Comunidade portuguesa | Integração na sociedade alterou-se face a 2013

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No estudo “Os portugueses (ainda) em Macau: uma comunidade em reconstrução”, a académica Inês Branco conclui que a comunidade portuguesa tem hoje maiores dificuldades de integração na sociedade de Macau do que há oito anos. Hoje os portugueses que vivem no território sentem-se mais “imigrantes” e não de Macau

 

A comunidade portuguesa de Macau tem hoje maiores dificuldades de integração na sociedade em relação a 2013. A conclusão é de um estudo de Inês Branco, académica da Faculdade de Letras da Universidade de Coimbra (UC), intitulado “Os portugueses (ainda) em Macau: uma comunidade em reconstrução”, e que foi recentemente publicado na Revista Portuguesa de Estudos Asiáticos, uma edição do Instituto do Oriente do Instituto Superior de Ciências Sociais e Políticas da Universidade de Lisboa.

Este trabalho nasce de uma tese de doutoramento já defendida por Inês Branco que resolveu entrevistar novamente oito pessoas, partindo de testemunhos já recolhidos em 2013. “Procurámos fazer o auto-retrato da comunidade portuguesa, saber o que mudou desde 2013 e qual o lugar da língua portuguesa e das outras línguas de acolhimento no seio da comunidade macaense”, pode ler-se.

Desta forma, a autora do estudo conclui que “não só a ligação à sociedade como um todo tem sido abalada, como a manutenção da ligação a Portugal também”. “Isso faz com que o grau de integração e, mais do que isso, o sentimento de se sentirem integrados tenha diminuído nos últimos oito anos”, acrescenta o estudo.

Também a forma como os entrevistados se vêem mudou “devido às alterações na conjuntura”, uma vez que “mais do que nunca dizem sentir-se ‘imigrantes’ quando, em 2013, os mesmos se diziam ‘pessoas de Macau’”. Para a autora, esse paradigma “tem um reflexo directo no grau de integração”. “Em 2013 as alterações à conjuntura passavam ainda pelo handover, em 1999, e pela crise económica em Portugal. Agora juntam-se a pandemia e os acontecimentos de Hong Kong no que respeita à sociedade de acolhimento”, explicou.

Mantém-se, contudo, o perfil de uma comunidade que está de passagem. “Além das grandes alterações nas infra-estruturas, como o metro de superfície, o novo campus universitário da Universidade de Macau, a nova prisão, um hospital em perspectiva, novos aterros e a construção da ponte Hong Kong-Zhuhai-Macau, os entrevistados referem-se a Macau como ‘casa’ (mesmo os que já saíram, mas que tinham vivido na região por muitos anos) e, tal como em 2013, agora continuam a falar num regresso a Portugal, mas sempre sem um horizonte temporal definido.”

Assim, “se, em 2013, as desilusões com Macau estavam sobretudo relacionadas com o potencial subaproveitado da região, nomeadamente em termos do ambiente e do exemplo que Macau poderia ser na academia, na cultura e na medicina, em 2021, mais do que a desilusão, existe o medo relativamente às restrições da liberdade, incluindo a de expressão”.

Questão de línguas

Outro paradigma que se verifica é o facto de os membros da comunidade portuguesa não apostarem na aprendizagem do chinês. “No dia a dia os entrevistados usam o português e o inglês. Tal como em 2013, as tentativas para aprender cantonês ou mandarim foram rapidamente superadas pelo desinteresse em investir tempo numa empreitada difícil, demorada e, sobretudo, para a qual não têm motivação. O horizonte temporal com que estes imigrantes estão em Macau, mais uma vez, revela-se desmotivador. Pensam que a estadia será curta, que mais dia menos dia voltarão a Portugal ou que sairão para outro país. Muitas vezes passam-se dezenas de anos e tal não acontece. Como resultado, fica o arrependimento por não terem aprendido”, aponta o estudo.

O mandarim é, hoje, “uma língua em expansão”, enquanto o cantonês, “sendo a língua materna da maioria da população, é a mais usada, mas sendo substituída gradualmente pelo mandarim, e o português é uma língua de valor económico e identitário”.

A autora conclui que “a língua portuguesa continua a estar associada à manutenção da identidade de Macau, ao desenvolvimento económico da região, nomeadamente ao turismo cultural, e ao desenvolvimento das relações comerciais entre Macau e os países lusófonos, em especial com Angola”.

O estudo conclui ainda que “embora a língua inglesa continue a ser mais utilizada nas relações sociais entre pessoas de comunidades diferentes, o que é facilmente explicado com o facto de estes imigrantes continuarem a não aprender as línguas chinesas, verifica-se cada vez mais o uso do mandarim nas relações profissionais”.

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