Hamsters infectados com Ómicron

A semana passada, foram detectadas infecções pela variante Ómicron em vários hamsters numa loja de animais em Hong Kong.

Para prevenir a propagação do vírus aos seres humanos, o Governo de Hong Kong pediu aos residentes que entregassem às autoridades todos os hamsters comprados depois de 22 de Dezembro último, para que fossem abatidos de forma humanitária. Alguns residentes cooperaram com o pedido do Governo e entregaram os hamsters, mas alguns defensores da vida animal juntaram-se à porta das instalações para impedir o processo, pedindo que em vez de os entregarem às autoridades os entregassem a eles. Os especialistas de saúde que aconselharam o Governo de Hong Kong a tomar esta decisão receberam emails ameaçadores, acção que o Chefe do Executivo condenou publicamente.

O Governo de Hong Kong tomou a decisão de abater de forma humanitária os hamsters porque estes animais têm a capacidade de transmitir os vírus a outras espécies, nomeadamente ao Homem. Só com esta medida se pode quebrar a cadeia de transmissão do vírus de forma eficaz. Existem precedentes para este tipo de actuação. Em Novembro de 2020, algumas martas que viviam em quintas na Dinamarca foram infectadas por cinco variantes diferentes do novo coronavírus, e o Governo dinamarquês ordenou o abate de 17 milhões destes animais. Em Maio de 2020, algumas martas na Holanda também foram infectadas e contagiaram os trabalhadores das quintas. As autoridades mandaram abater mais de 370.000 animais. Há alguns anos, registou-se gripe das aves em Hong Kong e a doença das vacas loucas no Reino Unido. Ambos os Governos adoptaram o mesmo método para prevenir a propagação aos humanos destas doenças.

Alguns residentes de Hong Kong defenderam que apenas os hamsters infectados deviam ser abatidos e que os que não estavam infectados deveriam ser poupados. Não havendo certeza se o animal está ou não infectado, terá de ser mantido sob observação. Os defensores deste argumento acreditam certamente que os hamsters são seres vivos e que necessitam de cuidados humanos. Mas é impossível através da observação primária perceber se os animais estão doentes. Após este incidente, cerca de 2.000 hamsters precisariam de tratamento. Se fossem postos em quarentena e sob observação médica, teria de se encontrar um local onde fosse possível levar a cabo esta observação. Alimentar todos estes animais seria outro problema. Não sabemos se o Governo de Hong Kong disporia de instalações, de veterinários e trabalhadores suficientes e para garantir a operação. Mas se a solução deste problema fosse adiada, as consequências para a sociedade de Hong Kong poderiam vir a ser desastrosas. Se neste grupo de hamsters, apenas um estivesse infectado, a infecção podia propagar-se aos outros e a partir daí poderia passar para outros animais e também para as pessoas, o que tornaria difícil o controlo da epidemia e provocaria uma sobrecarga no sistema de saúde. Salvar hamsters é salvar vidas, mas depois destas vidas terem sido salvas, surgiriam mais vítimas humanas. Qual será, pois, a melhor decisão?

Abater hamsters de forma humanitária é uma decisão que se destina a salvaguardar o bem-estar público, mas não deixa de ser difícil. Porque é que especialistas que cumprem o seu dever no interesse do púbico têm de estar sujeitos a intimidações? Se por causa destas ameaças os especialistas ficarem relutantes em continuar a desempenhar serviço público e se recusarem a aconselhar o Governo sobre as medidas para combater a pandemia, no final é a sociedade de Hong Kong que será prejudicada. Será isto que os residentes de Hong Kong desejam?

É a primeira vez que se registam infecções em hamsters por este vírus. A epidemia não conhece fronteiras, por isso este incidente em Hong Kong é uma boa referência para Macau, lembrando-nos que os animais podem ser infectados por este vírus. Em Macau existe a Lei No. 7/2020 “Lei para a Prevenção de Epidemias em Animais”. O Artigo 7 estipula que se tiver sido confirmado, ou que exista sinais da ocorrência ou de propagação de epidemias em animais, o Gabinete dos Assuntos Municipais pode tomar medidas conducentes ao fim da propagação. As medidas incluem melhoramento das instalações e dos cuidados prestados, isolamento obrigatório, abate dos animais de forma humanitária, etc. O Artigo 3 estipula que a lista das “doenças animais” seja determinada por indicação do Chefe do Executivo. A prevenção é a melhor forma de tratamento, dada a prevalência de doenças infecciosas, será esta uma altura adequada para Macau considerar que sejam adicionadas outras patologias à lista das “doenças animais” para que se possa combater a propagação dos vírus?

Os hamsters de Hong Kong eram animais domésticos. O Governo, para prevenir a propagação de uma doença infecciosa, pediu à população para entregar os seus hamsters para que fossem abatidos de forma humanitária. A questão das indemnizações não foi mencionada na imprensa. Talvez o Governo de Hong Kong possa considerar esta questão para tranquilizar os residentes que tenham de entregar os seus animais.


Consultor Jurídico da Associação para a Promoção do Jazz em Macau
Professor Associado da Escola Superior de Ciências de Gestão/ Instituto Politécnico de Macau
Blog: http://blog.xuite.net/legalpublications/hkblog
Email: legalpublicationsreaders@yahoo.com.hk 

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