VozesO falso aliado Carlos Coutinho - 14 Fev 2025 PARECE que começamos a abrir os olhos, porque, a crer na sondagem que hoje é notícia, apenas 18% dos portugueses sondados acham que os EUA são um país nosso aliado. Julgo eu que nunca o foram, a não ser num curto período da Segunda Guerra Mundial e, mesmo então, só por conveniência circunstancial de ambos os países. Quem cá mandava era o Salazar que até dos EUA pensava horrores, por lá haver, embora só legalmente, partidos diversos. Agradava-lhe, no entanto, perceber que quem de facto ditava as regras na terra do Tio Sam eram os possuidores e usuários da supremacia branca que praticavam uma exploração brutal das populações de cor, como na angolana Baixa do Cassange. Além disso, também existia a manutenção pós-esclavagista do apartheid, até nos transportes públicos, uma realidade muito difícil de ignorar até pelas máfias e mil igrejas cristãs. Acontece que na Europa dos 27 a clarividência dos sondados ainda é mais residual porque aceitam cordialmente o conceito do “parceiro necessário”, tal como limpar o rabo com papel de cores diversas, como se pode concluir da última sondagem realizada pelo European Council on Foreign Relations (ECFR). Nos países que participaram nesse inquérito (Alemanha, Bulgária, Dinamarca, Espanha, Estónia, França, Hungria, Itália, Polónia, Portugal, Reino Unido, Roménia, Suíça e Ucrânia), a grande maioria dos inquiridos acha que os EUA lhes bastam com o estatuto de “parceiro necessário”, com o qual se tem de cooperar estrategicamente”. É na França e na Alemanha que se encontram as parcelas mais expressivas da população que olham para os EUA como um rival ou um adversário, 19% e 23%, respectivamente. A sondagem, realizada entre novembro e dezembro últimos, estima ainda que a reeleição de Trump apenas veio alterar percepção europeia dos EUA, mostrando, por exemplo, a alteração ocorrida na Dinamarca, que no inquérito de Abril de 2023 tinha mais de mais de 50% dos inquiridos a dizerem que os EUA eram aliados e pouco mais de 30% a afirmarem que era Washington era um “parceiro” imprescindível. Algo mudou, então, no shakespeareano país do príncipe Hamlet, onde agora já há neonazis no governo, como na Bulgária, Estónia, Hungria, Itália, Polónia, Roménia, Ucrânia, Bélgica, Suécia, Noruega, Finlândia e outros. Os autores do inquérito da ESFR alertam para que “será difícil encontrar uma via europeia coerente para o futuro” e dividem os inquiridos em quatro categorias no que respeita à sua visão da posição dos 27: os euro-otimistas, que vêem a União Europeia (UE) como uma potência e acreditam que o seu colapso não está eminente com Trump no poder; os europessimistas, que acham que a EU não é uma potência geopolítica e antecipam o seu colapso para breve; os euro-realistas, que não encaram a EU como uma potência, mas não acreditam que irá colapsar; e os euromortalistas, que vêem a EU como um potência em risco de colapso. Eu não sei bem qual destas categorias me aquartelar, porque a minha preocupação é que, pelo caminho em que vamos, parece cada vez mais distante a libertação da Europa para a paz, a solidariedade e a dignidade de todos os seus cidadãos. Mas lá chegaremos, já que a história do mundo está feita de altos e baixos, sem nunca voltar ao princípio de todas civilizações, quando o que comesse mais também viveria mais. * QUEREM os partidos neonazis e da variada extrema-direita fazer da escola o bastião da sua batalha ideológica e cultural contra o sistema educativo, também muito variado, da chamada ideologia progressista” pelo que vemos a escola pública e a educação no centro de uma batalha feroz para normalizar as suas ideias. Segundo um estudo da revista científica “Arquivos Analíticos de Políticas Educativas”, existe uma “agenda política comum, embora com nuances nem sempre subtis, que dá forma a uma Internacional da Educação europeia de extrema-direita”. Mesmo sem estrutura orgânica ou funcional, relaciona-se sob a ideia comum de que “a escola é um espaço crucial através do qual se pode moldar a mentalidade da população”. Escrevem os autores do estudo, Enrique Javier Díez-Gutiérrez, e Mauro -Rafael Jarquín-Ramírez, citados por António Rodrigues, no “Público”, que a extrema-direita combate o progressismo instilando na cabeça das populações a que consegue chegar, e são muitas, “valores tradicionais” a partir de uma perspectiva de mercado, isto é, tingindo-os de uma estranha mistura de patriotismo, neoliberalismo, xenofobia e assimilação”, pelo que quem não for nesta onda tem se ser “encostado à parede”, como clamam André Ventura e seus prosélitos. O objetivo destes monstrinhos modernaços, muito bem lepenizados, é, segundo os autores do estudo, “questionar e desacreditar” o modelo da escola pública, “minar” a relação entre os pais e a escola, “fomentar o medo” nos professores até que eles próprios se censurem. Pretendem uma escola apolítica e neutra, tentando, ao mesmo tempo, eliminar a realidade de uma escola que eduque cidadãos com base “em valores democráticos plurais”, valores que favoreçam “a igualdade social”. Dão prioridade à decisão individual contra a ética pública e o bem comum”. Há que acrescentar que, sabendo tudo isto e professando uma ideologia democrática – visceralmente democrática na luta de classes –, eu nunca seria capaz de “encostar à parede” nem o Ventura nem o seu ex-compincha ladrão de malas.