Indulto paterno (I)

No passado dia 2 de Dezembro, 50 dias antes de deixar o cargo, o Presidente dos EUA Joe Biden concedeu um indulto total e incondicional ao seu filho Hunter Biden, acusado de obtenção ilegal de armas, evasão fiscal e de outros crimes, indulto que abrange ainda todas as possíveis violações das leis dos EUA cometidas no período compreendido entre 1 de Janeiro de 2014 e 1 de Dezembro de 2024. Uma vez que este indulto é “abrangente e incondicional”, não pode ser revogado, mesmo depois da investidura de Donal Trump como Presidente dos Estados Unidos.

Hunter Biden foi acusado de obtenção ilegal de armas por ter feito uma declaração falsa no formulário de verificação de antecedentes no acto da compra de um revólver em 2018. Hunter foi indiciado por três destes crimes, que no seu conjunto acumulam uma pena máxima de 25 anos de prisão.

Hunter Biden recebeu também nove acusações no domínio da evasão fiscal por não ter pago 1,4 milhões de dólares em impostos nos últimos 10 anos. O delegado do Ministério Público assinalou que o acusado tinha gasto o dinheiro em drogas, com acompanhantes e namoradas e que tinha uma vida luxuosa. Hunter Biden confessou-se culpado de todas as acusações no passado mês de Setembro. A pena máxima para crimes de evasão fiscal é de 17 anos.

Em declarações, Joe Biden afirmou que não iria interferir nas decisões dos tribunais, mas acreditava que o filho tinha sido tratado de forma selectiva e injusta. Biden estava também convicto que estas múltiplas acusações resultavam dos ataques de diversos opositores políticos e acrescentou que qualquer pessoa de bom senso só pode chegar a uma conclusão depois de analisar este caso: Hunter tornou-se um alvo por ser seu filho. Este tipo de procedimento está errado.

Em 1787, quando os Estados Unidos estavam a redigir a constituição federal, adoptaram as disposições da lei britânica que estabelecia o perdão real e introduziram o perdão presidencial na Constituição americana. A Constituição dá ao Presidente o poder de indultar criminosos. O perdão concedido pelo Presidente não pode ser alterado e o Congresso e os tribunais não o podem reverter. O indulto presidencial não tem de ser explicado nem justificado. De um modo geral, o Presidente atribui o indulto por razões de natureza política.

O Artigo 2.º da Constituição dos EUA dá ao Presidente o poder de indultar quem tenha violado leis federais. O Presidente pode indultar pessoas condenadas em tribunais federais, mas não pessoas condenadas em tribunais estatais ou por violação de impedimentos legais. A amnistia engloba o “perdão” e a “comutação de pena”. Depois de perdoado, o criminoso já não terá de enfrentar consequências legais; ou seja, nunca será condenado nem irá para a prisão. A comutação é uma redução da pena, como, por exemplo, alterar uma condenação de 30 anos para 3, ou mesmo para retirar a condenação na totalidade.

Durante o primeiro mandato, o Presidente Trump usou o seu poder de indulto 237 vezes. Perdoou Charles Kushner, pai do seu genro Jared Kushner, acusado de evasão fiscal e anunciou recentemente que Kushner será nomeado embaixador dos Estados Unidos em França.

Durante os seus dois mandatos, o Presidente Obama usou o poder de indulto 1.927 vezes e perdoou um total de 330 pessoas.

O Presidente Bill Clinton também perdoou em 2001 o seu meio-irmão Roger Clinton que tinha sio acusado de posse de drogas.

No passado dia 12 de Dezembro, a comunicação social americana divulgou que Biden iria perdoar 39 prisioneiros acusados de crimes não violentos, nos quais se incluem uma mulher que chefiou uma equipa de resposta a emergências durante desastres naturais, o Diácono de uma Igreja, conselheiro de toxicodependentes e de jovens, um estudante de biociência molecular e um veterano condecorado. Além disso, Biden vai reduzir as penas de 1.500 prisioneiros. Estes 1.500 detidos estiveram em prisão domiciliária durante a pandemia. Biden afirmou numa declaração:

“A América foi construída com a promessa de múltiplas possibilidades e segundas oportunidades. Como Presidente, sinto-me profundamente honrado por poder ser clemente para aqueles que demonstraram remorsos e querem ser reabilitados, dando-lhes a oportunidade de voltarem a participar na vida do dia a dia e de contribuírem para as suas comunidades, e por tomar medidas para eliminar as disparidades quantitativas para os delinquentes não violentos, particularmente para quem foi condenado por crimes relacionados com droga.”

As amnistias concedidas por Biden desencadearam grande controvérsia e críticas dentro e fora dos Estados Unidos. Estas críticas vieram não só dos seus opositores políticos, mas também da população em geral e do sector jurídico. Na próxima semana, iremos analisá-las.

Consultor Jurídico da Associação para a Promoção do Jazz em Macau
Professor Associado da Escola de Ciências de Gestão da Universidade Politécnica de Macau
Blog: http://blog.xuite.net/legalpublications/hkblog
Email: legalpublicationsreaders@yahoo.

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