VozesA noite funda do tempo Amélia Vieira - 17 Abr 2024 Sem preces o mundo adormece. Estamos no ciclo mais baixo das alvoradas e dessas madrugadas que trouxeram as boas-novas e que passaram a lendas encantadas face a este escurecer de todas as auroras. Como se chegou tão rápido a esta realidade é questão de maior interesse. Nunca seríamos capazes de abranger num só diálogo coisa tamanha, mas por algum lado devemos começar. E comecemos por este instante todo em ebulição guerreira onde faltam soldados e onde a devassa da opinião atingiu níveis de guerrilha e a mordaça do sentido da vida uma caricatura que fere uma certa noção de humano, e veremos que estamos aqui, silenciados no meio do ruído em modo de espera por uma coisa qualquer que virá calamitosa. Não vem como o chamado ladrão na noite – não, não- todos nós estamos formatados para uma disrupção de nível avançado que nos tirará da jaula do nosso [melhor dos mundos] e nem por isso a nossa atenção se volve pertinente, precisa e urgente. Vamos ficando até a corda partir. A Guerra é a Guerra. Ponto. Temos toda uma certa componente guerreira inserida nos genes e dela não parecemos sair, nem distantes nos foram ficando as tormentas do sangue assassino da espécie que a matança elegeu como seu mais alta representante, e nesta exorbitância toda feita de razões, pretextos e códigos armamentistas, vamos flutuando como escribas de um duelo eterno. Só que não. Está tudo à beira de um qualquer fim. Basta abrir o tabuleiro de xadrez e passar ali dois dias seguidos para compreender a perfeição do organismo assassino que integrará os vates, valetes, reis e cavalos da parte potestativa do desejo de ação, que nós veremos como a matéria negra engole toda a formatação do jogo, onde, e sempre, as táticas de defesa, perfídia, crueldade, acabam tão menorizadas como o próprio Xeque- Mate. Dois dias a jogar serão dois anos…ou, dois anos jogando a razão cruente de uma extinção certeira. «O acaso não traz nada de novo, encontra cada um como está» por isso não será de forma abrupta todo este desvincular para um trevoso quaternário onde a memória faltará ao ciclo dos vindouros. Vamos ser desprogramados – grande ” crash”…apagão, apagar… – começar de novo sem a faculdade da memória para bem do ciclo futuro, que desta consciência agreste e difícil não restará nos espelhos aquilo que fora a nossa imagem, creiamos então que todo este fulgor destrutivo será somente o ardil varonil do suposto herói, e que no mais distante dos mundos será finda a insígnia que o segura. Ver para crer? Não se acredita que tenhamos de ver mais do embuste que fora chamado ” evolução” pois que involuímos já com hora marcada para as calendas onde só o Inferno nos nomeia. Gaza derrubou de vez a esperança na inteligência humana, a Europa fartou-se de pensar e está exangue, o muito que resta do planeta deixará a marca da sua futura vinda global, e mesmo assim, atravessada por transformações abissais que não comportam nenhuma sustentação, que outrora falávamos no fim dos Impérios, mas o Fim dos Fins, nunca foi falado, e Impérios são calendas que o nosso imaginário já nem comporta. Se estamos tristes? Não. Não estamos coisa nenhuma. Estamos a festejar a Batalha de Aljubarrota, o 25 de Abril e o 14 de Julho como se isto tudo fosse uma una e grande Festa. Ao menor sinal de empolgamento dizemos logo em coro: estamos contra a escalada dos conflitos! Há um Napoleão que quer ir para a Rússia armado em Valquíria, e lá vamos fazendo os nossos negócios, mudando os sexos (cansados e irreprodutíveis) escalando ainda mais a montanha da irrelevância. Pode haver um senão, como aquele antídoto da Bruxa da Branca de Neve: e se nos galgarem por cima e o bruxedo se desfizer? Pois bem, encontrarão apenas povos desolados a jogar futebol e a palitar os dentes artificiais. As dentadas nas carnes frescas desses caçadores- recolectores desfizeram-se em estrelas «Michelin» de aldrabices gastronómicas tais, que mais vale morrermos todos. Ai ai ai… que não! Afinal foi este o melhor dos mundos…! Até ao dia em que se tornaria também o mais anacrónico. E nunca esquecer que o melhor que a Terra tem, os poetas o fundam. Eles desapareceram no meio deste enxame de banditismo escrevente, mas sem eles, também perdemos de vez a única solução.