O poder não deve ser arbitrário

Na entrega do “Relatório de Acção Governativa de 2015”, o então primeiro-ministro chinês Li Keqiang disse no seu discurso que “o poder não é para ser usado arbitrariamente”, pelo que foi calorosamente aplaudido pelos representantes presentes e, mais tarde, a frase veio a tornar-se viral na Internet. Actualmente, Li Keqiang está retirado e deu início a uma nova fase da sua vida. No entanto, a sua advertência de que “o poder não é para ser usado arbitrariamente” parece não ter alertado algumas pessoas que exercem o poder, por isso, as irregularidades continuam a acontecer.

Desde a eleição da 7.ª Assembleia Legislativa em 2021, o Plenário passou a ter uma configuração política hegemónica e as vozes discordantes praticamente desapareceram. A Assembleia Legislativa e o Governo da RAEM estabeleceram relações de cooperação mais próximas e o Governo e os seus representantes dispõem de maior liberdade e de mais oportunidades para capitalizar essa abertura. Mas como a Assembleia Legislativa tem muita margem para melhorar a sua supervisão do desempenho do Governo, é provável que os departamentos competentes ignorem a realidade e as opiniões da população quando tomam decisões.

Por exemplo, a Direcção dos Serviços para os Assuntos de Tráfego (DSAT) decidiu o encerramento permanente de um troço da Avenida Dr. Francisco Vieira Machado – junto do edifício habitacional Bai Yun Garden e que dá acesso à Avenida 1 de Maio e à Avenida da Amizade. Mas esse troço foi reaberto 14 horas após o seu encerramento, porque estava a provocar congestionamento do trânsito. Este caso ilustra perfeitamente o conceito de “o poder não é para ser usado arbitrariamente”. Na ausência de uma supervisão pública forte, a DSAT deve pensar cuidadosamente antes de tomar decisões, porque mesmo havendo um comité de aconselhamento, os seus membros só emitem opiniões favoráveis às decisões administrativas do Governo da RAEM.

As árvores da Baía Norte do Fai Chi Kei foram cortadas por causa da construção da Estação Elevatória de Águas Pluviais. Não sei se o Conselho Consultivo de Serviços Comunitários da Zona Norte teve conhecimento antecipado do abate das árvores, mas os moradores da Zona Norte é que não foram certamente informados. Os funcionários públicos que trabalham em salas com ar condicionado provavelmente não sentem o calor insuportável que sufoca quem anda na rua ou quem está na paragem à espera do autocarro à torreira do Sol. Se o abate das árvores era considerado necessário para a construção da Estação Elevatória de Águas Pluviais, o que dizer das intensas obras de escavação rodoviária realizadas ao mesmo tempo na zona sul do Porto Interior, que dificultaram a circulação do trânsito? Qual é a explicação do departamento governamental responsável pelo agendamento das obras de escavação? Porque é que não existe um mecanismo adequado para a coordenação das várias obras rodoviárias? Como é que se faz o planeamento destas obras? Com o poder vem a responsabilidade e nada pode ser feito de forma arbitrária.

Olhando para as chamadas “mudanças que acontecem uma vez em cada século” a nível mundial, sabemos que muitas delas são causadas pelos caprichos de quem detém o poder. O Presidente russo Vladimir Putin desfruta de poder autoritário a nível doméstico e de uma reputação sem precedentes. Mas a operação militar especial da Rússia contra a Ucrânia arrasta-se há mais de um ano. Embora muitos estados (nos quais se incluem a China e o Vaticano) continuem a tentar promover as conversações de paz, os seus esforços têm sido em vão. Ultimamente, o Grupo Wagner, um grupo de mercenários, organizou uma rebelião contra a Rússia, algo que Putin nunca imaginou ser possível!

Na altura em que o primeiro-Ministro Li Keqiang deixou o aviso de que “o poder não é para ser usado arbitrariamente”, Guo Tianyong, um professor da Faculdade de Finanças da Universidade Central de Economia e Finanças, disse numa entrevista: “O poder é propriedade pública e é concedido pelo povo. Deve ser exercido sob rigorosa supervisão, com restrições e sem a menor arbitrariedade”.

Aqueles que detêm o poder não podem agir com “arbitrariedade”, o que é uma advertência para todos, especialmente para os próprios.

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