Via do Meio关帝 Guan Di – deus da Guerra José Simões Morais - 7 Nov 2025 Em Macau, a maior parte dos estabelecimentos comerciais têm a imagem de Kuan Tai (Guan Di em mandarim), que se apresenta com um corpo forte, cara vermelha, longa barba preta e vestindo como oficial militar, a segurar na mão direita uma lança. Como pessoa é conhecido por Guan Yu e está relacionado com a queda da dinastia Han e às lutas para o estabelecimento do reino Shu, no período que antecedeu os Três Reinos. Com o nome de Chang Sheng (长生) nasceu em Xiezhou (hoje Yuncheng, província de Shanxi), no dia 24 do sexto mês lunar dos anos 60 do século II. Como episódio da sua juventude conta-se que certo dia um fidalgo quis à força possuir uma rapariga e Guan Yu, indignado, matou-o. Perseguido pelas autoridades teve que fugir e segundo a lenda, para não ser reconhecido Guanyin (conhecida em Macau por Kun Iam) transfigurou-lhe a cor da cara para vermelho. Outra história refere que um proprietário rural com muito poder, para obrigar toda a gente a comprar-lhe água, conspurcava as outras fontes da região. Saturado com tamanha infâmia, Guan Yu um dia matou-o e teve que fugir da cidade. Nessa fuga, para passar a fronteira (guan), tomou o nome de Guan Yu. Nos finais da dinastia Han do Leste (25-220), a decadente corte em Luoyang era dominada por eunucos e generais. Guan Yu vagueava como vendedor ambulante na municipalidade de Zhuo, (hoje província de Hebei), quando se encontrou com Liu Bei e Zhang Fei. Os três fizeram um juramento no jardim dos Pessegueiros tornando-se irmãos de armas, com o voto de Guan Yu e Zhang Fei ajudarem Liu Bei, ligado à casa real dos Han, na sua sublevação armada para estabelecer o reino Shu-Han. Por essa altura havia outras duas diferentes facções que dividiam o país e assim no Norte, dominava o exército Wei liderado por Cao Cao, no Leste e Sul as forças Wu e a Oeste, os Shu. Eram constantes as batalhas entre elas. Guan Yu, um ávido leitor do Clássico “Anais da Primavera-Outono” (Chunqiu jing), que o acompanhava sempre, comandava a guarnição Shu em Jingzhou há 10 anos. No ano 219/220, estando ocupado numa batalha fora da muralha contra as forças Wei, foi apanhado por um ataque surpresa do exército Wu, que era mais ou menos aliado dos Shu. Os Wu conquistaram a cidade e mataram Guan Yu, decepando-lhe a cabeça para, como prova de amizade, a entregarem a Cao Cao. A meio caminho souberam que os Wei tinham feito um acordo de paz com os Shu e por isso, a cabeça foi abandonada junto a Luoyang. O processo da sua deificação foi longo. Apesar de só ter sido Deus da Guerra durante o período Ming, quando em 1578 o imperador Wan Li lhe deu o título de Imperador Guan (Guan Di), já na dinastia Sui tinha um templo a si dedicado no local onde foi sepultado, sendo os títulos dados por todas as seguintes dinastias. Durante a vida, Guan Yu tinha a posição de Oficial Militar (Hou). Na dinastia Song tomou o lugar de Rei (Wang). Pela sua lealdade, honestidade, piedade, benevolência, sentido de justiça e coragem, tornou-se muito popular devido ao livro San Guo Yan Yi, escrito no início da dinastia Ming. Foi nessa dinastia promovido a Imperador (Di) e depois, em 1614, a Sábio (Sheng) ou Santo Militar (Wu Di). Como Ser tão perfeito, todas as profissões o querem como patrono e assim é venerado como Deus da Guerra, da Literatura, da Riqueza e patrono das Artes Marciais. Em Macau, Guan Di é conhecido por Kuan Tai e o templo Sam Kai Wui Kun, situado na rua Sul do mercado de S. Domingos, é-lhe dedicado. Aí, a imagem do Deus é toda dourada, não tendo objectos nas mãos e está acompanhado à sua esquerda por Chau Chong e do outro lado por Kuan Peng. O seu aniversário acontece no dia 24 do sexto mês lunar apesar de não se realizarem oficialmente nenhumas festividades em sua honra. 灶神 Zao Shen – o deus do Fogão O deus do Fogão, conhecido em Macau por Tchôu-Sân (em mandarim Zao Shen), é o mais importante das divindades domésticas e duas vezes por mês (durante a Lua Nova e a Lua Cheia) recebia oferendas, apesar do seu aniversário apenas ser celebrado no terceiro dia, da oitava Lua. No entanto, as cerimónias mais importantes realizadas a este deus são as que ocorrem antes da viagem de uma semana, quando o deus deixa o lar e vai ao Céu fazer o relatório anual ao Imperador de Jade sobre a família da residência onde está colocado. E é por isso que este deus, também conhecido por deus da Cozinha, como por simplificação passou a ser chamado o deus da Chaminé da Cozinha, tem grande poder sobre a vida das pessoas que formam o agregado familiar. É na última semana do ano lunar, que sobe ao Céu para se reunir com o Imperador de Jade, onde lhe relata os acontecimentos ocorridos na habitação a seu cargo, regressando no primeiro dia do ano, onde de novo é colocado na cozinha, atrás do fogão. Na véspera da viagem, no vigésimo terceiro dia do último mês lunar, os habitantes da casa oferecem sacrifícios a esta divindade, enchendo-o de guloseimas para que apenas conte coisas boas ao Imperador de Jade. Numa cerimónia realizada apenas pelos homens, o deus do Fogão parte transportado num cavalo e para que a viagem seja fácil e agradável, um dos seres masculinos da casa pega numa vela e queima a imagem do deus para que mais facilmente ascenda pelo fumo ao Céu. Antes de ser nomeado pelo Imperador de Jade como Deus do Fogão, ou da Cozinha, fora um marido que, tendo gasto todo o dinheiro ao jogo e vendido a sua mulher, anos mais tarde ao mendigar pelas ruas chega à casa da sua antiga esposa. Esta, reconhecendo-o e com pena dele, leva-o para a cozinha onde lhe dá de comer. Mas o actual marido chega e para que não o veja, esconde-o na lareira. Quando a criada acende o lume este, para não comprometer a caridosa mulher, ali se deixa ficar. O Imperador do Jade vendo o seu sacrifício, nomeou-o deus do Fogão, conhecido também como deus da Cozinha, ou deus do Lar. Existem outras versões tanto para como o homem perdeu o dinheiro, como a sua ex-mulher o apoiou. Esta, sem ser reconhecida pelo ex-marido, deu-lhe alguns bolos onde colocou uma moeda em cada um. O homem, no caminho encontrou um outro pedinte, que ao ver o saco com os bolos, lhe pediu um. Este ao descobriu a moeda no meio do bolo e percebendo que o outro não sabia do recheio propôs ficar com todos, o que conseguiu a troco de uma pequena quantia. Quando mais tarde veio a saber o que tinha feito, percebendo a sua pouca sorte, resolveu suicidar-se. O Imperador do Jade vendo a sua bondade, nomeou-o deus da Cozinha. A celebração da viagem até ao Céu desta divindade começou por se realizar no Verão, mas na dinastia Han passou para o Inverno e durante a dinastia Ming foi celebrada pelos populares no dia 24, realizando-se os sacrifícios no dia anterior. Zao Shen é representado numa imagem onde consta apenas a sua figura, ou associada com a consorte, ou ainda apenas com caracteres, que se coloca no primeiro dia do ano lunar na cozinha por detrás do fogão.