações”. As queixas prendiam-se com três aspectos: o facto de o terreno não ter sido recuperado depois de terminado o prazo de aproveitamento; a não aplicação da Lei do Planeamento Urbanístico ao projecto; e ainda o cálculo do prémio de reaproveitamento. Segundo o CCAC, o terreno foi atribuído por aforamento e a título definitivo, mas não indica a data nem o sujeito da atribuição. A informação que consta no comunicado aponta que em 1989 a Companhia de Construção Civil Chong Fok (Macau) se apresentou como “titular do respectivo direito” e pediu que a finalidade do terreno da Fábrica de Curtumes fosse alterada para permitir a construção de habitações e espaços comerciais. Posteriormente, a concessão do terreno foi transferida para a empresa Nam Fong e mais tarde para a Companhia Trust Art, a actual concessionária. As datas das transferências da concessão não foram reveladas pelo CCAC. Multas por pagar? Sobre o não aproveitamento do terreno nos prazos legais, o CCAC reconhece que houve “várias vezes autorizações de prorrogação do prazo de aproveitamento” entre 1993 e 2003 e ainda entre 2004 e 2014. A data da última prorrogação, em 2014, não é especificada no comunicado, pelo que não permite saber se foi autorizada antes da entrada em vigor da nova lei de terras. No entanto, parecer ser esse o entendimento do CCAC: “Em 2018, foram aditadas, ao contrato de concessão revisto do lote da Fábrica de Curtumes, as regras em relação à caducidade da concessão do terreno e à devolução do terreno. Em Março de 2022, foi emitida a licença de utilização, pela então DSSOPT, à Companhia Trust Art, depois do aproveitamento do terreno dentro do respectivo prazo de aproveitamento”, apontou o CCAC. “Assim, não se verificou qualquer violação da lei nem incumprimento das disposições contratuais”, acrescentou. O CCAC reconhece que a “Administração também não aplicou, com rigor, as multas previstas nas disposições contratuais”. Contudo, o órgão liderado por Chan Tsz King não indica no comunicado o montante que ficou por cobrar. Na queixa de 2018, a Associação Novo Macau estimava que teria ficado por cobrar cerca de 16,6 milhões de patacas. Planta de outros tempos Quanto à não aplicação da Lei do Planeamento Urbanístico de 2014 ao projecto de arquitectura no terreno, o CCAC considera a decisão correcta, mesmo em 2018. Esta interpretação fez com que o projecto não tivesse de ser aprovado pelo Conselho do Planeamento Urbanístico (CPU), como se tornou prática com a lei. “O CCAC verificou que, a aprovação do projecto de arquitectura do lote da Fábrica de Curtumes, que teve lugar em 2018, baseou-se nas condições de construção previstas na planta de alinhamento oficial que foi novamente elaborada em Maio de 2010, com uma óbvia antecedência de 4 anos relativamente à entrada em vigor da Lei do Planeamento Urbanístico”, foi justificado. “Por isso, o CCAC considera que não existe qualquer planeamento fora do prazo definido ou fuga à Lei do Planeamento Urbanístico, praticadas pelos serviços competentes”, foi acrescentado. O CCAC admite que entre 2010 e 2018 foram realizadas várias alterações ao projecto de arquitectura, mas que estas nunca implicaram modificar as “condições de construção”. O preço certo A última polémica analisada pelo CCAC focou o método de cálculo do prémio da concessão do lote e ainda a dedução do montante pago do prémio, devido à redução da área de aproveitamento. “Relativamente ao método de cálculo do prémio de concessão de terrenos do lote em causa, no entender do CCAC, não se verificou qualquer erro na aplicação da lei por parte da então DSSOPT [Direcção dos Serviços de Solos, Obras Públicas e Transportes]”, é concluído. O cenário é diferente para a redução do montante: “a lógica utilizada no cálculo da dedução do montante do prémio a pagar carece de ponderação sobre a razoabilidade e a justiça na distribuição de interesses”, é indicado. Apesar das críticas sobre a falta de razoabilidade e justiça, o comunicado do CCAC não apresenta os números concretos dos cálculos, razão pela que não se sabe o valor pago e descontado. Porém, a decisão da DSSOPT é criticada pelo CCAC porque teve “apenas em consideração a defesa da estabilidade e da segurança do contrato de concessão de terrenos”, deixando de fora a “situação socio-económica da altura em que foi aprovada a alteração do projecto de arquitectura e os lucros esperados”. O CCAC recomendou também à Administração Pública que siga devidamente as leis para que “o valor do mercado dos terrenos de Macau possa ser reflectido efectivamente nos prémios de concessão, salvaguardando, com total empenho, os preciosos recursos de solos existentes na RAEM”. Um caso bicudo A polémica em torno do terreno da Fábrica de Curtumes (ou Fábrica de Couro de Vaca) começou em 2009, quando o Tribunal de Última Instância (TUI) ligou as obras no terreno ao pagamento de subornos no caso Ao Man Long, ex-secretário para os Transportes e Obras Públicas que foi condenado a 29 anos de prisão na sequência de vários casos de corrupção. Nesse ano, a DSSOPT declarou a “caducidade da respectiva licença de obra”, quando 15 andares do prédio já tinham sido erigidos. Ao mesmo tempo, permitiu que a estrutura fosse mantida, em vez de obrigar à demolição total. Finalmente em 2018, a empresa Trust Art apresentou um novo pedido, que foi aprovado, de planta de alinhamento que permitiu terminar a construção do prédio com um pódio de seis pisos e duas torres com 13 pisos. Desde o ano passado que o projecto recebeu licença de utilização. No relatório divulgado na sexta-feira, o CCAC defende a decisão de não obrigar à demolição de um terreno ligado a um dos maiores casos de corrupção da RAEM. “Naquela altura a Administração considerou que a demolição do edifício construído no lote da Fábrica de Curtumes envolveria certos recursos e custos, tendo ainda um impacto objectivo negativo sobre o ambiente, portanto, considerou que a manutenção da situação do edifício construído corresponderia melhor ao interesse público”, é indicado. “Na opinião do CCAC, a decisão da Administração tomada naquele momento pode promover, de alguma forma, o aproveitamento do terreno em causa, cumprindo ainda o princípio do aproveitamento útil e efectivo dos terrenos”, foi acrescentado. O CCAC defende também que “não foi verificada […] qualquer existência do indício de prática de crimes, nem foi confirmada, por enquanto, qualquer existência aparente de ilegalidades ou irregularidades administrativas”. DSSCU “tomou boa nota” da investigação A Direcção dos Serviços de Solos e Construção Urbana (DSSCU) afirmou que irá fazer todos os esforços para rever os “respectivos trabalhos” e actualizar os “coeficientes que servem de base ao cálculo do valor do prémio” pelas concessões. Foi desta forma que a DSSCU, que resultou da separação da Direcção dos Serviços de Solos, Obras Públicas e Transportes (DSSOPT), reagiu à investigação do CCAC. “A DSSCU tomou boa nota das conclusões da investigação do CCAC do terreno onde estava construída a antiga fábrica de couro e envidará os seus maiores esforços para a revisão e optimização integral dos respectivos trabalhos, em particular no que respeita à sucessiva actualização, nos termos legais, dos coeficientes que servem de base ao cálculo do valor do prémio”, prometeu. “Actualmente, a dita actualização está a ser levada a bom porto, encontrando-se já na sua fase final”, foi acrescentado. A direcção liderada por Lai Weng Leong prometeu também esforçar-se para “garantir o estrito cumprimento da Lei de Terras, salvaguardando […] o interesse público”.
Andreia Sofia Silva SociedadeInterpol | Mandado de detenção de Pedro Chiang expirou em 2017 O mandado de detenção do empresário de Pedro Chiang expirou há três anos, confirma o advogado João Miguel Barros, que esclareceu que a detenção do empresário em Lisboa foi um erro. O advogado adianta ainda que, no dia 19 de Novembro, o Tribunal Judicial de Base notificou a Polícia Judiciária de Macau para retirar todos os mandados existentes [dropcap]“U[/dropcap]ma falácia”. É desta forma que João Miguel Barros, advogado de Pedro Chiang, reage à recente detenção, em Lisboa, do empresário, uma vez que o mandado de detenção internacional expirou em 2017. Num comunicado enviado à imprensa, o causídico adiantou ainda que o Tribunal Judicial de Base (TJB) renovou, no passado dia 19, o pedido à Polícia Judiciária (PJ) de Macau para retirar o mandado de detenção da Interpol. Segundo João Miguel Barros, a nova notificação do TJB faz a menção para se retirarem “todos os mandados de detenção que possam existir” em relação a Pedro Chiang. “Sabendo a PJ de Macau que o processo estava prescrito, por que razão não promoveu junto da Interpol a recolha do mandado? Porque razão estando o processo prescrito desde 2017, o alerta vermelho da Interpol foi actualizado em Setembro de 2020?”, questionou. A PJ de Lisboa anunciou a detenção, feita pela Unidade Nacional de Combate à Corrupção, “de um cidadão, de 64 anos de idade, empresário de profissão, para cumprimento de pena de prisão pela prática do crime de corrupção activa”. O empresário prestou declarações na PJ em Lisboa na qualidade de testemunha de um outro processo de investigação. No entanto, as autoridades policiais perceberam que Pedro Chiang era alvo de um mandado de captura internacional e detiveram o empresário, que foi libertado pouco depois. Segundo João Miguel Barros, “mesmo que tivesse [Pedro Chiang] alguma condenação para cumprir – e, repete-se, não tem – não seria possível a sua extradição para Macau por ser cidadão português”. Isto porque “Portugal não extradita os seus nacionais salvo casos contados e excepcionais”. Críticas a Lisboa João Miguel Barros aponta também o dedo às autoridades portuguesas, acusando a PJ de Lisboa de “agir na fronteira do automatismo acrítico ao deter Pedro Chiang”, uma vez que poderia “saber com facilidade que estava perante um grosseiro ‘erro do sistema’, porque isso lhe foi explicado na altura por uma advogada”. Nesta situação, a PJ em Portugal “preferiu o facilitismo de deter e comunicar publicamente um facto substancialmente vazio, o que só a desprestigia”, refere o advogado. Pedro Chiang foi condenado a dez anos e um mês de prisão por corrupção em dois processos conexos ao caso que condenou o ex-secretário para os Transportes e Obras Públicas, Ao Man Long. No entanto, os prazos para o empresário assumir responsabilidades criminais por corrupção prescreveram.
Salomé Fernandes Manchete PolíticaJustiça | Pedro Chiang foi detido em Lisboa a pedido de Macau O empresário Pedro Chiang foi detido em Lisboa, a pedido das autoridades de Macau. A Polícia Judiciária portuguesa anunciou que a detenção será para cumprir pena de prisão pelo crime de corrupção activa, depois de o empresário ter sido condenado à revelia num processo de subornos ao ex-secretário para os Transportes e Obras Públicas Ao Man Long [dropcap]O[/dropcap] empresário Pedro Chiang, condenado na sequência do caso Ao Man Long, foi detido pela Polícia Judiciária (PJ) portuguesa, a pedido das autoridades de Macau. De acordo com a TDM – Rádio Macau, o empresário foi detido em Lisboa, mas já terá sido libertado. Na passada sexta-feira, a polícia portuguesa anunciou a detenção, através da Unidade Nacional de Combate à Corrupção, “de um cidadão, de 64 anos de idade, empresário de profissão, para cumprimento de pena de prisão, pela prática do crime de corrupção activa”. O HM tentou contactar o advogado de defesa de Pedro Chiang, mas até ao fecho da edição não conseguiu confirmar a notícia avançada pela TDM – Rádio Macau. A PJ portuguesa não quis adiantar a identificação do detido, nem acrescentar detalhes ao comunicado da passada sexta-feira. Wong em silêncio Também o gabinete do secretário para a Segurança se esquivou a comentários, não confirmando tratar-se do empresário, nem se a RAEM estaria a procurar extradição. “Não temos informações a prestar em relação ao assunto em causa”, referiu o gabinete de Wong Sio Chak. A confirmar-se que as autoridades de Macau pretendem extraditar o empresário, para que cumpra pena na RAEM, Pedro Chiang poderá ser a primeira pessoa transferida para Macau ao abrigo do acordo de extradição firmado com Lisboa. Em Portugal há mais de uma década, Pedro Chiang foi condenado a mais de 10 anos de prisão em dois processos conexos com o caso Ao Man Long, julgados à revelia, ou seja, sem a presença do arguido.