Teatro | “Projecto d’ Homens” estreia hoje na BlackBox do Antigo Tribunal

A companhia d’As Entranhas Macau apresenta hoje e amanhã no Antigo Tribunal a peça “Projecto d’ Homens”. O HM falou com Vera Paz, responsável pela encenação, direcção artística e dramaturgia, sobre os momentos que antecedem as pancadas de Molière, a adaptação de um guião que passou a ser interpretado a três línguas e a desconstrução de estereótipos

A horas do último ensaio geral antes da estreia de “Projecto d’ Homens”, Vera Paz confirmava que tudo estava a postos para a première hoje às 20h30 na BlackBox do Antigo Tribunal. Em vez de nervosismo, a actriz que tomou as rédeas dramatúrgicas da adapção da peça apresentada em Portugal em 2017, prefere falar do sentimento de responsabilidade que, “à medida que os anos passam, fica cada vez maior”.

“Projecto d’ Homens”, que será apresentado também amanhã no mesmo lugar e hora, tem a duração de uma hora ao longo de um acto único sem interrupção, onde três actores se desdobram enquanto protagonistas, actores secundários e figurinos, numa performance que alia a fisicalidade e monólogos e diálogos em português, inglês e cantonês. Angústias, pensamentos, amores e desamores são elementos emocionais que atravessam a narrativa, exorcizando os demónios das crises de meia idade.

Em palco vão estar Jorge Vale, Kelsey Wilhem e Machi Chon. Antes do ensaio geral, a encenadora descreveu ao HM o processo que culmina mais logo em palco. “Gostei muito desta experiência. Eles são muito generosos, não são actores profissionais. Os actores amadores têm a particularidade de se entregarem e amarem, de facto, aquilo que estão a fazer. Para mim, foi uma descoberta com eles, um crescendo de confiança, de segurança de parte a parte e fomos construindo assim”, conta.

Na impossibilidade de trazer a Macau o formato original de “Projecto d’ Homens”, devido a todas as complicações originadas pela covid-19, a peça foi adaptada com grande entrega dos actores. “Os monólogos foram escritos pelos actores e adaptados por mim. Não têm uma componente biográfica, mas realidade e ficção tocam-se”, conta.

A mulher do leme

Desta vez, Vera Paz não estará em palco, assumindo a direcção artística, dramaturgia e encenação. “A minha experiência profissional é principalmente como actriz, mas herdei este projecto do encenador de Portugal. A encenação é totalmente nova e o guião totalmente diferente. Apenas o conceito se mantém (o que é isto de ser homem).”

Seguindo o método criativo d’As Entranhas, a improvisação é preponderante num processo sem guião estruturado à partida, mas composto em colaboração com os actores.

Além disso, sem tradução simultânea e com três línguas em palco, a peça será um reflexo da cidade. “Macau também é esta realidade que todos conhecemos, este lost in translation, mas onde existe uma identidade própria”, descreve a encenadora, confessando que a confluência de línguas foi uma opção assumida.

“Com certeza que haverá algo que irá escapar a quem não domine as três línguas. Mas o espectáculo também tem uma componente plástica e visual bastante forte, muito física. Portanto, acho que isso não será um problema”, explica Vera Paz.

No que diz respeito ao guião, à mensagem, cada personagem chega ao palco da Blackbox com viagens diferentes e respectivas crises com variações diversas de revolta e angústia. No rescaldo do movimento #Metoo e num mundo ainda intensamente dividido e desigual, Vera Paz não considera que “Projecto d’ Homens” seja uma afirmação. “Não acho que seja um manifesto, acho até que é mais um anti-manifesto, que pretende mais levantar questões do que dar respostas”, afirmou.

Durante uma hora, além de angústias e inquietações masculinas, “Projecto d’ Homens” põe em causa clichés, desconstrói estereótipos, por vezes espelhando-os, expondo as entranhas de um tema eterno e sem resolução.

 

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