淮阳 Huaiyang celebra Fu Xi

Visitar a província de Henan, situada na parte média do Rio Amarelo, é como entrar nas primeiras páginas do longo livro da História da China por ser um dos berços da civilização chinesa e onde se registam do período Neolítico muitas culturas como, a Peiligang (6100-5000 a.n.E.), a Yangshao (5000-3000 a.n.E.), a Longshan (2500-2000 a.n.E.) e a Erlitou (c.1900-1500 a.n.E.), esta ligada à dinastia Xia (2070-1600 a.n.E.), a primeira das dinastias imperiais que duraram até 1911. Já a Cultura de Erligang (1600-1400 a.n.E.) está relacionada com o início da dinastia Shang (1600-1046 a.n.E.).

Chegamos a Zhengzhou, capital da província de Henan, para a 230 km ir a Huaiyang, na prefeitura de Zhoukou, assistir às festividades em honra de Fu Xi, que se estendem entre o segundo dia do segundo mês lunar até ao terceiro dia do terceiro mês. Ana Maria Amaro lembra-nos, “no segundo dia do segundo mês do calendário lunar chinês celebra-se a tradicional festa conhecida por ‘O Dragão levanta a cabeça’ que anuncia as primeiras chuvas da Primavera.” O dragão é considerado a divindade que domina a chuva e para um povo de agricultores como eram os chineses, esta era-lhes essencial para os campos.

Ainda nessa prefeitura, no concelho de Luyi celebra-se na mesma altura o aniversário de Lao Zi, enquanto Xihua, ligado a Nu Wa e onde tem o mausoléu, é outro dos oito concelhos da prefeitura de Zhoukou localizada no Sudeste da província.

Da cidade de Zhoukou partimos para Huaiyang numa viagem de 45 minutos de autocarro. Chamada Wanqiu no tempo de Fu Xi, ficou em 200 a.n.E. a ser Huaiyang por se encontrar a Norte do Rio Huai e daí o nome, pois yang designa Norte. Local onde Fu Xi e Nu Wa escolheram fazer as suas capitais, tal como também aí, já com o nome Chen, viveu Yan Di, estando assim relacionada com os Três Ancestrais Soberanos (San Huang) e mesmo considerando Nu Wa não ser um dos três, mas sim Sui Ren, o deus do Fogo, este era de Shangqiu, na fronteira para Nordeste da prefeitura de Zhoukou.

A FEIRA

Em Huaiyang (淮阳), após sair do autocarro, ao caminhar o quilómetro e meio até ao Templo de Fu Xi temos a sensação de pertencer ao imenso grupo proveniente da tribo Feng (风, Vento), que há 4800 anos viera da província de Gansu para Leste chefiada por Fu Xi. Percorreu desde a bacia do Rio Wei até ao Rio Amarelo onde encontrou terras férteis na Planície Central, na actual província de Henan e aí se instalou.

Criou a povoação amuralhada de Wanqiu para albergar o grupo, que então passou a designar-se tribo Yi e escolheu como totem o Dragão. Após a realização de festas onde se promoveram casamentos, parte da tribo separou-se e Nu Wa com as suas gentes seguiu para Norte dessa área, estabelecendo-se em Xihua.

Chegando pelo lado Oeste contornamos o Lago Dragão (Long hu), que separa o templo de Fu Xi da vila de Huaiyang, encontrando-se no meio da água uma escultura com dois dragões semi-submersos. A moldura humana caminha e avolumando-se dá lugar a uma multidão, ladeada por um sem número de vendedores. Dois pormenores logo rapidamente saltam à vista. Um grande número de pessoas em sentido inverso vem da festa trazendo bolas de basquete e outras, tigres feitos de tecido laranja com a face pintada, que pela forma parecem ser comprados para servir de almofadas.

A confusão é grande e as tendas de circo, instaladas num recinto descampado ao lado do muro do complexo do templo, animam com os altifalantes o som geral do local, anunciando animais ferozes, famosos artistas malabaristas e tudo o que pudesse causar espanto e estupefacção aos habitantes da região aí apinhados. Por detrás dos muros do complexo do templo pode-se ver um monte e os telhados de alguns dos pavilhões que constituem o Tai Hao ling (太昊陵), Templo-mausoléu de Tai Hao, a divindade de Fu Xi.

Na porta lateral Oeste (Xi Hua men) o rebuliço é ainda maior, pois muita gente tenta por aí entrar no templo, não deixando sair os que acabam de o visitar.

Prosseguimos em direcção à porta Sul, a principal do templo e por onde se deve entrar, entre tendas com esculturas de deuses e imagens de muitos dos soberanos mitológicos à venda, havendo ainda as bancas com geomantes entendidos no Feng-Shui e no Yi Jing.

CÃO DE ARGILA DE HUAIYANG

Da grande praça em frente ao templo, o nosso olhar é atraído pela água do lago e expande-se até aos edifícios da vila de Huaiyang, na margem oposta. O que parece uma ampla praça está interrompida por um canal, não perceptível devido às inúmeras tendas colocadas em frente. É o Rio Cai, cujo significado antigo era o de tartaruga. Segundo os registos do livro Chenzhou Fu Zhi, foi no Rio Cai que Fu Xi encontrou a tartaruga branca a trazer-lhe a base para criar os oito trigramas. Este rio nasce a Noroeste de Huaiyang, atravessa Wanqiu, a cidade construída por Tai Hao, que foi a primeira capital da China, e passa em frente do templo mausoléu.

Como viemos pelo lado Oeste, para o atravessar escolhemos a ponte mais próxima das três existentes e assim, entramos no recinto limitado entre o Rio Cai e o Lago Dragão (Long hu). Aí, a imensa feira, que para além do lado comercial tem uma parte de diversão, estende-se desde o lago até à entrada do templo.

Nas tendas vendem-se os papéis votivos e incenso, assim como estátuas de porcelana de muitos deuses, sobretudo os da Riqueza, contando com uma variedade de outros produtos típicos apresentados nas normais feiras de pendor rural. As pessoas ao passarem pelos carrinhos cheios de lingjiao, fruta com sabor a castanha e forma em miniatura de pares de cornos de búfalo, esperam a vez para a adquirir.

Encontramos então os famosos tigres (ou serão cães?) em vários tamanhos e feitos de tecido cor de laranja com pinturas a dar as feições e outros pormenores, parecem ser uma novidade. Produção actualizada, mais ao gosto dos compradores, inspirada nas pequenas esculturas antigas de barro pintado com fundo preto, ornamentadas por cores vivas a criar as feições das formas primitivas de seres humanos e pássaros. Servem como instrumento musical pois ao soprar-se por um buraco dão um assobio.

Assim, os locais camponeses artesãos entre a multidão chamam a atenção, pois vão com elas na boca usando-as como apitos, enquanto transportam cestas de vime cheias dessas pequenas esculturas para vender. São os ‘Cães do Mausoléu’, que por terem formas amórficas muito diversas, revelam ser provenientes de uma figuração muito antiga. Também conhecidos por Cão de Argila de Huaiyang, ou Cão Ling, é o nome dado a estas figuras no seu todo, não importando a representação que têm. Está relacionado, segundo o conhecimento popular, com o nome de Fu Xi, em cujo primeiro caractere (伏) existem dois radicais, um de homem (人) e outro de cão (犬). Segundo especulações de alguns estudiosos, a tribo de Fu Xi tinha como totem o cão e após o seu chefe deixar esta vida, os cães tornaram-se as divindades que guardam o mausoléu. Confúcio confirmou passados dois mil anos estar ali enterrado o corpo do inventor dos trigramas.

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