Biblioteca Central | Atelier Mecanoo repudia acusações de plágio 

Nuno Fontarra, arquitecto responsável pelo projecto vencedor para a nova Biblioteca Central, a erguer no espaço do antigo Hotel Estoril, afasta as acusações de plágio feitas por um residente, de forma anónima, com base em dois projectos elaborados pela Mecanoo para Shenzhen. Nuno Fontarra diz que são esboços totalmente diferentes e que nem sequer se aplica o plágio, por se tratar do mesmo atelier a apresentar os projectos

 

O atelier Mecanoo, autor do projecto da futura Biblioteca Central, está a ser acusado de plágio por um residente que, de forma anónima, assina uma carta na qualidade de “cidadão entusiasta nas questões de arquitectura”, e que foi enviada aos meios de comunicação social.

No documento é comparado o projecto da Biblioteca Central, pensado para o espaço ocupado pelo edifício do antigo Hotel Estoril, na praça do Tap Siac, com dois projectos também desenvolvidos pela Mecanoo para Shenzhen, a Biblioteca e Museu Longhua AA e o Centro Cultural e Cívico de Futian.

“Onde está a singularidade e originalidade? Como se reflecte o projecto na identidade urbana de Macau? Como símbolo cultural da cidade, a Biblioteca Central irá obrigar a gasto de tempo e dinheiro público, então porque é que o projecto transmite às pessoas a ideia de plágio?”

Contactado pelo HM, Nuno Fontarra, arquitecto e principal responsável pelo projecto da Biblioteca Central, afasta as críticas. “Não pode haver plágio de um projecto próprio. [Só vamos responder] se o Governo solicitar alguma resposta da nossa parte. Só seria grave a acusação de plágio mas tudo o resto é relativo, são sugestões. A acusação vai contra a definição de plágio.”

O arquitecto explica ainda que estão em causa projectos completamente diferentes. “Um dos projectos tem uma torre, o que não tem nada a ver, é comparar umas calças com um casaco. E o outro tem prateleiras, é uma biblioteca, mas só por ter livros não quer dizer que seja igual. O edifício por fora não tem nada a ver, por fora tem tijolo. Além de que estes projectos não vão ser construídos, porque não ganhámos os concursos. Tem algum vocabulário nosso, como é óbvio, porque é o mesmo escritório.”

Qualidade sem Pritzker

Na carta enviada às redacções, o autor critica os elevados custos de manutenção do edifício e a disposição do mural, da autoria de Oseo Acconci, lembrando que em três projectos a concurso, dois deles dos ateliers Herzog&Meuron e Grafton Architects, se mantém o mural cá fora, bem como a entrada original.

“Três das quatro propostas mantêm o mural no seu local original. Porque é que o Governo optou pela proposta da Mecanoo, que aponta para uma total demolição do edifício? O antigo Hotel Estoril será, no final, completamente demolido. Porque é que não se escolheu integrar, o máximo possível, o antigo com o novo?”, questionou.

Nuno Fontarra adiantou que o projecto vencedor tem apenas um ano e que deverá ainda ser alvo de ajustes, pelo que nada está fechado. “Temos o projecto do Herzog&Meuron que tem várias opções para o mural, e nós também temos. O projecto não acabou agora e achamos melhor naquela fase colocar o mural dentro do edifício. Mas ainda não tivemos tempo para fazer estudos de engenharia para saber se movemos ou não o mural, se fica danificado ou não.” “A essência do edifício não mudará mas alguns detalhes serão reajustados”, acrescentou ainda.

A carta questiona a excelência do trabalho da Mecanoo e o facto de não ter ganho nenhum prémio Pritzker, ao contrário do Herzog&Meuron. Mas Nuno Fontarra recorda que “houve uma altura em que não tinham o Pritzker [os ateliers] e também foram escolhidos para concursos. Que são escritórios que fazem um excelente trabalho isso é inegável, e eu próprio sou fã do Herzog&Meuron. Não se podem avaliar os arquitectos só pelos prémios que recebem”, concluiu.

12 Mar 2021

Nuno Fontarra, arquitecto responsável pelo projecto da nova Biblioteca Central: “Será um disseminador físico de cultura”

O arquitecto português, do atelier holandês Mecanoo, é o responsável principal pelo projecto da Biblioteca Central, no edifício do antigo Hotel Estoril. Nuno Fontarra fala de um espaço que será multifacetado, com uma função social e de ligação à praça do Tap Siac. Grande parte do edifício será demolido, colocando-se a possibilidade de pavimentar a avenida de Sidónio Pais

 

Ficou surpreendido por vencer este concurso?

Não. Fizemos o projecto de concepção de design em Agosto do ano passado e sempre tivemos boas relações com o Governo de Macau. Eles aceitaram bastante bem o projecto e sabem que uma das nossas mais valias são as bibliotecas, temos várias construídas em todo o mundo. A única coisa que nos surpreendeu é que a concorrência era bastante alta, havia dois escritórios Pritzker, um suíço e um irlandês. Consideramos que fizemos um bom projecto por isso não nos surpreende.

Quando olharam pela primeira vez para o edifício do antigo Hotel Estoril, pensaram de imediato que seria um desafio para o vosso atelier?

Quando nos chegou o pedido do Governo para fazer o edifício, só tínhamos uma fotografia frontal do edifício. Não o tinha visto pessoalmente. Parecia muito interessante trabalhar com ele.

Do ponto de vista histórico também?

Sim, e o edifício tinha um carácter interessante. Mas quando vimos em detalhe percebemos que era completamente impossível [mantê-lo], porque os pés direitos são muito baixos, a estrutura não está em condições. O alçado fica para que a memória do edifício se mantenha, e o grande mural. Decidimos que estaria melhor lá dentro do que no alçado exterior. Lá dentro tem mais condições para se manter mais tempo, para que não se deteriore tão depressa. E também pode ser interessante no átrio, que vai ser bastante alto. Será sempre visível do exterior.

Desde o início deitar fora o mural não era uma opção.

Nunca foi uma hipótese. Podia mudar, mas o mural tinha de ser mantido. A segunda hipótese era ficar no alçado do edifício, mas assim que se demolir o edifício por detrás será quase impossível manter o alçado porque não tem muita qualidade. Como é de betão achamos melhor refazer o alçado com um material parecido, modernizando-o.

Grande parte do edifício será, portanto, demolido.

Exacto. Essa foi uma das decisões que se tomou logo no início. Por exemplo, a parte detrás do edifício é completamente irrecuperável, está num nível que não é compatível com uma biblioteca. Os pés direitos não têm mais do que 2,7 metros, é quase habitação.

A presidente do Instituto Cultural disse que o vosso edifício irá “ultrapassar a imaginação do público em relação às bibliotecas tradicionais”. De que forma é que pretendem marcar a diferença em relação ao conceito de biblioteca como o conhecemos?

Trabalhamos com bibliotecas há cerca de dez anos. Um dos projectos mais famosos é em Delft, onde está o nosso escritório, que é uma biblioteca da universidade. É bastante diferente de uma biblioteca pública. Depois fizemos a biblioteca de Birmingham que está numa condição parecida com esta, numa praça principal. [Tínhamos a ideia de] bibliotecas muito silenciosas, um local que não é dinâmico e que só oferece livros. A ideia é que esta biblioteca se integre com a vida da praça o mais possível e que não tenha apenas livros, mas onde se possa ver um filme ou ir a uma conferência. Se decidir só tomar um café, será um bom café. Chamamos de “live Internet”, em que a pessoa vai ver uma coisa, mas tem outras expostas. E será sobretudo um disseminador físico de cultura. As bibliotecas, sobretudo nos países nórdicos [da Europa] servem também o público.

Macau é um território na Ásia, mas com a presença da cultura portuguesa. Pretendem trazer essa modernidade da Europa, uma nova visão da arquitectura?

Não é tanto a arquitectura que impacta. O que vai impactar é a função da biblioteca. Isso passa-se não apenas nos países nórdicos, mas no Japão, por exemplo. As bibliotecas mudaram um bocado. Quando há problemas sociais, de isolamento, as bibliotecas passaram a ter um comportamento social pró-activo. Havia o bibliotecário atrás da sua secretária, só. Aqui a biblioteca em Delft, devido aos seus funcionários, foi considerada a melhor do mundo durante vários anos. Porque são funcionários muito diversificados, pessoas que vieram da rádio, da televisão. É um grupo muito dinâmico, com muitos voluntários. Esse é um comportamento social e a arquitectura apenas ajuda a fazer isso. A equipa tem de ser treinada e já percebi, pelas pessoas com quem tenho falado para este projecto, que são pessoas jovens e dinâmicas. Se lhe dermos a arquitectura certa podem tirar partido disso.

A praça do Tap Siac, com a calçada portuguesa, também vos inspirou?

Sim. Uma das coisas que nos interessava é que o edifício conferisse coerência a toda a praça, algo que o edifício do Hotel Estoril já fazia. Não queríamos mudar muito isso. Um dos problemas que temos neste momento, e que é difícil de resolver, é que há uma rua que passa entre a biblioteca e a praça [avenida Sidónio Pais] que corta um pouco essa possibilidade de relação com a praça. Seria melhor que se pavimentasse toda a rua, algo que talvez se possa propor nos próximos estudos que vamos fazer.

Além do mural, o vosso projecto também tem outros elementos históricos, como um mosaico.

E com o desenvolvimento do projecto ainda poderemos preservar mais. Queremos que haja um diálogo entre um edifício antigo e moderno. Tem de se contar uma história também, e quantos mais bocadinhos da memória do Hotel Estoril conseguirmos recuperar, melhor.

Este projecto esteve envolvido em várias polémicas, incluindo a retirada de um convite a Siza Vieira, ou as críticas face à pouca participação de arquitectos locais. Quer comentar?

Ainda falta discutir esses detalhes com o Governo, mas a nossa equipa terá arquitectos locais. Trabalhamos sempre com locais fora da Holanda, precisamos do know-how do arquitecto local. Falta também discutir a equipa de engenharia. Está totalmente assegurada a participação dos locais. Alguns arquitectos já têm uma certa idade e não estavam interessados em trabalhar connosco, já estão cansados de fazer este tipo de trabalho. Temos contactos com gente mais jovem.

Falamos do arquitecto Carlos Marreiros, por exemplo, que viu o seu projecto ser anulado pelo Governo?

Não. Temos contacto com ele, mas o arquitecto não está na equipa. Os detalhes da equipa ainda estão sob avaliação do Governo de Macau, mas [a participação de Carlos Marreiros] está fora de hipótese. Só temos contacto a nível pessoal.

O orçamento é de 500 milhões de patacas. Espera que possa ser mantido?

Sim, apesar de nos ter surpreendido o custo da construção em Macau. São valores mais altos do que na Holanda. Estamos a fazer a biblioteca de Nova Iorque e os valores são quase comparáveis, e é talvez o sítio do mundo onde é mais caro construir. Não entendemos bem porque é que isto acontece em Macau. Estamos habituados a trabalhar na China onde os custos de construção não são tão altos. Temos projectos em Shenzhen e os custos não são tão disparatados.

10 Mar 2021

Projecto de atelier holandês escolhido para a Biblioteca Central

O atelier holandês Mecanoo será responsável pelo projecto da Biblioteca Central, que vai nascer no que resta do Hotel Estoril, na Praça do Tap Siac. Mok Ian Ian espera que a futura biblioteca “ultrapasse a imaginação do público” e se transforme num dos edifícios mais icónicos da cidade

 

Os conceitos nucleares do projecto da nova Biblioteca Central, na Praça do Tap Siac, assentam na imagem de um livro, de estantes e lombadas e de uma página que se abre no centro da cidade. “A futura Biblioteca Central irá ultrapassar a imaginação do público em relação às bibliotecas tradicionais, atender às necessidades multifuncionais de biblioteca do século XXI e construir espaços complexos para todas as idades, diversidade e vida”, referiu Mok Ian Ian, presidente do Instituto Cultural (IC), sobre o projecto escolhido, de autoria do atelier holandês Mecanoo.

Ainda sem conseguir precisar data de abertura e orçamento global do projecto, Mok Ian Ian afirmou ontem estar esperançada no cumprimento da estimativa inicial para a conclusão do projecto, entre o final de 2024 e 2025.

Quanto ao custo da obra, apesar de apontar para o cálculo inicial (500 milhões de patacas), o Governo quer rigor no uso do erário público e controlo e contenção para respeitar o limite de 500 milhões de patacas.

Com a meta de construir um edifício icónico no centro da cidade, o projecto do atelier holandês tem uma fachada com design modernista, inspirada no Hotel Estoril, com uma “grelha” que filtra a luminosidade exterior. O resultado é “um jogo intrigante de luz e sombras, projectando no chão e paredes da biblioteca os padrões da fachada, como extensão das estantes e livros, do exterior para o interior do edifício”, retrata o vídeo de apresentação do projecto. De frente, a entrada principal aparenta a forma de livro aberto para a Praça do Tap Siac.

Espaços dentro do espaço

Além do design do projecto, a Mecanoo foi escolhida depois de analisados “custo global, dificuldade de construção, manutenção e preservação energética, a disposição funcional e custos de design, entre outros”, revelou ontem Mok Ian Ian.

O atelier holandês conta no portfolio com projectos como a Biblioteca de Birmingham, a renovação da Biblioteca Central Pública de Nova Iorque e a Biblioteca Dr. Martin Luther King Jr, em Washington.

De acordo com Karen Latimer, uma das especialistas escolhidas pelo IC para encontrar o projecto vencedor, a proposta da Mecanoo, além de corresponder em termos de eficiência, tem “aquele pequeno detalhe mágico que transforma um edifício em arquitectura”.

A nova Biblioteca Central de Macau terá uma zona de leitura infantil, biblioteca familiar, espaço com brinquedos e sala de convívio familiar, zona de criação, zona de intercâmbio, zona de exibição, equipamentos inteligentes, espaços de tecnologia de informática e multimédia, zona de exposição, sala de aula, auditório multifuncional e salas de reunião.

“Este edifício icónico irá integrar a cultura na vida de todos e proporcionar a Macau um lugar onde todos possam realizar planos de desenvolvimento pessoal”, afirmou ainda a presidente do IC.

9 Mar 2021