Sexanálise VozesO Consentimento Entusiástico Tânia dos Santos - 23 Out 2024 Nos últimos anos, o debate sobre consentimento sexual tem sido intenso. Depois de todos os escândalos de assédio sexual, o consentimento é agora encarado de forma bem mais complexa. Uma abordagem mais contemporânea, já discutida na cultura popular e televisiva, é a do consentimento entusiástico. Este conceito visa complexificar o que se entende por consentimento. Baseia-se no seguinte: o sexo e todas as interações íntimas devem ser baseadas numa resposta clara e entusiástica de vontade, em vez de simplesmente não haver resistência. O consentimento entusiástico exige uma atenção cuidada à interação sexual, à forma como os corpos se sentem, e ao nível de disponibilidade e vontade durante a interação. Isto não significa que todas as interações íntimas se resumam a ambas as partes estarem igualmente interessadas e comprometidas com a experiência íntima, sem qualquer dúvida, pressão ou hesitação. O que importa é que ambas as partes estejam sintonizadas com possíveis mudanças, e que questionem a pessoa com quem estão: “isto sabe bem?”, “como te sentes?”. O consentimento, o simples, é preconizado pelo sim. Mas o sim pode ser mecânico ou resultar de pressões sociais ou emocionais. Pretender que o consentimento seja entusiástico para melhor aferir se uma relação sexual foi abusiva ou não, é apenas reforçar que o sim precisa de contextos, predisposições emocionais e comunicação para que se refira a uma intenção genuína. Este é um modelo para garantir que as relações íntimas sejam seguras, respeitosas e prazerosas para todas as partes envolvidas. Acima de tudo, serve para assegurar o respeito pela autonomia pessoal, permitindo uma comunicação clara e inequívoca sobre o que se quer e o que se sente confortável em fazer. As preocupações de que o sexo deixe de ser espontâneo e divertido são infundadas. Querer estar presente e atento à forma como se envolvem reforça relações de confiança e maior intimidade. O sexo não “acontece” simplesmente; ele é o resultado de uma negociação, que é verbal e física. Poderá ter existido a fantasia de que, em relações heterossexuais, as mulheres precisariam de alguma “persuasão” para se envolverem no sexo. E isso criava uma situação delicada: os homens achavam que este era um passo necessário, e as mulheres sentiam-se pressionadas, ficando o consentimento perdido algures no meio desta confusão. No mundo da libertação sexual, este é um cenário cada vez menos plausível, diria o meu otimismo. Não só porque as representações de género são cada vez mais complexas e matizadas, como também porque a natureza das relações e a forma como se encara o sexo têm mudado. Idealmente, o sexo é cada vez mais entendido como a oportunidade de sentir prazer entre duas pessoas, e terá de existir uma disponibilidade física e emocional para isso. Há quem, contudo, tenha criticado o facto de o consentimento entusiástico ainda depender de “pistas” sobre como as pessoas se sentem e se encontram disponíveis. E, de facto, a avaliação destas “pistas” pode não ser suficiente. Para pessoas que se identifiquem como assexuais, bem como para a comunidade BDSM, a questão do consentimento já há muito é trabalhada: o uso da palavra para explicitar limites é o melhor recurso para evitar mal-entendidos. Esta questão do consentimento entusiástico é particularmente importante junto dos jovens que estão na exploração da sua sexualidade. O conceito representa uma forma necessária de encarar as relações íntimas. Ao colocar a comunicação, o respeito e o entusiasmo no centro da experiência sexual, todos beneficiam. Não é apenas uma nova regra ou exigência, mas sim uma oportunidade de construir espaços de segurança para a exploração, baseados na igualdade e no respeito mútuo. Para jovens e para todas as idades.