Via do MeioA busca de Pan Gongshou por um jardim numa encosta Paulo Maia e Carmo - 7 Jan 2025 Xie Lingyun (385-433), o irreverente poeta viandante que quis conhecer rios e montanhas ignorados, participou num grande banquete no dia 24 de Outubro de 418, na festa Chongyang jie, do «Duplo nove», em que era homenageado Kong Jing (347-422) um antigo conselheiro e apoiante de Liu Yu (363-422), que seria o fundador da dinastia Liu Song. Nesse banquete que decorreu em Xima tai, o «Terraço para observar corridas de cavalos» em Pengcheng (Xuzhou, Jiangsu), Xie Lingyun foi chamado a compôr um poema «para inspirar confiança e segurança», numa altura em que o homenageado decidira retirar-se do serviço público e quando os partidários de Liu Yu ainda estavam em pleno processo de combate e consolidação do poder. Logo no início, o poema assinala os dois movimentos contrarios: «No último mês do Outono os ventos na fronteira Norte são ríspidos e cruéis, Os cisnes migrantes voam contra as investidas do frio intenso e da neve.» Depois, descreve: «O peregrino, de regresso, segue o curso do rio até ao limiar do oceano, Faz uma vénia, tirando o chapéu, e sai das fileiras da corte. Abrandando os remos o barco é amarrado nos serpenteantes baixios, Olhando para a sombra do sol, ele aguarda que a música anuncie o fim do banquete, As correntes do rio correndo adiante com rapidez.» Mas o poeta não se exime, olhando o exemplo, colocando-se em questão: «Como posso eu apenas contemplar os nossos caminhos separando-se? É o querido objectivo, para meu desgosto, que eu agora vou contra. Aquela maravilhosa via do jardim numa encosta da montanha. Ah, como lamento a minha frágil virtude e vãs demandas.» Mas a busca prosseguiria até ao fim. Na dinastia Qing um outro poeta e pintor que leu o poema, percebeu a contraditória vontade como se estivera presente no famoso banquete. Pan Gongshou (1741-1794), numa folha de um álbum de pinturas e poemas de c. 1790 (Universidade de Alberta), recordou Xie Lingyun e o poeta Pan Yue (247-300) com quem partilhava o nome de família e que de modo memorável chorou a morte da esposa: «Vestígios daquele banquete e das músicas do tempo de Xie Lingyun, o duque Kangle, começam a extinguir-se,/ O poeta Pan Yue sentiu o Outono encher-lhe o peito de tantas lágrimas./ Retirado, em sonhos, não alcançarei o meu desejo, resta-me apenas sentar-me sozinho,/ Mas sentado sob as nespereiras florescendo no início do Inverno, como poderei manter tais sentimentos?» O pintor de Dantu (Zhenjiang, Jiangsu) procuraria o seu «jardim numa encosta de montanha», entre pinturas que refez como se nelas quisesse habitar. Obras distantes no tempo, como os rolos verticais que se encontram no Museu de Arte de Harvard, inspiradas por obras de outros pintores como o monge do século X, Juran ou a notável Ma Shouzhen (1548-1604). Seguindo com eles no desassossego de percorrer ignorados rios e montanhas.