Um Grito no Deserto VozesA dupla Hong Kong/Macau Paul Chan Wai Chi - 2 Ago 2024 A 18 de Fevereiro de 2019, o Conselho de Estado da China anunciou oficialmente as Linhas Gerais do Planeamento para o Desenvolvimento da Grande Baía Guangdong-Hong Kong-Macau, posicionando Guangzhou, Shenzhen, Hong Kong e Macau como os principais motores do desenvolvimento regional. Recentemente, a resolução da Terceira Sessão Plenária do 20.º Comité Central do Partido Comunista, referindo-se a Hong Kong e Macau, apela a esforços para “tirar partido dos pontos fortes institucionais do princípio ‘um país, dois sistemas’, de forma a reforçar e melhorar o estatuto de Hong Kong como centro financeiro internacional e como centro de navegação e comércio. Apela ainda ao apoio a Hong Kong e a Macau para que as duas regiões se tornem centros internacionais na formação de quadros de alta qualidade, aperfeiçoem a logística em causa e possam desempenhar um papel mais determinante na abertura da China ao mundo exterior”. Passado cinco anos, são evidentes as conquistas obtidas por Shenzhen e por Guangzhou. O transporte de contentores nos portos destas duas cidades já ultrapassou o do Terminal de Contentores Kwai Tsing, em Hong Kong. E após a abertura do “Corredor Shenzhen-Zhongshan”, o papel do Porto de Shenzhen torna-se cada vez mais importante. Mas, qual ó o ponto da situação dos outros dois motores principais, Hong Kong e Macau? No passado dia 30 de Julho, o Index Hang Seng de Hong Kong permanecia nos 17.000 pontos, não tendo conseguido reverter a tendência negativa apesar dos espantosos desempenhos dos atletas da cidade nos Jogos Olímpicos de Paris. Com a implementação da “Lei da República Popular da China para a Salvaguarda da Segurança na RAEHK” (doravante designada por Lei de Segurança Nacional de Hong Kong), a promulgação de leis pela própria região para a salvaguarda da segurança nacional, de acordo com o Artigo 23 da Lei Básica de Hong Kong, o aperfeiçoamento do sistema eleitoral e a governação ao nível distrital, devem ter dado saltos em frente rumo ao princípio “avançar da estabilidade para a prosperidade”. Infelizmente, o mercado imobiliário de Hong Kong continua em queda e a confiança dos cidadãos ainda não foi recuperada. Qual será o motivo que provoca tudo isto? Talvez a recente controvérsia em torno de um artigo possa lançar alguma luz sobre esta questão. O Professor Johannes Chan Man-mun, antigo reitor da Faculdade de Direito da Universidade de Hong Kong, e advogado de nomeada, escreveu um artigo de opinião intitulado “Efeito Retrospectivo” publicado no passado dia 24 no jornal de Hong Kong Ming Pao. Johannes Chan analisava as alterações à Lei de Salvaguarda da Segurança Nacional de Hong Kong no que diz respeito ao aumento de tempo para a libertação antecipada das pessoas condenadas por porem em perigo a segurança nacional, e se estas alterações têm efeitos retroactivos para os infractores não condenados ao abrigo da Lei de Segurança Nacional. Argumentava que “um réu condenado por um crime cometido no passado não deve receber uma pena mais pesada apenas porque actualmente a lei aumentou a penalização para esse tipo de crime. Este princípio é salvaguardado pela Declaração dos Direitos Humanos”. O objectivo deste artigo de opinião era lançar um debate jurídico. No entanto, na parte da tarde de dia 24, o Departamento dos Serviços Correccionais de Hong Kong emitiu de imediato um comunicado de imprensa que condenava vivamente Johannes Chan pela publicação deste artigo, afirmando que os “dois pontos mencionados no artigo e apelidados de “controversos” eram factualmente imprecisos. A Secção 7 da Lei de Salvaguarda da Segurança Nacional dá-nos uma clara definição de ‘Infração que põe em risco a segurança nacional’. No entanto, nada do que foi escrito no artigo cai dentro dessa definição, portanto o “Comissário dos Serviços Correcionais decidiu por si próprio alargar o âmbito das infrações que põem em risco a segurança nacional”. Mais tarde, numa entrevista, Johannes Chan disse, “Há não muito tempo, o nosso Chefe do Executivo afirmou que a liberdade de expressão em Hong Kong não tinha sido reduzida e que o Governo pode ser criticado. Mas agora vemos um exemplo vivo de como por meramente expressar uma opinião diferente se é contundentemente condenado pelo Governo. Como é que esta situação é compatível com liberdade de expressão? Não foi exactamente a isto que Jonathan Philip Chadwick Sumption (antigo Juiz Não-Permanente do Supremo Tribunal de Hong Kong) se referiu por altura da sua reforma antecipada, ao afirmar que o Governo tinha ficado preconceituoso e em estado de pânico?” O incidente com o artigo de Johannes Chan reflecte a falta de interacção positiva na sociedade durante a transição de Hong Kong da “estabilidade para a prosperidade”, indicando que ainda há um longo caminho a percorrer até à completa recuperação, ficando a sociedade dependente do espírito de “amor e perdão”. Em Macau, não houve conflitos sociais semelhantes aos de Hong Kong nos últimos anos, no entanto, o impacto da COVID-19 e as rápidas mudanças no cenário político conduziram a uma diminuição significativa da possibilidade de expressar opiniões diferentes. A Zona de Cooperação Aprofundada entre Guangdong e Macau em Hengqin foi inicialmente um excelente plano, mas infelizmente sofreu alterações sem precedentes. Liderado por uma abordagem orientada para o sector imobiliário, o desenvolvimento da Zona de Cooperação Aprofundada resultou numa situação do tipo “fazer a sementeira no Inverno. Os investimentos substanciais do Governo de Macau na Zona de Cooperação Aprofundada não obtiveram os efeitos pretendidos. A possibilidade de o Novo Bairro de Macau na Zona de Cooperação Aprofundada poder vir a alojar 60.000 residentes da cidade até 2029, não vai depender de tratamento preferencial, mas sim da economia da cidade. Com a aproximação do 25.º aniversário do regresso de Macau à soberania chinesa, quando as corridas de cães e de cavalos acabaram e as receitas da taxação ao sector jogo sofrem um declínio, é possível que o Chefe do Executivo Ho Iat Seng esteja a pensar sobre o futuro do próximo Governo da RAEM, durante as suas férias de 39 dias. Afinal de contas, como motores principais da Grande Baía Guangdong-Hong Kong-Macau, Hong Kong e Macau têm de fazer ajustes rapidamente para se porem a par do desenvolvimento geral da Grande Baía!