Perspectivas VozesLições de 2025 para a década Jorge Rodrigues Simão - 11 Dez 2025 “In a year of converging crises and recalibrated ambitions, 2025 taught the world that resilience is not merely endurance, but the capacity to adapt, reimagine, and act with foresight across economic, political, environmental, and technological frontiers.” Margaret Atwood O ano de 2025 ficará inscrito na história contemporânea como um período de intensas transformações, marcado por acontecimentos que atravessaram múltiplas dimensões da vida internacional e que exigiram dos Estados, das instituições e das sociedades uma capacidade de adaptação sem precedentes. No plano económico, verificou-se uma desaceleração global que reflectiu os efeitos acumulados de políticas monetárias restritivas, tensões comerciais e instabilidade geopolítica. O crescimento mundial situou-se em torno de valores modestos, insuficientes para responder às necessidades de inclusão social e de redução das desigualdades. A transição do ciclo de subida de taxas de juro para cortes graduais trouxe algum alívio às condições financeiras, mas revelou também fragilidades estruturais, com mercados emergentes a enfrentar restrições fiscais e cambiais que limitaram a sua margem de manobra. A América Latina registou uma expansão insuficiente para gerar emprego sustentável, enquanto a África continuou a lutar pela diversificação das suas economias, excessivamente dependentes de commodities. A Ásia manteve dinamismo industrial e tecnológico, mas a China enfrentou o desafio de estimular o consumo interno e corrigir desequilíbrios estruturais que se tornaram mais evidentes. No plano político, o regresso de Donald Trump à presidência dos Estados Unidos em Janeiro constituiu um dos acontecimentos mais marcantes do ano. A sua agenda voltou a ser dominada pelo lema “America First”, com medidas proteccionistas, expulsões em massa de imigrantes irregulares e o desmantelamento de sectores do governo federal. Estas acções geraram contestação judicial e acentuaram a polarização política interna, com a utilização da Guarda Nacional em cidades governadas por democratas e ataques aos meios de comunicação a reforçarem a percepção de erosão institucional. No plano internacional, Trump intensificou a actividade diplomática, com resultados variáveis, mas conseguiu protagonizar um papel central na trégua precária alcançada em Gaza, após dois anos de guerra entre Israel e o Hamas. Este cessar-fogo permitiu a libertação de reféns e prisioneiros, bem como o aumento da ajuda humanitária, embora insuficiente segundo a ONU, e deixou em aberto a questão delicada do desarmamento do Hamas. A instabilidade no Médio Oriente foi agravada por ataques israelitas a instalações nucleares iranianas, que desencadearam uma guerra de doze dias entre os dois países, com bombardeamentos americanos no Irão. Em Setembro, Israel realizou operações inéditas contra altos dirigentes do Hamas em Doha, no Catar, ampliando a tensão regional. Paralelamente, os Estados Unidos intensificaram acções militares nas Caraíbas e no Pacífico, justificadas como combate ao narcotráfico, mas criticadas pela ONU como execuções extrajudiciais. Estas operações, que resultaram em dezenas de mortos, evidenciaram a disposição americana em projectar poder militar para além do Médio Oriente, reforçando a percepção de unilateralismo e contestação internacional. No plano geopolítico, a invasão da Ucrânia pela Rússia continuou a ter repercussões, com sanções e tensões energéticas a afectar a Europa. O conflito prolongado manteve a instabilidade na região e reforçou a necessidade de diversificação energética, acelerando a transição para fontes renováveis. No Sudão e em outras regiões africanas, guerras internas agravaram crises humanitárias, com milhões de deslocados e sistemas estatais em colapso. A cooperação internacional revelou fragilidades, com dificuldades em revitalizar mecanismos multilaterais e em garantir previsibilidade nos fluxos comerciais. No plano ambiental, os impactos das mudanças climáticas tornaram-se cada vez mais evidentes. Ondas de calor devastaram a Ásia, inundações atingiram o Brasil, a Indonésia e partes da Europa, incêndios florestais devastaram o Canadá e furacões como o Helene e Milton provocaram destruição nos Estados Unidos. Estes fenómenos expuseram a urgência da transição energética e da redução da dependência de combustíveis fósseis. A descarbonização da economia foi reconhecida não apenas como exigência ambiental, mas como oportunidade económica, com investimentos em energias limpas, mobilidade sustentável e eficiência energética a gerar empregos e a posicionar países como líderes na nova economia verde. O Fórum Económico Mundial identificou como principais riscos para 2025 os conflitos armados, os eventos climáticos extremos e os confrontos geoeconómicos. A conjugação destes factores revelou a necessidade de acção coordenada e estratégica. A regulação das tecnologias emergentes tornou-se tema central, com debates sobre protecção de dados, inovação responsável e riscos sistémicos. A ausência de normas globais claras aumentou as assimetrias e a insegurança digital, sobretudo em áreas como criptomoedas, inteligência artificial e plataformas digitais. As comparações regionais revelam disparidades significativas. Nos Estados Unidos, o crescimento rondou os 2,1%, reflectindo cortes graduais nas taxas de juro e políticas proteccionistas. A inflação desceu para valores próximos de 3%, mas o consumo interno manteve-se frágil. Na União Europeia, o crescimento médio foi de 1,3%, com a Alemanha a investir cerca de 40 mil milhões de euros em programas de transição energética e a França a reforçar a aposta na energia nuclear. Portugal registou um crescimento de 2,1%, sustentado pelo turismo, que recuperou para níveis recorde, com mais de 30 milhões de visitantes e receitas superiores a 62 mil milhões de euros, representando cerca de 21,5% do PIB, embora tenha enfrentado inflação persistente nos bens alimentares. Na América Latina, o Brasil cresceu 2,4%, mas enfrentou inundações severas que afectaram mais de 3 milhões de pessoas e provocaram perdas económicas estimadas em 15 mil milhões de dólares, apesar de a inflação se ter mantido em torno de 5%. A Argentina registou um crescimento de 5,5%, com inflação próxima de 30%, muito abaixo dos níveis superiores a 100% dos anos anteriores, reflectindo políticas de estabilização fiscal e monetária. Em África, o crescimento médio foi de 3,5%, mas desigual, com a Nigéria e Angola vulneráveis à volatilidade dos preços do petróleo e países do Sahel a viverem crises humanitárias agravadas por desertificação e conflitos armados. Na Ásia, a China cresceu cerca de 5%, abaixo das metas oficiais, reflectindo a necessidade de estimular o consumo interno. A Índia registou um crescimento robusto entre 7,5% e 8%, impulsionado por investimentos em digitalização, energias renováveis e reformas fiscais, mantendo-se como a economia de maior expansão global. Assim, o panorama económico de 2025 confirma fortes disparidades regionais. As economias dos Estados Unidos e União Europeia cresceram modestamente, enquanto a Índia e a China lideraram a expansão global. A Argentina destacou-se pela estabilização após anos de hiperinflação, e o Brasil enfrentou choques climáticos severos. A África manteve o crescimento médio positivo, mas marcado por desigualdades estruturais e crises humanitárias. Os impactos sociais foram profundos. Nos Estados Unidos, as políticas de expulsão de imigrantes afectaram centenas de milhares de famílias. Na Europa, o aumento do custo da energia provocou manifestações em países como França e Itália. No Brasil, as inundações destruíram comunidades inteiras, obrigando à realocação de mais de 500 mil pessoas. Em África, a escassez de água intensificou migrações internas. A crise de consumo interno em Macau reflectiu a diminuição do poder de compra dos turistas chineses e a retracção da procura local, afectando directamente sectores como a restauração e o comércio. As políticas ambientais ganharam destaque. A União Europeia reforçou o Pacto Ecológico Europeu, investindo mais de 100 mil milhões de euros em energias renováveis e mobilidade sustentável. O Canadá lançou programas de reflorestação que abrangeram 1 milhão de hectares. O Brasil procurou implementar políticas de gestão de inundações com investimentos de 10 mil milhões de dólares. A China investiu em tecnologias de armazenamento de energia, com projectos avaliados em 50 mil milhões de dólares. A Índia ampliou programas solares em zonas rurais, garantindo electricidade a milhões de pessoas. No campo tecnológico, a inteligência artificial e a digitalização transformaram economias e sociedades. Entre 2026 e 2030, mais de 50% das tarefas administrativas poderão ser automatizadas, criando novos desafios de emprego e exigindo políticas de requalificação. A utilização de criptomoedas e de tecnologias financeiras digitais poderá atingir mais de 500 milhões de utilizadores activos. A regulação global da inteligência artificial e das plataformas digitais será fundamental para evitar abusos de mercado e riscos sistémicos. Países como o Japão e a Coreia do Sul avançarão com legislações rigorosas, enquanto a Europa procurará liderar a criação de normas globais. No sector da educação, a digitalização e a inclusão serão prioridades. Até 2030, mais de 70% das escolas em países desenvolvidos poderão utilizar plataformas digitais para ensino híbrido. A inteligência artificial será utilizada para personalizar aprendizagem, adaptando conteúdos às necessidades individuais dos estudantes. Contudo, desigualdades persistirão em África e em partes da América Latina. A educação técnica e a formação contínua serão essenciais para preparar trabalhadores para novas exigências do mercado. (Continua)