Criminalidade | Aumento a reboque da recuperação do turismo

Nos primeiros nove meses deste ano, o número de crimes aumentou significativamente face a 2022, mas ainda assim ficou aquém do registo de 2019. As excepções, pelas piores razões, são os crimes de abuso sexual de crianças, burlas através de telecomunicações e internet e ataques cibernéticos, que sobem também em relação ao período pré-pandemia

 

O secretário para a Segurança, Wong Sio Chak, apresentou ontem as estatísticas da criminalidade referentes ao terceiro trimestre de 2023, confirmando um cenário de aumento significativo face ao ano anterior, mas abaixo dos índices de criminalidade verificados antes da pandemia. “Acredita-se que o aumento do número de casos esteja relacionado com o aumento acelerado do número de turistas, a recuperação da economia e a diminuição da atenção do público”, explica o Governo.

No geral, entre Janeiro e Setembro, a Polícia de Macau instaurou 9.653 inquéritos criminais, um aumento de 31,7 por cento em comparação com o mesmo período de 2022, mas menos 8,9 por cento face a 2019.

Nas estatísticas apresentadas ontem, um fenómeno salta à vista, conforme reconhece a tutela da Segurança. “É consideravelmente notável o aumento do número de crimes contra o património, sendo a principal razão o aumento dos crimes de burla e de furto, mudança de tendência que é semelhante à situação da maioria dos países e das regiões vizinhas”.

Nos primeiros nove meses de 2023, as autoridades da RAEM registaram 1.412 furtos, quase o dobro do ano passado (+84 por cento), mas ainda assim menos quase um terço em relação a 2019 (-29,3 por cento).

Cair na armadilha

Porém, os crimes de burla registaram uma tendência de crescimento a toda a ordem, com 1.643 casos nos primeiros três trimestres deste ano, representando aumentos de 69,2 e 55,1 por cento, relativamente aos períodos homólogos do ano passado e de 2019. Neste capítulo, as autoridades destacam que as burlas mais frequentes são as que envolvem “consumo online com cartões de crédito”, e esquemas em que os burlões fingem ser funcionários de serviços públicos ou vendedores de bilhetes para concertos na internet.

A secretaria liderada por Wong Sio Chak explica este fenómeno com a mudança de estilo de vida trazida pela pandemia, que aumentou a dependência da internet, “fazendo com que o tipo de crimes tradicionais, em cuja prática é indispensável o contacto físico, se tenha transformado aceleradamente em crimes praticados com recurso às telecomunicações e à internet”.

As autoridades culpam ainda a comunidade pelo aumento das burlas, referindo que, apesar do “imenso trabalho de divulgação” da polícia e outros serviços governamentais, “existem algumas pessoas que caem nas armadilhas das burlas, devido à ganância ou a negligência”.

Wong Sio Chak prometeu reforçar o combate a esses casos, que provocaram perdas às vítimas de “pouco mais de 200 milhões de patacas”, e acrescentou que, graças a um mecanismo de alerta para suspensão de transações suspeitas e cessação de pagamento, a polícia conseguiu recuperar mais de 110 milhões de patacas em 505 casos.

Sem defesa

Outra tendência preocupante, que emerge das estatísticas reveladas ontem, é o aumento dos abusos sexuais de crianças, principalmente face ao período antes da pandemia, mais do que duplicando. Nos primeiros nove meses deste ano, registaram-se 24 casos de abuso sexual de crianças, total que representa um aumento de 4,3 por cento face a 2022, mas uma subida enorme de 118,2 por cento face a 2019.

Ainda assim, as autoridades sublinharam que os casos de abuso sexual desceram todos os trimestres desde o início de 2023, de 10 para 8 e 6 no terceiro trimestre. “Observa-se que há uma tendência de queda do número de casos e que as acções educativas de sensibilização têm alcançado resultados positivos”, declara o Governo.

Quanto às violações, os dados indicam que nos primeiros nove meses deste ano se registaram 27 casos, uma subida de 68,8 por cento em relação a 2022, mas uma redução de 15,6 por cento face a 2019.

Porém, as autoridades destacam que quase 70 por cento dos suspeitos e vítimas não eram residentes de Macau, que os crimes ocorreram, de um modo geral, em quartos de hotel e que “as vítimas deslocaram-se voluntariamente a esses hotéis, pelo que não se afasta a hipótese de que alguns dos casos tenham ocorrido na sequência de relações sexuais consensuais”. O Governo liga ainda os crimes de violação à prática da prostituição, acrescentando que, entre Janeiro e Setembro deste ano, a polícia interceptou 331 pessoas suspeitas de prostituição, e resolveu 13 casos de exploração de prostituição.

Ultra violência

Nos crimes que envolvem maior violência, destaque para o registo de quatro homicídios entre Janeiro e Setembro deste ano, total que contrasta com apenas um homicídio verificado no ano passado.

Também os sequestros regressaram às estatísticas da criminalidade, com 17 casos detectados pelas autoridades, o que representou um aumento de 240 por cento face ao ano anterior e, ainda assim, uma descida de 93,9 por cento face ao mesmo período de 2019.

Outra das realidades reveladas pelas estatísticas da Segurança, é falta de correspondência entre inquéritos e acusações pelo crime de violência doméstica. Nos primeiros nove meses de 2023, foram instaurados, com carácter preliminar, 101 inquéritos de violência doméstica, o que corresponde a um aumento de 7 e de 19 casos em comparação com os períodos homólogos do ano transacto e do ano 2019, respectivamente. Porém, após as investigações foram apurados apenas 14 crimes de violência doméstica, que representaram um decréscimo de três casos face a 2022 e 2019.

Sonhos eléctricos

Outro clássico que regressa em força às estatísticas da criminalidade, são as infracções cometidas por taxistas. Nos primeiros nove meses deste ano, a polícia autuou 616 taxistas, mais que triplicando o registo do ano passado (+262,4 por cento), mas ainda assim longe das quase 3.000 infracções verificadas no mesmo período de 2019. Mais uma vez, o Governo explica esta subida com “o aumento do número de turistas”.

Uma das mais alarmantes novidades reveladas ontem por Wong Sio Chak foi relativa à criminalidade cibernética. Nos primeiros três trimestres deste ano, registaram-se em Macau uma média diária de 5.800 ataques cibernéticos, total que representa um aumento face aos 5.500 casos registados no ano passado e um considerável incremento face aos 1.850 casos em 2020.

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