Não pode haver caos em Macau

No discurso de apresentação das Linhas de Acção Governativa para o Ano Financeiro de 2024, Ho Iat Seng, Chefe do Executivo de Macau, salientou que “Não pode haver caos em Macau”. Quando interrogado pelos jornalistas na conferência de imprensa, declarou que é necessário tomar precauções e que os websites do Governo sofrem muitos ataques informáticos diariamente, por isso “os alarmes estão sempre a disparar.”

Houve uma altura em que alguns bancos de Macau tinham balcões onde o cliente se colocava ao lado do funcionário para facilitar a comunicação. Mas como estes balcões estavam mais sujeitos a assaltos, foram substituídos pelos tradicionais. Todos os bancos têm alarmes de emergência, mas não disparam a toda a hora. Desde que exista uma gestão de risco eficaz, reforço da detecção de emergências e vigilância permanente, lida-se bem com as situações de perigo. O constante disparar dos alarmes incomoda toda a gente e pode provocar neuroses.

“Não pode haver caos em Macau” é a linha inultrapassável que o Chefe do Executivo tem de defender vigorosamente, assim como todos os residentes e associações de Macau. Prevenir é sempre melhor do que remediar, por isso é importante identificar as causas que podem provocar o caos. A História serve de espelho. Os acontecimentos turbulentos que tiveram lugar em Macau ao longo dos últimos 60 anos devem servir de referência para prevenir os tumultos e o caos.

Em Dezembro de 1966, um litígio por causa de obras ilegais na Taipa desencadeou um conflito de grande escala entre a administração portuguesa de Macau e os habitantes locais. Documentos de órgãos governamentais de Macau foram espalhados pelas ruas, uma estátua de bronze foi derrubada e alguns habitantes morreram durante o conflito. Nem mesmo o consulado britânico foi poupado. Nessa altura, podia dizer-se que Macau estava “caótico”. O conflito não foi resolvido pela força, mas sim mediado por Ho Yin (importante líder da comunidade chinesa de Macau) juntamente com outras pessoas sensatas oriundas da China e de Portugal. Macau acabou por recuperar da turbulência do conflito ao fim de poucos anos.

Em 1974, deu-se a Revolução dos Cravos em Portugal, e em 1975, Portugal anunciou a sua retirada de todas as colónias. Nesse período, a China e Portugal ainda não tinham estabelecido relações diplomáticas. Como é que iria funcionar a descolonização de Macau? Se esta questão não tivesse sido bem resolvida, Macau teria mergulhado no caos social. Frequentemente, os problemas políticos requerem governantes com sabedoria política para se resolverem. A ausência de relações diplomáticas entre a China e Portugal não significou a ausência de negociações. O “Estatuto Orgânico de Macau” e a “Constituição da República Portuguesa” foram promulgados em Macau em 1976 para facilitar as disposições que levaram Macau a tornar-se uma “região especial”. Com o estabelecimento de relações diplomáticas entre a China e Portugal em 1979, todos estes problemas se tornaram coisa do passado. Uma crise potencial foi resolvida de forma invisível.

​As convulsões que ocorreram em Pequim na viragem da Primavera para o Verão de 1989 levaram a que as associações de Macau e os cidadãos fizessem manifestações constantes. Estas convulsões só terminaram a 9 de Junho de 1989. Neste período agitado, algumas pessoas sugeriram que os residentes que tivessem depositado dinheiro em bancos chineses o deveriam levantar em sinal de protesto, e se isso tivesse acontecido poderia ter ocorrido a qualquer momento uma crise financeira. Ng Kuok Cheong, que na altura era funcionário de um banco chinês de Macau e também um manifestante activo, analisou a situação racionalmente, instou o público a não provocar uma corrida aos bancos e conseguiu evitar que as pessoas agissem intempestivamente. Ng ajudou a evitar uma crise financeira.

O “Incidente de 29 de Março” em 1990, a “Manifestação do Primeiro de Maio” e a “Manifestação do Dia da Transferência de Soberania de Macau” em 2007 não tiveram um impacto devastador em Macau. Além disso, quando a administração portuguesa de Macau começou a fazer o registo dos residentes ilegais, resolveu um dos maiores problemas. Nessa época, o Governo da RAEM respondeu aos manifestantes com a realização de múltiplos concertos e actuações, para oferecer ao público uma variedade de escolhas, tendo ainda implementando o Plano de Comparticipação Pecuniária no Desenvolvimento Económico, que dura até aos dias de hoje. O Plano amenizou vários conflitos porque permitiu devolver às pessoas o que outrora lhes tinha sido tirado. Relativamente ao movimento que se opôs à Proposta de Lei intitulada “Regime de Garantia dos Titulares do Cargo de Chefe do Executivo e dos Principais Cargos a Aguardar Posse, em Efectividade e Após Cessação de Funções” em 2014, Chui Sai On, o então Chefe do Executivo, agiu de forma decisiva e corajosa, e anunciou a retirada da Proposta de Lei, evitando assim uma crise que teria provocado conflitos e o caos.

Existe um ditado chinês que reza o seguinte: o governante é como um barco e o povo como a água. A água pode transportar o barco, mas também o pode afundar. Na verdade, quem decide se o barco flutua ou afunda é o comandante. Por isso, não podemos culpar o iceberg pelo afundamento do Titanic!

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