Andreia Sofia Silva Grande Plano MancheteUrbanismo | Livro conta intersecção da história de Macau com a arquitectura Depois do primeiro lançamento em Portugal, “Macau. Arquitectura e mutações no tecido urbano: uma antologia” será lançado hoje na Creative Macau. O mais recente projecto editorial da BABEL – Associação Cultural revela a forma como a história de Macau foi moldando a sua arquitectura e a forma de organização urbanística desde os primórdios do século XX Imagem_Nuno Cera É hoje lançado na Creative Macau, a partir das 18h30, o novo projecto editorial da BABEL – Associação Cultural, que traz visões de vários autores sobre o tecido urbano de Macau e a história do território. “Macau. Arquitectura e mutações no tecido urbano: uma antologia” é o nome do livro fruto de uma bolsa de investigação académica concedida a Tiago Quadros, arquitecto e co-fundador da BABEL, em 2020. Tiago Quadros, coordenador da obra, declarou ao HM que o estudo procurou “identificar as influências que determinados textos fundamentais, escritos ao longo do século XX, tiveram na arquitectura de Macau e na forma como os arquitectos foram desempenhando a sua actividade”. Há, assim, três grandes momentos contados no livro: as primeiras décadas do século XX, sobretudo no período da revolução republicana na China, em 1911; depois, o movimento “12,3”, expressão da Revolução Cultural chinesa em Macau, que decorreu entre 15 de Novembro de 1966 e Fevereiro de 1967; e depois o período mais contemporâneo até à transição, em que, segundo Tiago Quadros, “o itinerário pós-modernista do território resultou fundamentalmente do pensamento e da actividade de Manuel Vicente”. “Nestes e noutros processos, e momentos, Macau foi sempre seguindo as tendências internacionais, ainda que com as adequações naturais e decorrentes das condições climatéricas do território, das condicionantes resultantes do ambiente cultural local e do facto de o território estar na periferia dos debates centrados nos novos programas, tecnológicos e sociais.” Desta forma, acrescentou Tiago Quadros, o livro “reflecte algum do trabalho realizado ao abrigo da bolsa de investigação académica, mas a partir de uma estrutura de natureza mais antológica”. “No processo de construção do livro pareceu-me importante que essa dimensão antológica prevalecesse, por forma a que o livro pudesse constituir-se também como fonte de consulta, mas sobretudo, e isso é o mais importante, como ponto de partida para outros estudos, para outras investigações sobre o território e a arquitectura de Macau”, frisou. Mudanças estruturais À partida, poder-se-á pensar que movimentos políticos ou revolucionários nada têm a ver com a forma de construir e planear uma cidade. Porém, não foi isso que a história de Macau mostrou. Nesta antologia encontram-se textos de autores como os arquitectos José Maneiras ou Mário Duarte Duque, Manuel Graça Dias, Fernando Távora ou Álvaro Siza. Incluem-se ainda “escritos – seleccionados, compilados e organizados – por arquitectos, professores, investigadores, bem como jornalistas, viajantes e exploradores, provenientes da Ásia, mas também da Europa, América do Norte e Oceania”. Segundo Tiago Quadros, os três períodos temporais que servem de enquadramento a todo o conteúdo “são históricos e não estão directamente relacionados com a arquitectura ou urbanismo, mas, na sua essência, vão directamente trazer consequências na forma como a cidade passa a ser pensada, desenhada e construída”. No caso do período de instauração da República na China, e também em Portugal, mas dois anos antes, em 1910, “o que acontece em Macau é a adopção de medidas urbanísticas, como a adopção de planos para a melhoria das vias e a nível de higiene, procurando dotar-se a cidade de uma melhor qualidade de vida e saneamento básico”. Assim, ocorre “uma pequena revolução na cidade que procura que alguns bairros passem a ter uma melhor qualidade de vida das pessoas”, destacando-se a grande mudança trazida com a abertura da Avenida Almeida Ribeiro. O projecto, segundo Tiago Quadros, obrigou a “grande coragem política, e que teve grande resistência”, pois implicou a ligação da cidade chinesa com a parte cristã da cidade, onde residiam os portugueses e macaenses na sua grande maioria. Para esse processo se realizar, ocorreram várias expropriações de terrenos. Mas, em termos gerais, “foi concluído com sucesso”, o que faz com que as primeiras décadas do século XX em Macau tenha sido marcado “pela realização de grandes obras públicas, nomeadamente a melhoria do Porto Interior, pois era importante que Macau tivesse um porto que fosse viável, em comparação com os recursos que existiam em Hong Kong”. Depois, em meados dos anos 60, o “12,3” trouxe, para Tiago Quadros, “a mudança mais interessante no panorama do século XX em Macau, pois coincide com a vinda para o território de uma geração muito jovem de arquitectos, como José Maneiras, Natália Gomes ou Manuel Vicente”. Estes chegam bastante influenciados profissionalmente “pelos estudos que tinham feito na Europa e por todos os movimentos que surgiam nos Estados Unidos da América e na Europa, como o Maio de 68”. Assim, estes arquitectos chegam a Macau “muito preocupados e atentos à questão da matriz social da arquitectura e a importância que esta poderia ter na vida de uma comunidade e cidade”. No caso de Manuel Vicente, que chegou a Macau pela primeira vez no início dos anos 60, vem integrado de uma geração que trabalhou em Lisboa com “planos de expansão, urbanísticos e edifícios públicos que eram desenhados em Lisboa e depois enviados para serem construídos em vários destinos diferentes”. Encontram, à época, “um espaço muito afastado da metrópole [Portugal] que escapava às regras e normas vigentes [em Lisboa], onde havia um espaço relativamente novo, o que lhes permitiu iniciar a sua actividade num espaço de maior liberdade e grande responsabilidade”. Foi a época dos planos do ZAPE [Zona Aterros do Porto Exterior], por exemplo, ou outros que “do ponto de vista político exigiram decisões importantes não muito bem aceites pela comunidade chinesa”. Além disso, “o facto de, até 25 de Abril de 1974, Macau ser governada com grande distanciamento por parte do Governo português, com uma Administração reduzida, dificultou o planeamento da cidade”, mas também “permitiu a arquitectos uma liberdade de acção, sobretudo no que diz respeito a processos de maior experimentalismo”. A época da liberalização Já na era próxima da transição, em 1999, a decisão de liberalizar o jogo e o crescimento do número de turistas chineses trouxe profundas mudanças em toda a sociedade, com impactos urbanísticos. “A parte mais visível dessa mudança é a zona do Cotai, mas antes deste ser construído a mudança começou a sentir-se na península, com a construção dos primeiros casinos”, nomeadamente o Sands em 2004. Deu-se, então, “a grande transformação ao nível da arquitectura, com impacto na cidade e na forma como as pessoas começam a viver a partir daí”, pois deu-se o aumento dos valores das rendas, além de que a própria população aumentou. “Este terceiro momento tem também uma questão relacionada com o impacto que este mercado vai ter nos escritórios de arquitectura de pequena e média escala”, defende Tiago Quadros, chamando a atenção para os ateliers de matriz portuguesa. Estes passam a “sentir dificuldades porque os casinos entram no mercado e trazem consigo as grandes multinacionais ligadas à arquitectura e design de interiores, ocupando um espaço que não existia e que os ateliers pequenos não conseguem ocupar”. Acima de tudo, esta obra “não pretende ser uma história da arquitectura e urbanismo”, refere Tiago Quadros que destaca os textos escritos por viajantes, jornalistas ou sinólogos na primeira metade do século XX, pois os textos mais académicos só surgem depois dos anos 60. “São olhares com importâncias e relevâncias diferentes e isso nota-se quando se lê o livro, mas estas diferenças, quer na origem dos textos, quer nos suportes onde foram originalmente colocados, dá-nos a ideia do que é Macau, um espaço de grandes incoerências, de muita informalidade”. A obra é editada pela Circo de Ideias e trata-se de uma iniciativa da BABEL – Associação Cultural, criada por Tiago Quadros e Margarida Saraiva em Macau, em 2013. A BABEL estabeleceu-se em 2020 em Alcobaça. A apresentação de hoje estará a cargo do arquitecto Diogo Burnay. Tiago Quadros recorda ainda as palavras do arquitecto Jorge Figueira na primeira apresentação da obra, no Porto. Este “disse, de forma muito generosa, que este livro é um contributo para que se volte a olhar para Macau”. “Ficarei muito feliz se o livro for, de facto, um estímulo para que outros investigadores se interessem por Macau, pela sua arquitectura e urbanismo”, rematou.
Andreia Sofia Silva EventosLivro | Lançado hoje “Macau. Arquitectura e mutações no tecido urbano: uma antologia” É hoje lançado, no Porto, mais uma obra com o cunho da BABEL – Organização Cultural. “Macau. Arquitectura e mutações no tecido urbano: uma antologia” é a obra que compila ensaios e reflexões sobre o panorama arquitectónico e urbanístico de Macau em diversos períodos históricos, nomeadamente desde a revolução republicana chinesa de 1911 até à transição, em 1999 A BABEL – Organização Cultural lança hoje, na Feira do Livro do Porto, um novo livro dedicado à arquitectura e urbanismo de Macau e à sua evolução nos últimos anos. A obra, que tem a chancela da “Circo de Ideias”, intitula-se “Macau. Arquitectura e mutações no tecido urbano: uma antologia” e inclui ensaios e reflexões seleccionados por Tiago Saldanha Quadros, arquitecto, e curadoria fotográfica de Margarida Saraiva. Ambos criaram a BABEL em Macau em 2013, desenvolvendo actualmente projectos culturais e artísticos com esta entidade em Portugal. O lançamento, que acontece a partir das 18h, conta ainda com a presença do arquitecto Jorge Figueira, autor de um dos textos da obra. Porém, este livro inclui muitas outras reflexões sobre um território que tem sofrido profundas mudanças no seu tecido urbano nos últimos anos, à conta dos investimentos na área do jogo, que levaram à construção dos resorts e casinos, ou mesmo do crescimento do turismo. Assim, esta obra “contempla um estudo das transformações no tecido urbano de Macau, com especial foco nas figuras-chave, movimentos e textos que informaram e animaram o discurso arquitectónico das últimas décadas”, aponta um comunicado da BABEL. Além da participação de Jorge Figueira, incluem-se outros autores que se envolveram directamente na obra, nomeadamente Álvaro Siza, Fernando Távora, Francisco Figueira, José Maneiras, Manuel Graça Dias e Manuel Vicente, ambos já falecidos; Mário Duque ou Pedro Vieira de Almeida. Tratam-se de textos que são também “testemunhos e histórias pessoais”. Com apoio Este livro resulta de um estudo financiado pelo Instituto de Estudos Europeus de Macau, com uma bolsa de investigação académica de 2020. Além disso, a edição da obra faz-se com o apoio do Fundo de Desenvolvimento da Cultura do Governo da RAEM, Banco Nacional Ultramarino e Fundação Oriente. O livro divide-se em três partes, pautadas por três momentos históricos: a revolução republicana na China, em 1911; a ocorrência do movimento “12,3” em Macau entre Novembro de 1966 e inícios de 1967; e ainda a fase da transição da administração portuguesa de Macau para a China, em 1999. Incluem-se, assim, “escritos seleccionados, compilados e organizados por arquitectos, professores, investigadores, jornalistas, viajantes e exploradores, provenientes da Ásia, mas também da Europa, América do Norte e Oceania, agora publicados, pela primeira vez, num único volume”. Segundo a BABEL, os três acontecimentos históricos que orientam o conteúdo do livro foram “muito relevantes na história do território, na sua expansão e desenvolvimento”, funcionando “como enquadramento temporal do estudo”. Estes textos assumem uma importância “não só para arquitectos, estudantes e investigadores, mas também para todos aqueles que pretendam compreender melhor as questões identitárias e culturais do urbanismo e da arquitectura de Macau, aliados à qualidade dos textos e à sua dispersão em edições, algumas das quais inacessíveis”, é referido na mesma nota. Abordam-se, assim, no estudo académico que dá origem ao livro, “vários planos temáticos, que vão desde 1911 ao tempo presente, com especial enfoque nas figuras-chave, movimentos e textos que informaram e animaram o discurso arquitectónico das últimas décadas e que documentam as mais significativas transformações verificadas no tecido urbano de Macau”. A obra agrega textos sobre alguns edifícios icónicos do território que se misturam com “ensaios dedicados à discussão de ideias e temas comuns a cada uma das três partes”. Questão de imagem O livro hoje lançado inclui depois um “ensaio visual que integra imagens de obras de artistas que, de algum modo, desenvolveram trabalho sobre Macau, com ênfase na cidade e na arquitectura do território”. Exploram-se aqui fotografias, “stills” de vídeos de artístas e documentos provenientes dos acervos de instituições dedicadas à investigação e estudo da arquitectura. Deste modo, construiu-se “uma narrativa que procura documentar algumas das mutações verificadas no tecido urbano de Macau durante as últimas décadas”. Segundo a BABEL, este livro “não pretende ser uma história recente da arquitectura e do urbanismo de Macau, antes uma leitura interpretativa e crítica de uma sequência cronológica de um conjunto de textos e ensaios aqui coligidos”. Apresenta-se, assim, “uma antologia que configura uma cartografia possível de textos, dos seus autores e dos respectivos planos temáticos”.
Hoje Macau EventosExposição | “Que mar se vê afinal da minha língua?” na Casa Garden Depois da primeira edição em Alcobaça, a exposição “Que mar se vê afinal da minha língua” chega a Macau, inaugurando as celebrações dos 50 anos do 25 de Abril. A mostra será inaugurada na sexta-feira, às 18h30, na Casa Garden, apresentando trabalhos de diversos artistas de língua portuguesa, incluindo alguns ligados a Macau “Que mar se vê afinal da minha língua?” é a pergunta a que a BABEL, co-fundada por Margarida Saraiva, pretende responder através da arte de diversos artistas de língua portuguesa, numa imensa expressão da lusofonia. Esta mostra, que já se estreou em Alcobaça, entre Dezembro do ano passado e Março deste ano, apresenta-se agora em Macau, a partir das 18h30 desta sexta-feira, na Casa Garden. Ao mesmo, o projecto inaugura as comemorações do 25 de Abril de 1974, data em que o regime ditatorial do Estado Novo caiu em Portugal. Segundo um comunicado da BABEL, a mostra, com curadoria de Margarida Saraiva, “propõe uma reflexão sobre questões essenciais como memória, história, identidade e liberdade, num contexto pós-colonial e globalizado”. “O objectivo não é apenas olhar para o passado, mas também para o futuro: o que será do espaço de expressão portuguesa daqui a dois ou três séculos? Como será a liberdade num mundo controlado por algoritmos e obcecado com a vigilância no espaço privado, público e digital?”, interroga a organização, em comunicado. Apresentam-se, assim, trabalhos de Aline Motta, Ana Battaglia Abreu, Ana Jacinto Nunes e Carlos Morais José, Bianca Lei, Catarina Simão, Cecília Jorge, Eliana N’Zualo, Eric Fok, Filipa César e Sónia Vaz Borges, José Aurélio, José Drummond, José Maçãs de Carvalho, Konstantin Bessmertny, Luigi Acquisto e Bety Reis, Mónica de Miranda, Nuno Cera, Peng Yun, Rui Rasquinho, Sofia Yala, Subodh Kerkar, Thierry Ferreira, Tiago Sant’Ana ou Wong Weng Io. Há ainda outros artistas que se juntam ao painel “sempre que a exposição transpõe fronteiras”, uma vez que a ideia é que a exposição possa percorrer outros territórios de língua portuguesa, nomeadamente Fortaleza, Mindelo, Luanda e Maputo. “Que mar se vê afinal da minha língua?” fica patente em Macau até ao dia 12 de Maio. Uma nova curta No caso de Cheong Kin Man, natural de Macau e radicado na Alemanha, volta a apresentar em Macau a curta-metragem “uma ficção inútil”, datada de 2015, mas desta vez com uma nova roupagem num trabalho de parceria com a artista polaca Marta Stanisława Sala. A obra será exibida na Casa Garden na sexta-feira às 18h30. O projecto intitula-se “uma ficção inútil – a resposta”. A curta-metragem, segundo uma nota divulgada pelos autores, é “mais de uma adaptação anotada com uma autocrítica do que uma verdadeira nova versão original” do trabalho de 2015. A nova curta-metragem inclui uma parte com imagens em vídeo feitas pelo fotógrafo amador, e ex-residente de Macau, Jorge Veiga Alves durante a fase da transferência de administração portuguesa de Macau para a China. “À medida que se vão mostrando 16 cenas repetidas e justapostas de uma dança do dragão, surgem palavras em português ‘impotência do multilinguismo’, numa referência ao livro ‘O Poder do Multilinguismo’, da escritora alemã de origem russa, Olga Grjasnowa”, apontam Cheong Kin Man e Marta Sala. Um longo percurso A exposição foi exibida em Alcobaça pela primeira vez graças a uma colaboração entre o Armazém das Artes e a central-periférica, tendo resultado de uma investigação, ainda em curso, de Margarida Saraiva sobre práticas artísticas contemporâneas dos mundos de expressão portuguesa. Desta forma, o público poderá apreciar, na Casa Garden, cerca de 50 trabalhos de diversas áreas artísticas, como fotografia, vídeo, cinema, poesia, pintura, escultura e novos media, de artistas de Portugal, Brasil, Angola, Moçambique, Macau, Timor-Leste e Goa. Além da organização da BABEL, o evento é co-organizado pela REDE- Residências dos Mundos de Expressão Portuguesa, a central-periférica e delegação de Macau da Fundação Oriente. No que diz respeito à própria BABEL, a sua missão é “gerar oportunidades de investigação e aprendizagem nos domínios da arte contemporânea, da arquitectura e do ambiente”, sendo pensada como “um museu sem paredes” que pretende “trabalhar entre culturas e disciplinas”. Fundada em Macau em 2013, e com presença em Alcobaça desde 2022, a BABEL procura criar novas colaborações e sinergias, tendo ainda apoiado, em Portugal, artistas em situação de risco, nomeadamente aqueles que fogem de cenários de guerra ou opressão.
Andreia Sofia Silva EventosExposição mutante da BABEL dá primeiro passo em Alcobaça A BABEL – Associação Cultural desenvolveu uma nova exposição “Que Mar se Vê Afinal da Minha Língua”, inaugurada no passado dia 16 em Alcobaça, Portugal, no Armazém das Artes e na Central-Periférica, onde fica patente até ao dia 3 de Março. Trata-se de uma mostra com curadoria de Margarida Saraiva, co-fundadora da BABEL, e que reúne cerca de 50 obras de 20 artistas de territórios onde se fala português, incluindo nomes de artistas ligados a Macau, nomeadamente Aline Motta, Ana Battaglia Abreu, Ana Jacinto Nunes e Carlos Morais José, Bianca Lei, Catarina Simão, Cecília Jorge, Eliana N’Zualo, Eric Fok, Filipa César e Sónia Vaz Borges, José Aurélio, José Drummond, José Maçãs de Carvalho, Konstantin Bessmertny, Luigi Acquisto e Bety Reis, Mónica de Miranda, Nuno Cera, Peng Yun, Rui Rasquinho, Sofia Yala, Subodh Kerkar, Thierry Ferreira, Tiago Sant’Ana e Wong Weng Io. Pretende-se que esta exposição seja depois itinerante, passando por diversos lugares onde se fala português, nomeadamente nas cidades do Mindelo, Luanda, Maputo e Macau. Numa publicação na rede social Linkedin, Margarida Saraiva descreveu este projecto como tendo nascido de “um processo de investigação ainda em curso”, da sua autoria, “sobre práticas artísticas contemporâneas dos mundos de expressão portuguesa”. Apresentam-se, nesta exposição “obras no domínio dos cruzamentos disciplinares”, nas áreas da fotografia, vídeo, cinema, poesia, pintura, escultura e novos media. Memória e futuro Segundo o Jornal de Leiria, Margarida Saraiva explicou que “esta é a primeira de uma série de exposições mutantes”. “A pergunta [que lhe dá título] manter-se-á em aberto, e a mostra renovar-se-á a cada apresentação através da participação de artistas e autores locais”, adiantou. No texto de apresentação da exposição, citado pelo portal “Comunidade Cultura e Arte”, descreve-se que a investigação que dá origem a este projecto explora questões como a memória e a história, a colonização e a descolonização, as identidades e a globalização no período do pós-25 de Abril de 1974. Colocam-se, no entanto, questões a partir do estudo do passado recente de Portugal e das suas antigas colónias, nomeadamente quanto à evolução do universo de expressão portuguesa. “No espaço desta galeria, a exposição desenha-se justapondo contrastes, tensões, divergências, permitindo-se transgressões disciplinares e a criação de uma constelação relativamente inesperada da qual emerge o caráter ensaístico de uma proposta que entrelaça geografias, temporalidades e diversas disciplinas artísticas, como quem desenha, apaga e redesenha, já sem medo de errar”, descreve a curadora no mesmo texto. A BABEL nasceu em Macau em 2013, tendo-se estabelecido na cidade portuguesa de Alcobaça no ano passado, e tem também como missão o apoio a artistas em situação de risco.
Andreia Sofia Silva EventosBABEL | Ciclo de conferências sobre património, memória e colonialismo arranca hoje Começa hoje um ciclo de conferências online que aborda a preservação de memórias sobre locais e objectos que foram deslocados dos lugares a que pertenciam. A iniciativa é organizada pela BABEL – Organização Cultural e dela vai nascer um arquivo digital com os objectos e histórias abordadas no projecto Entre hoje e domingo discutem-se, num formato totalmente online, questões como o património, memória e colonialismo através das histórias de “objectos” com “acentuado valor simbólico e patrimonial que, de forma violenta ou anti-ética, foram deslocados das suas comunidades originais e colocados em contextos e locais muito distintos”. Esta é a temática central do ciclo de conferências “SOS – Stolen Objects Stories”, onde serão partilhadas “perspectivas académicas e artísticas situadas na confluência entre imperialismo, colonialismo, de-colonialidade, património e práticas criativas de produção de conhecimento”. Desta forma, personalidades como Margarida Saraiva, co-fundadora da BABEL, Zuozhen Liu, Maria Paula Meneses ou Catarina Simão, entre outros, vão debater questões “além das fronteiras tradicionais” como a “colecção, instituição ou nação”, a fim de chegar “ao domínio de uma ética do ‘cuidar’ e ‘reparar’”. Pretende-se, assim, dar respostas a questões como “o cuidado com os objectos do museu para o respeito pelas pessoas”, ou ainda a necessidade de colocar “a preservação dos acervos e património museológicos [em prol] do bem-estar das comunidades, da natureza e do planeta”. Ao HM, Margarida Saraiva adiantou que o ciclo de conferências vai além do debate de objectos roubados em contextos coloniais ou de conflito, abordando também a forma como muitos vezes nós, enquanto seres individuais, nos vemos apropriados de forma ilegítima dos nossos dados pessoais, por exemplo. “Partimos de uma parte que todos entendem, quando falamos de objectos museológicos roubados, para depois acompanharmos essa problemática até à actualidade. Muitas vezes, numa situação de guerra, o património móvel fica muito vulnerável.” A ideia é descobrir “a quem pertencem os objectos”, sem que se faça “uma abordagem simplista do problema”. A BABEL tem trabalhado com mais de 15 investigadores. O resultado deste projecto poderá ser visto depois num arquivo que será totalmente digital, e estará disponível um mês após o ciclo de conferências. Dias de reflexão O evento de hoje é dedicado a “Histórias”, durante o qual Margarida Saraiva irá apresentar o projecto que deu origem ao ciclo de debates, o SOS. Trata-se de um “arquivo crítico” que foi fundado com base “num conjunto de questões urgentes”. O SOS foi desenvolvido em parceria com mais de uma dezena de investigadoras, artistas, historiadores, poetas ou músicos, de países como Uruguai ou Austrália, entre outros. A ideia por detrás do arquivo é “assinalar a interligação e a interdependência de pequenos lugares, espalhados pelo mundo, sem procurar oferecer uma visão global”. Segue-se a apresentação “Irá Deus ganhar? O caso da Múmia Budista”, conduzido por Zuozhen Liu, da Universidade de Ciências Sociais de Guangzhou. A académica irá contar a história de uma estátua com cerca de mil anos, conhecida como a estátua de Zhanggong-zushi, e que tem captado a atenção da comunidade internacional. Haverá ainda uma conversa sobre os “Objectos Roubados da China: Histórias e Biografias das colecções de Yuanmingyuan (‘Palácio de Verão’) nos museus britânico e francês”, levada a cabo por Louise Tythacott, da Escola de Estudos Orientais e Africanos da Universidade de Londres. O debate remete para a retirada de objectos por ingleses e franceses em 1860, aquando da segunda Guerra do Ópio, bem como o vandalismo a que foram submetidos estes elementos do património histórico chinês. No sábado conversa-se sobre “Práticas”, com duas apresentações mais focadas na Ásia, como é o caso de Caroline Ha Thuc, escritora e curadora de Hong Kong, que irá falar sobre as práticas da pesquisa artística no sudeste asiático. Riksa Afiaty e Sita Magfira, artistas e curadoras independentes da Indonésia, também participam no debate, juntamente com Catarina Simão, que abordará a questão dos arquivos como campo de trabalho. Domingo será dedicado aos “Discursos”, numa sessão dedicada à preservação, do saque e da memória, com autores como Marian Pastor Roces, das Filipinas, Naman P. Ahuja, professor na Universidade Jawaharlal Nehru, em Nova Deli, e Maria Paula Meneses, da Universidade de Coimbra. O ciclo de conferência estará disponível, entre as 17h45 e as 18h30 em https://iftm.zoom.us/…/register/WN_yhQejPxOREOJDVl2d9JHOQ
Hoje Macau EventosExposição da BABEL sobre arquitectura e urbanismo de Macau na cidade do Porto Foi inaugurada, no passado dia 5, a exposição “In-between this and something else” na Galeria da Biodiversidade – Centro de Ciência Viva, no Porto, Portugal. Esta mostra pode ser vista até ao dia 15 de Janeiro e parte da obra “Macau. Diálogos sobre Arquitectura e Sociedade”, editado pela BABEL e Circo de Ideias em 2019. Este livro reúne um conjunto de entrevistas realizadas por Tiago Saldanha Quadros a Hendrik Tieben, Thomas Daniell, Mário Duque, Wang Weijen, Diogo Burnay, Jianfei Zhu, Jorge Figueira, Werner Breitung e Pedro Campos Costa. Margarida Saraiva, curadora e uma das fundadoras da BABEL, entrevista para este livro o artista Nuno Cera, que participa nesta edição com um ensaio visual. Esta publicação tenta traçar o retrato urbanístico de Macau em relação com as suas memórias e especificidades. Na exposição inaugurada no Porto o visitante é convidado a percorrer Macau através de fotografias e videos realizados por Nuno Cera, acompanhados por uma instalação sonora de Rui Farinha. Esta instalação foi feita a partir do som das entrevistas que constam no livro. Neste sentido, a exposição “In-between this and something else” inclui conteúdos físicos, sonoros e visuais que “aludem ao contexto de incerteza que paira sobre o futuro de Macau”, mas também “à mistura de estilos, à fantasia desenfreada, ao exotismo e à ousadia que caracterizam o seu tecido urbano”. Esta exposição foi produzida não apenas pela BABEL mas também pela ESAD-IDEA construído na confluência de utopias não só díspares como também talvez incompatíveis. A exposição propõe olhares reflexivos, criativos e subjectivos sobre os desafios que a vida urbana em Macau coloca enquanto lugar de experimentação. A exposição, produzida pela Babel – Organização Cultural e ESAD-IDEA [Escola Superior de Artes e Design, em Matosinhos], integra ainda um programa de conversas coordenado por Magda Seifert e Tomé Quadros. Estas conversas contam com a participação de José Bartolo e Pedro Campos Costa. O desenho de exposição é de Bernardo Amaral. Este projecto integra-se também no ciclo de cinema documental DESIGNAgorà, este ano dedicado ao tema Li(ea)ving Utopia.
Hoje Macau VozesUm Presente ao Futuro: Macau – Diálogos sobre Arquitetura e Sociedade Por Bernardo Amaral, Arquitecto, Investigador No final do ano passado a editora Circo de Ideias lança “Macau – Diálogos sobre Arquitetura e Sociedade” – uma publicação que propõe fazer um ponto de situação do pensamento crítico sobre as transformações urbanas e sociais que a cidade viveu nos últimos 20 anos. Editado por Tiago Saldanha Quadros e Margarida Saraiva, o livro é composto por nove entrevistas a arquitetos, urbanistas e investigadores e por um ensaio visual da autoria de Nuno Cera. A iniciativa dos editores surge da necessidade de “dar corpo, reunir, arquivar, partilhar uma espécie de estado da arte no que ao urbanismo de Macau diz respeito, permitindo o alargamento do debate sobre o futuro da cidade e sua relação com as regiões vizinhas”, como afirma Margarida Saraiva no prefácio. O livro foi inicialmente publicado em 2015, em inglês, pela organização cultural BABEL, fundada em Macau, no ano de 2013, com o objetivo de gerar oportunidades de investigação e aprendizagem nas áreas da arte contemporânea, arquitetura e ambiente numa abordagem interdisciplinar. Em 2019, o livro é publicado em português pela Circo de Ideias, dando a conhecer aos leitores portugueses o conjunto de entrevistas conduzidas por Tiago Saldanha Quadros entre 2013 e 2014. Para Quadros, “a relevância deste livro passa por analisar o tempo da nossa condição contemporânea, lançando a partir de Macau olhares reflexivos acerca dos desafios que a vida urbana moderna em Macau supõe.” De facto, Macau é hoje mais uma cidade numa aldeia global, testemunho da maior revolução urbana de sempre, nomeadamente o atual processo de urbanização do território chinês. Fundada por mercadores portugueses no séc XVI, Macau é definida, a par de Hong Kong, como uma Região Administrativa Especial desde 1982. Enquanto tal, beneficiando de autonomia política e administrativa, estas duas cidades vão servir de tubo de ensaio para o “socialismo de mercado” planeado por Deng Xiaoping; processo também conhecido pelo mote “um país, dois sistemas”. Em 1999, a soberania administrativa de Macau é transferida para a China e desde então são implementadas uma série de medidas estratégicas no sentido de transformar a cidade numa atração turística e na capital mundial do jogo. O centro histórico de Macau, protegido pela UNESCO desde 2005, compete hoje com a monumentalidade dos edifícios dos casinos, cada vez em maior número (cerca de 38). É sobre este período que se centra o livro, sobre a rápida transformação da pacata cidade portuária, que nos últimos 20 anos ganhou 10 quilómetros quadrados de terreno ao mar e aumentou a sua população em mais 200 mil habitantes. Ao selecionar 9 pensadores com diferentes experiências vividas de Macau e de nacionalidades diversas, Tiago Quadros reúne distintas perspetivas sobre o tema, oferecendo ao leitor um retrato multifacetado da condição contemporânea da cidade. Nas entrevistas são abordados temas como a arquitetura, a representação, a história e a memória, questões inevitáveis perante a velocidade a que a paisagem urbana muda, mas também perante regimes de representação que manipulam despudoradamente os signos da história da arquitetura. Um dos entrevistados é o arquiteto Jorge Figueira, que visita Macau desde 2006, no quadro da sua investigação sobre a pós-modernidade na arquitetura portuguesa. Figueira demonstra particular interesse na vida e obra do arquiteto português Manuel Vicente, mas será igualmente fascinado pela condição contemporânea da cidade, como a alta densidade urbana e a sua constante transformação. Manuel Vicente, falecido em 2013, irá projetar e construir em Macau desde os anos 60. Marcado pela sua experiência profissional nos Estados Unidos com Louis Kahn e influenciado pela obra de Robert Venturi, Vicente desenvolve uma obra original, que seduz muitos arquitetos portugueses a descobrirem a exótica cidade, como é o caso de Manuel Graça Dias ou Diogo Burnay, este último também entrevistado por Tiago Quadros. Tendo lá vivido de 1992 -97, Diogo Burnay oferece um testemunho fascinante de como era trabalhar com Manuel Vicente e viver em Macau antes da transição para a administração chinesa. Também Wang Wejien, arquiteto formado em Taiwan e Berkeley e professor em Hong Kong, conhece a cidade desde essa altura, recordando o valor da arquitetura vernacular chinesa e do tecido urbano caracterizado pelos largos e pátios, que ainda hoje se encontram preservados. Por outro lado, Werner Breitung, geógrafo e urbanista alemão, professor em Hong Kong, que assistiu à transformação da cidade desde os anos 90, demonstra mais interesse no conceito de fronteira como lugar de contacto e gerador de urbanidade e de identidade coletiva ao longo dos últimos anos. Jianfei Zhu, historiador da arquitetura chinesa do século XX e formado na Universidade de Tianjin, faz uma leitura das transformações urbanas de Macau à luz da cultura urbana chinesa e enquadrada no processo de urbanização de todo o território continental. Outros pensadores e investigadores entrevistados por Tiago Quadros como Thomas Daniell, Mário Duque, Hendrick Tieben e Pedro Campos Costa, revelam, a par das suas reflexões pessoais sobre outros temas, preocupações com o impacto do turismo e do jogo na urbanização cidade, questionando a qualidade do espaço público, do acesso à habitação, e alertando para o perigo da transformação de Macau num “Parque Temático”. Alertas pertinentes, que espelham a condição contemporânea de uma sociedade de lazer e consumo, que Tiago Quadros irá aprofundar no texto do posfácio. O ensaio visual de Nuno Cera surge no início do livro como um preâmbulo, ilustrando as contradições de uma cidade em “permanente mutação”. Ao longo das 47 imagens realizadas em 2018, o leitor deambula por um território denso e tropical, estranhamente familiar e simultaneamente irreal. Como num palimpsesto, sobrepõem-se edifícios de diferentes tempos e lugares, caracterizando fielmente a condição urbana da cidade peninsular. Para além dos massivos prédios de habitação e suas características “gaiolas”, Nuno Cera capta também a arquitetura festiva dos casinos, que apesar da sua excentricidade surge integrada no quotidiano da cidade. Um ensaio visual que é também um diálogo entre o autor e a cidade, convidando o leitor a percorrer os seus passos. Na entrevista a Diogo Burnay e como resposta à questão sobre a importância da memória como mecanismo de “progresso”, Burnay responde citando Manuel Vicente: “O Manel costumava dizer-nos que o presente é um presente ao futuro e o passado é um presente ao presente.” Eu diria que esta frase atravessa todo o livro e que caracteriza exemplarmente o espírito deste bem sucedido projeto editorial. Um livro para conhecer Macau, enquanto espelho do mundo onde vivemos.
Andreia Sofia Silva EventosImpromptu Storefront | Galeria nasce no estúdio de João Ó e Rita Machado Chama-se Impromptu Storefront e é um novo espaço cultural concebido pelos arquitectos João Ó e Rita Machado dentro do seu próprio estúdio de trabalho. A inauguração está marcada para esta quarta-feira com a apresentação do livro “Macau. Diálogos sobre Arquitectura e Sociedade”, transformado em instalação, pela mão da BABEL “A ideia é fazer aquilo que nos apetece, porque o espaço é nosso”. É desta forma que João Ó, arquitecto, fala da Impromptu Storefront, uma nova galeria de arte que desenvolveu em parceria com Rita Machado no estúdio onde ambos trabalham, na Travessa de Inácio Baptista, perto da Igreja de São Lourenço. Inaugurado esta quarta-feira às 18h30, o espaço será porto de abrigo para trabalhos de artistas internacionais, aberto 24 horas por dia e sete dias por semana. O novo lugar de exposições e debates terá também uma vertente de aposta no vitrinismo. “A montra não se vende, o objecto artístico é uma apresentação formal de alguém que nunca esteve em Macau. É um estímulo visual e estético para quem passa na rua, é uma surpresa”, adiantou João Ó. A apresentação da edição em português do livro “Macau. Diálogos sobre Arquitectura e Sociedade”, pela associação BABEL Organização Cultural, é o pontapé de saída do projecto. A aposta no vitrinismo, uma área criativa muito explorada pelas grandes marcas do mundo da moda, faz deste projecto algo único em Macau, acrescentou João Ó, que nunca quis estar num espaço onde só pudesse trabalhar. “Somos pessoas jovens e criativas e pareceu-nos interessante retirar parte do espaço para possibilitar mais este lado criativo. Tínhamos um projecto para a montra que era convidar só artistas internacionais que não tivessem hipótese de vir a Macau, mas que quisessem mostrar o seu trabalho.” A Impromptu Storefront consiste, assim, “num modelo de exposição inovadora para mostrar intervenções comissariadas a artistas estrangeiros”, e pretende “provocar e estimular a consciência pública, abordando questões locais e globais”. Instalar um livro Lançado em 2019 em Portugal, o livro “Macau. Diálogos sobre Arquitectura e Sociedade”, editado por Tiago Quadros e Margarida Saraiva, fundadores da BABEL, é agora apresentado no território num formato diferente. “Colocámos a nós próprios a questão: como é que se expõe um livro?”, disse ao HM Margarida Saraiva. “Transformámos a obra num livro-objecto, e ele é exibido como uma obra de arte. O que se vê na micro-galeria é uma instalação composta por livros-objecto.” Além disso, os sons das entrevistas utilizadas para a obra serão usados numa instalação sonora, da autoria de Rui Farinha, e que apenas poderá ser ouvida na inauguração de amanhã. O livro reúne um conjunto de entrevistas a figuras como Hendrik Tieben, Thomas Daniell, Mário Duque ou Wang Weijen, entre outros, e apresenta “abordagens retroactivas e prospectivas” acerca da arquitectura e do urbanismo em Macau. Traz também temáticas “importantes que não são exclusivas de Macau, mas que aqui se vivem de uma forma muito importante”, tal como a circulação de pessoas entre fronteiras, a história, a memória ou a representação. A instalação estará patente até 15 de Julho.
Andreia Sofia Silva Entrevista MancheteGuilherme d’Oliveira Martins, ex-ministro da Educação: “Negociar a Declaração Conjunta obrigou a coragem” Guilherme d’Oliveira Martins dá amanhã, às 18h30, uma palestra online sobre a relação entre arte e educação na Fundação Rui Cunha. Em entrevista, o administrador executivo da Fundação Calouste Gulbenkian e antigo ministro da Educação, que acompanhou a criação da Escola Portuguesa de Macau, revela-se orgulhoso do trabalho feito e lembra as negociações com a China para a Declaração Conjunta como o principal momento da presidência de Mário Soares Arte e educação. São complementares e fundamentais? A arte é fundamental, uma vez que se trata da primeira etapa da aprendizagem de qualquer ser humano. Os estudos de psicologia educativa demonstram que o primeiro passo que damos tem a ver com a aprendizagem dos sentidos e das artes. Hoje sabemos que ainda dentro da barriga da mãe uma criança já responde a estímulos musicais, e por isso quando temos educação de infância deparamo-nos imediatamente com o primeiro passo em relação às artes, música e pintura. Quando um dia perguntaram a Sophia de Mello Breyner o que era indispensável numa escola, ela disse: “Poesia, música e ginástica”. O jornalista ficou muito surpreendido, e disse: “Mas, senhora dona Sophia, e a matemática?”. Sophia respondeu: “Acha que é possível distinguir uma redondilha de um alexandrino, ouvir uma pauta de música, sem relacionar a matemática?”. O jornalista ficou esclarecido. Sophia estava a falar da aprendizagem das suas referências mais antigas, a escola grega, que tem todos estes elementos. As artes estão sempre no princípio. E daí a importância que o ensino artístico tem quando falamos daquilo que é uma experiência indispensável, a do diálogo, inovação, da criação e da capacidade de nos conhecermos melhor. Fala destas questões para um território onde existe a Escola Portuguesa de Macau (EPM), um projecto educativo diferente… Que eu conheço muito bem. Tivemos a oportunidade de desenvolver um projecto que superou as expectativas iniciais. Sinto um especial orgulho em virtude da qualidade do projecto educativo e dos resultados alcançados. Houve, no início, muitas dúvidas naturais, estávamos próximos do handover e não sabíamos sequer o que iria ser o futuro desenvolvimento da EPM. Daí ter superado as expectativas como um projecto pedagógico de grande qualidade e que vai ao encontro daquilo que são as exigências da contemporaneidade. Que desafios aponta à EPM para o futuro? Hoje a maior parte dos alunos tem o chinês como língua nativa. Essa é hoje uma realidade muito evidente, a do multilinguismo. O futuro é o diálogo entre várias línguas, é indispensável garantir o paradigma da educação e da formação ao longo da vida. Há a necessidade de aprendermos várias línguas e de em simultâneo garantir que, ao termos conhecimento, podemos dialogar melhor. O centro académico do mundo onde existe o maior número de aprendentes de língua portuguesa está em Pequim. Sou jurista de formação e quando saí da universidade fui para a contratação internacional, para o Direito internacional. Tive de trabalhar na língua inglesa e um dos problemas que existia era a falta de compreensão dos subscritores dos contratos em relação ao conteúdo dos mesmos. Hoje não temos qualquer dúvida de que quem assina um contrato tem de saber as suas consequências na língua que domina. O português é hoje a língua mais falada no hemisfério sul… Graças ao Brasil. Sim, ao português do Brasil. E há uma compreensão exacta que leva a que a nossa relação com a cultura chinesa, com a aprendizagem das instituições da República Popular da China (RPC), parta desta ideia, da necessidade de aprender o português porque é uma língua importante. Estamos a chegar à sua primeira pergunta, sobre a importância das artes. Esta capacidade que temos de aprender várias línguas, paralela à necessidade de usarmos a linguagem universal da arte, para podermos dialogar melhor. Que análise faz à intervenção do Estado português na EPM nos últimos anos? Houve algum distanciamento? É indispensável continuar a haver uma atenção especial e um acompanhamento relativamente à experiência da EPM. É algo que, quer junto do ministro da Educação e do Governo, tenho exprimido com especial ênfase, até pela ligação antiga que tenho à escola, em relação a alguém de quem sou muito próximo, que é o professor Roberto Carneiro [ligado à Fundação da EPM]. Essa atenção terá sempre resultados positivos no plano político e na relação com o centro fundamental da economia mundial, que é a RPC e a língua chinesa. Quando era ministro da Educação e lidou com o dossier da EPM, quais eram os maiores receios relativamente ao período pós-1999? O receio fundamental não se verificou, que era uma redução muito drástica do número de alunos e da presença da língua portuguesa em Macau. Considero que o trabalho realizado e a prática assumida em Macau tem permitido que a língua portuguesa continue a ter um lugar importante. As autoridades chinesas também contribuíram para esse sucesso ao apostar na língua portuguesa, nomeadamente Pequim, além do apoio financeiro das autoridades de Macau à escola. Não tenho dúvidas. Sei bem, até porque a minha experiência, na sociedade civil, em termos do diálogo cultural, tem sido positiva. O papel da RPC no aspecto da língua é positivo. Acompanhou o diálogo com a China relativamente à Declaração Conjunta quando era assessor de Mário Soares na Casa Civil da Presidência da República. Considera que a Declaração Conjunta e a Lei Básica têm sido cumpridas por Pequim? Pelo que tenho acompanhado, sim. Há uma relação que globalmente é positiva. Portugal deveria dar mais atenção a Macau no plano político, e não apenas económico? Nesse domínio, não tenho uma leitura pessimista. A minha preocupação é defender o aprofundamento do carácter positivo dessa relação. Tenho uma perspectiva positiva [da evolução da situação após 1999], pois penso que devemos fazer um esforço real para que as coisas corram o melhor possível. Em relação à relação bilateral entre Portugal e China, que análise traça sobre o seu futuro? A posição portuguesa desenvolve-se no contexto europeu e compreendendo as condicionantes geoestratégicas actuais. Vivemos um sistema de polaridades difusas e vão haver vários focos de desenvolvimento. A verdade é que não podemos pensar no futuro da geoestratégia mundial sem o papel crescente da China e a sua importância. É indispensável que essas polaridades que encontramos devam pender para se equilibrar em nome da paz. Uma cultura de paz para mim é particularmente importante e isso só existe se houver equilíbrio de várias influências. Naturalmente que esse equilíbrio obriga a que a Europa tenha maior protagonismo na cena internacional ao lado dos grandes polos que se vão desenvolvendo. O que mais se vai desenvolver nos próximos anos será o polo asiático e a RPC. Devemos fazer com que haja mais cooperação na cultura, na ciência, economia, de forma a que possamos ter paz. Daí a importância que tem a ONU e sobretudo uma perspectiva positiva relativamente à acção dos vários países. Não posso deixar de referir a nova rota da seda e a importância que um país com uma grande costa marítima, como é Portugal, com relacionamento com todos os continentes, tem numa estratégia como essa. O dossier Macau foi muito importante no período da Presidência de Mário Soares. Houve momentos de tensão também. Naturalmente que sim. Recordo-me que havia, da parte de Mário Soares, uma consciência muito clara relativamente à importância da cooperação com a Ásia e com o desenvolvimento das potências asiáticas nos vários domínios. Falo da China, mas também da Índia. De facto, se hoje não temos qualquer dúvida sobre a importância geoestratégica da Ásia, nessa altura nem todos puderam ver tão longe como o então Presidente da República, que compreendeu bem que o futuro estaria justamente num país tão antigo e rico culturalmente e espiritualmente como a China. A China era também um país em desenvolvimento, isso também terá contribuído para uma diferente visão por parte das autoridades portuguesas. Mas a verdade é que o lugar que hoje a China tem no mundo confirma a ideia que então existia, de que o desenvolvimento iria ter um curso de grande importância. Daí chamar a atenção para o facto de se ter confirmado essa ideia que só os mais lúcidos tinham. Se tivesse de apontar o momento de maior tensão durante a Presidência de Mário Soares, relativamente a Macau, qual seria? O momento em que se tornou indispensável assinar a Declaração Conjunta e subscrever um regime que se revelou positivo, mas onde havia muitas desconfianças nos anos 80. Em relação às autoridades chinesas ou ao futuro? Ao futuro. Nem todos seguiam a ideia de Mário Soares e outros governantes. Aí devo referir que além de Soares também o general Ramalho Eanes teve um papel extremamente positivo porque conhecia Macau. Eles tiveram um papel importante ao poder antecipar o futuro. Havia desconfianças que os rodeavam, a opinião pública está sempre cá e tem uma visão menos aberta e consciente. Quer Eanes e Soares compreenderam que o futuro passaria por Macau. Sinto-me sempre em casa em Macau e ao se assinalar os 100 anos da publicação de Clepsydra, de Camilo Pessanha, o facto de ele ser um autor da língua portuguesa, é um forte elo que nos leva a compreender a importância do diálogo cultural com Macau. Os 100 anos da Clepsydra podem e devem ser uma oportunidade para uma reflexão positiva sobre a importância desta relação cultural. Daí ter referido a complexidade da Declaração Conjunta e não factos menores, episódios que ocorreram que foram circunstâncias menores. No plano dos factos, menciono essa negociação que obrigou a coragem, a visão de futuro, designadamente a compreensão quanto à permanência da língua portuguesa. É algo que existe em Macau, mas [que existe] também pela compreensão da RPC. Programa “Arte na Escola” A palestra online protagonizada por Guilherme d’Oliveira Martins insere-se no programa educacional e artístico “Arte na Escola”, que arrancou a 25 de Março e que é desenvolvido pela associação BABEL em parceria com a Associação de Pais da Escola Portuguesa de Macau. Importado do modelo que a Fundação Serralves, em Portugal, apresenta em várias escolas, “Arte na Escola” destina-se a toda a comunidade escolar, incluindo pais, alunos e educadores.
Andreia Sofia Silva EventosArte Contemporânea | José Drummond promove “Tête-à-Tête” com Wang Yanxin José Drummond, artista português de Macau, promove esta quinta-feira, dia 4, uma conversa online sobre arte com o artista chinês Wang Yanxin, intitulada “Tête-à-Tête”. O evento, com performances que duram cerca de 30 minutos, tem o apoio da associação local BABEL Os interessados em arte chinesa contemporânea ou amantes do trabalho de Wang Yanxin poderão saber mais sobre o trabalho deste artista esta quinta-feira, dia 4 de Fevereiro, graças a um evento via Zoom promovido por José Drummond, artista português de Macau com estúdio em Xangai. O evento, intitulado “Tête-à-Tête: Wang Yanxin – A project by José Drummond” conta com o apoio da associação cultural BABEL, de Macau. Ao HM, José Drummond explicou como surgiu a possibilidade de abordar o trabalho deste artista. “Este é um projecto meu que acompanha a tendência do último ano, ou dos tempos de pandemia que vivemos. Os encontros, conferências, aulas e por aí em diante ganharam voz especialmente através do Zoom. Tendo dito isto não existe oportunidade mas sim intenção de fazer para poder continuar a contribuir para o diálogo da arte contemporânea.” A parceria com a BABEL é para continuar, estando programada a realização de “uma ou duas conversas online todos os meses”, estando já dois artistas chineses pensados para participar nesta iniciativa. O primeiro contacto de José Drummond com Wang Yanxin aconteceu em 2017, quando ambos se conheceram num festival na cidade de Lijiang, província de Yunnan. “De imediato nos interessamos pelo trabalho um do outro até pelas enormes diferenças que existem no produto final. Muitos aspectos, de contexto, são próximos, como a ideia de não permanência e repetição”, descreveu. Este contacto fez com que o trabalho de Wang Yanxin tenha estado representado no VAFA – Video Art for All, um festival de vídeo local dirigido por Drummond. O corpo e o seu ambiente Nascido em Lanzhou, na província de Gansu, Wang Yanxin estudou na Academia de Belas Artes de Sichuan e desde 2012 que tem estado envolvido com o mundo das artes multimédia. Já participou em festivais e eventos artísticos de países tão distintos como China, Hungria, Polónia ou Japão, incluindo mostras em Macau e Hong Kong. O trabalho de Wang Yanxin foca-se muito em experiências emocionais e físicas, numa constante exploração do corpo humano e de como este se relaciona com os ambientes à sua volta. A ideia principal é um teste permanente aos limites do corpo, à medida que este se vai focando nos elementos sensoriais e espirituais. “Muitas das suas performances não duram mais do que 30 minutos, consistindo em acções repetidas e sequenciais”, que ajudam “a compreender a existência humana”. Drummond destaca “uma certa crueza, um risco e honestidade que se sente” nas performances criadas por Wang Yanxin. “Ele conta já com alguns prémios, o que de algum modo o destaca como um valor a seguir. É um artista que vive numa cidade alternativa [Chengdu] aos grandes centros, como Pequim e Xangai.” Isso “ajuda a ter uma noção mais alargada do espectro artístico do país que não está dependente das modas das duas principais cidades”, e onde existe “um crescente número de artistas e uma diversidade de práticas”. A título pessoal, José Drummond promete não parar e já tem algumas ideias para novos projectos. “A maior parte ainda não posso divulgar, mas esta primavera pretendo tratar a sério do meu quintal e torná-lo numa instalação permanente”, concluiu.
Sofia Margarida Mota Entrevista MancheteMargarida Saraiva: “É necessário avançar com coragem” Margarida Saraiva dedica a vida e o tempo à arte. A fazer curadoria no Museu de Arte de Macau, tem a carreira marcada pela dedicação à investigação e à educação. Há três anos fundou a Babel, associação que se dedica à arte contemporânea numa vertente pedagógica, sem esquecer questões ambientais [dropcap]O[/dropcap] seu nome tem estado, ultimamente, associado à curadoria. Como é que apareceu esta vertente no seu trabalho? Estudei História de Arte e depois Museologia. Trabalhei muito tempo como investigadora, mas era um trabalho que acabou por ser tornar aborrecido por sentir que tinha pouco contacto com as pessoas. Foi então que comecei a trabalhar voluntariamente em educação e a fazer cursos de artes para crianças. A minha função dentro do Museu de Arte de Macau (MAM) passou a estar mais ligada à educação do que à investigação. Entretanto, decidi criar a Babel para fazer mais coisas e a curadoria acabou por se lhe seguir. Sou curadora das pinturas históricas e contemporâneas do MAM e, em Abril, vai ser inaugurada a primeira exposição com esta função. O que podemos esperar desta exposição? É um trabalho centrado na mulher. A exposição divide-se em dois momentos: um baseado em pinturas, aguarelas e gravuras históricas que vão até meados do séc. XX com agenda para Abril e, perto do final do ano, tem lugar um segundo momento que inclui obras feitas apenas por artistas mulheres de Macau. O primeiro momento dá uma visão do papel da mulher na sociedade e a forma como ela é apresentada ao mundo da história da arte. A história da arte reforça o papel que a mulher deve ter. Temos obras sobre os dez trabalhos da mulher na sociedade chinesa, o casamento, a mulher na publicidade e o seu papel na família. Temos também retratos a óleo de mulheres proeminentes na sociedade local. É uma visão alargada daquilo que existe na colecção do museu. Vamos incluir também cerâmicas e tentar que a exposição não se feche, tentei uma abordagem interdisciplinar. A colecção do Museu de Arte de Macau situa-se, de um certo ponto de vista, na con uência de duas tradições artísticas muito diferentes. Temos obras que são maioritariamente de tradição chinesa e outras de tradição ocidental. Juntar as duas coisas na mesma exposição não é fácil, mas penso que consegui encontrar o fio à meada. Porquê o tema? Uma forma de intervenção? É absolutamente evidente que o papel da mulher continua a ser subvalorizado na sociedade contemporânea local. Nessa perspectiva, vale a pena pensar acerca desse assunto, até para estimular a criação artística entre as mulheres. Como é que vê o panorama dos museus e espaços de exposições em Macau? Macau tem espaços óptimos. A ideia de que não os há é uma falsa questão. A arte, hoje em dia, não precisa de galerias da mesma forma que as instituições não precisam de ter um lugar físico. O que é necessário é criar conteúdos porque há muitas instituições com espaços sem nada e que estão cheias de equipamentos sem ser utilizados. O que realmente interessa é criar conteúdo de qualidade e, quem for capaz de o fazer, tem as portas abertas em todas as instituições. Há também a cidade inteira que pode ser uma galeria gigante e que é um espaço fantástico a precisar de arte em todo o lado. “É absolutamente evidente que o papel da mulher continua a ser subvalorizado na sociedade contemporânea local.” Onde estão os artistas para esses espaços? Nenhuma cidade do mundo trabalha apenas com os artistas locais. É preciso criar sinergias e, nesse particular, os curadores podem dar uma ajuda: pôr as pessoas a trabalhar em conjunto. Colocar pessoas que sabem mais a comunicar com aquelas que possam ter menos oportunidades, os que têm mais conhecimento e menos capacidade económica com o inverso. É preciso fazer um caleidoscópio para que as coisas brilhem. Mas, para isso, é preciso fazer e querer. É necessário avançar com coragem, que é uma coisa que, por vezes, falta. Falta capacidade de visão, falta coragem na realização e falta capacidade de criar esse tal caleidoscópio. É aí que se insere a Babel? Gostava de trabalhar de uma forma interdisciplinar nas vertentes da arte contemporânea, da arquitectura e do ambiente com uma missão educativa, ou seja, com o objectivo de gerar oportunidades de aprendizagem reais, concretas, eficazes e, de alguma forma, inesquecíveis para jovens de Macau. O primeiro projecto que fizemos foi o “Influxos”. É uma ideia que envolve pessoas de Pequim, Macau e Portugal. É um projecto em movimento em que cada edição tem início em lugares diferentes. Juntamos estudantes da área do cinema e da arte contemporânea num processo criativo comum. Apresentamos aos alunos a forma como os artistas contemporâneos têm introduzido o cinema nas suas obras. Por exemplo, um filme pode ser concebido para ser projectado numa bola de gelo gigante que está permanentemente a derreter e, neste caso, a forma como vemos o filme, como o pensamos ou o escrevemos é diferente do que se aprende numa escola de cinema – e também não se aprende numa escola de artes onde as disciplinas ainda estão muito divididas. Com o “Influxos” queremos criar uma oportunidade que seja inesquecível, não só pelo facto de permitir aos alunos de várias partes do mundo trabalharem num projecto comum, mas também por promover uma abordagem mais experimental do que a que propõem, hoje em dia, as universidades. Foi um projecto muito bem-vindo pela parte do Instituto Cultural e, como tal, não tivemos dificuldade para que fosse financiado, porque vai ao encontro de toda uma política de promoção das indústrias culturais. Como é que tem sido a adesão, especialmente dos estudantes do território? Os alunos são, até agora, escolhidos pelas universidades e cabe às instituições decidirem o método de selecção. Estamos agora a pensar abrir, nas próximas edições, candidaturas independentes. Mantemos o modelo em que há uma participação fechada e, ao mesmo tempo, abrimos espaço a alunos que mostrem o portfólio para poderem ser seleccionados. O novo modelo tem a vantagem de abrir o leque de participações. O sucesso do projecto regista-se quando alunos de Macau descobrem que sabem pouco e que vale a pena investir em estudos em Pequim ou em Portugal. O confronto com a necessidade de mais conhecimento é muito importante para os alunos que nunca saíram do território. O “New Visions” é outro projecto da Babel, mas com foco na divulgação. As exposições em Macau são sempre colectivas. É evidente que, numa mostra colectiva, não se consegue ver a qualidade da obra de um artista. As exposições colectivas são muito boas porque mostram muita gente. Isto é óptimo para pôr nos relatórios que as instituições têm de fazer umas para as outras, para justificar gastos e preencher formulários. Dá muito jeito dizer que uma exposição teve 30 artistas, mas o que é que realmente as pessoas viram do trabalho de um criador ou o que é que o artista bene cia com a participação? Quisemos deliberadamente criar uma oportunidade dirigida a jovens artistas locais e trazer a este espaço pessoas que nunca tivessem tido oportunidade de fazer uma exposição individual. “Há a cidade inteira que pode ser uma galeria gigante e que é um espaço fantástico a precisar de arte em todo o lado.” Como é que se processa? Não se trata apenas de uma exposição. Cobrimos todos os gastos de produção da exposição, o que também é uma coisa rara em Macau. As instituições normalmente têm espaços, gastam todo o dinheiro na sua manutenção e acabam por não ter meios para apoiar os artistas. O resultado é que os artistas que quiserem expor têm onde fazê-lo, mas têm de pagar do seu bolso toda a produção da obra. Isto não acontece em mais nenhuma profissão. O objectivo, aqui, é ainda produzir um livro. Aqui não há produção de um discurso crítico sobre a arte e, como tal, as exposições são apenas acerca de pôr obras na parede. Não há o pensamento do porquê de estarem expostas, de como estabelecem um diálogo entre si, como se ligam ao que é produzido na China e como se articulam com o que se faz no mundo. A qualidade das obras depende de uma malha de referências em relação às quais se situam e que lhes permite produzir discurso crítico visual a um nível mais alargado. Foi neste sentido que quisemos fazer um catálogo que produza esse discurso crítico. É um livro com muito texto que nos permite, a longo prazo, escrever a história da arte contemporânea de Macau. As preocupações da Babel associam a arte ao ambiente. Como é que se concretiza esta vertente? Relativamente ao ambiente, acabámos de participar na produção do livro “Árvores e Grandes Arbustos de Macau”, de António Paula Saraiva. O lançamento está previsto para este mês. Trata-se de um livro técnico e é a mais completa compilação sobre as árvores de Macau, numa edição trilingue e com ilustração de artistas portuguesas. Os desenhos são feitos a lápis e aguarela. Originalmente, a intenção era a produção de 256 gravuras mas não houve orçamento para tanto. Já zemos uma exposição no Instituto Internacional, e os desenhos vão ser digitalizados e impressos em tela de modo a circularem pelas escolas de Macau. O objectivo é dar a conhecer os principais arbustos da cidade à população mais jovem. É uma forma de sensibilização para as questões ambientais. Macau é muito densamente povoado e construído, mas não conseguimos ver as árvores. Quando andávamos a fazer o livro era impossível fotografar as árvores inteiras. Há sempre muito ruído e as plantas estão cobertas de pó. Este foi o trabalho que abriu as hostes na área do ambiente. “Não quero cá trazer um artista que depois se vá embora sem deixar rasto. É fundamental que os jovens locais possam trabalhar em conjunto com artistas que vêm de fora.” Este ano tencionam criar uma instalação num espaço público em grande escala que conta com a participação de um arquitecto japonês. O que é que vai acontecer? Na área da arquitectura temos o “Macau Arquitecture Promenade” (MAP) em que intervimos em espaços da cidade. É um projecto que não é tão linear quanto os anteriores. Enquanto o “Influxus” e o “New Visions” vão de encontro às linhas de acção governativa, o MAP vai mais à frente. Não é de nível. A edição de 2017 não está garantida. Temos o programa nalizado, mas ainda não temos orçamento suficiente para avançar. Contamos com a vinda de um artista japonês que resulta de uma parceria que a Babel tem com o Departamento de Arquitectura da Universidade de São José. Surgiu, desta forma, a possibilidade de trazer um arquitecto que trabalha com questões modulares no espaço público. Chama-se Kengo Kuma. Temos o arquitecto satisfeito com a ideia de cá estar e queremos também trabalhar com os alunos da universidade no desenvolvimento do design final da instalação. Não quero cá trazer um artista que depois se vá embora sem deixar rasto. É fundamental que os jovens locais possam trabalhar em conjunto com artistas que vêm de fora.