Grande Plano MancheteTurismo de Macau | Livraria fecha portas em Lisboa. RAEM fora da Feira do Livro Andreia Sofia Silva - 1 Set 20211 Set 2021 O fim da representação do Turismo de Macau em Lisboa levou à ausência na Feira do Livro de Lisboa deste ano. A Delegação Económica e Comercial de Macau não deixa de lado a hipótese de voltar a participar no evento. A livraria fechou portas e, para já, não há planos de reabertura, estando “em análise” a continuação do projecto. Editores receberam cartas para levantar livros no prazo de um ano Os livros que se editam em Macau, ou que versam sobre Macau, deixaram de ter o seu principal ponto de venda em Portugal desde o dia 16 de Junho. Isto, porque o fecho da representação do Turismo de Macau em Lisboa levou ao encerramento da livraria que funcionava nas instalações da Delegação Económica e Comercial de Macau (DECM) em Lisboa, na avenida 5 de Outubro. A decisão do Governo de Macau fez também com que as obras editadas na RAEM não estejam representadas na edição deste ano da Feira do Livro de Lisboa. A DECM não está inscrita na APEL – Associação Portuguesa de Editores e Livreiros, entidade responsável pela organização do evento. Na lista de associados da APEL não consta nenhuma outra entidade ou editora ligada a Macau. Em resposta ao HM, a DECM garante estar “a equacionar a futura participação no evento”, enquanto que a reabertura da livraria parece estar fora da equação, uma vez que os editores foram notificados para levantar as suas obras no prazo de um ano. “Foi dado início ao processo de transferência e liquidação do espólio da livraria da Representação do Turismo de Macau em Lisboa”, assegurou a DECM, sendo que “os livros consignados já se encontram em levantamento”. Este procedimento “tem vindo a desenvolver-se de forma muito positiva”, acrescentou a DECM. O HM fez ainda uma pergunta adicional sobre as razões que levaram ao encerramento da livraria e se há possibilidade de esta vir a abrir portas noutro local, tendo a DECM dito apenas que “está em aberto e em análise a possível continuidade da mesma”. O HM sabe ainda que a presença na Feira do Livro chegou a render receitas na ordem dos 10 mil euros (cerca de 100 mil patacas). Além do conjunto de obras que estava disponível para venda ao público, resta ainda um espólio de 25 mil livros que são propriedade do Governo da RAEM, mas que não estavam disponíveis para venda ao público. Questionada sobre como será feita a promoção das obras de Macau em Portugal, a DECM apenas disse que o Governo da RAEM “continuará a promover os produtos e serviços turísticos e culturais de Macau no exterior, tendo em vista o reforço da imagem de Macau enquanto destino de qualidade”. Sem acerto de contas Rogério Beltrão Coelho foi um dos editores contactado para levantar o que resta em Lisboa das obras editadas pela Livros do Oriente que não foram vendidas. No entanto, este lamenta que o processo não tenha tido uma discussão prévia. “A DECM tem todo o direito de tomar as decisões que julgue mais convenientes, mas este processo foi feito de forma estranha e sem qualquer diálogo prévio com os editores de Macau, que se limitaram a receber uma carta solicitando que os livros fossem levantados. Em circunstância alguma foi colocada a hipótese de uma alternativa em prol da continuidade da livraria.” O editor refere ainda que “não houve acerto de contas”, além de que “não se sabe em que estado estarão os livros”. O transporte e levantamento das obras também irá obrigar a uma “despesa inesperada, avultada e sem qualquer compensação”, lamentou. No caso da Livros do Oriente, há mais de mil obras por levantar, o que implica “contratar uma empresa para o efeito e transportá-los para fora de Lisboa para o armazém” da própria editora. Uma livraria diferente Na visão de Rogério Beltrão Coelho, a livraria que funcionava nas instalações da DECM nunca funcionou na perfeição, pois cada cliente ou visitante tinha de se apresentar primeiro a um recepcionista. “Verificaram-se sempre vários factores que impediram que exercesse a sua função como qualquer outra livraria. A grande fragilidade foi a falta de promoção das edições de Macau.” No entanto, o editor destaca o facto de a livraria ter tido “o mérito de encaminhar para ela qualquer leitor de Portugal que contactasse as editoras interessado nos seus livros”. Além disso, “muitas vezes era a única oportunidade para dar a conhecer os livros de Macau e servir de ponto de encontro para quem, estando em Portugal, vive ou passou por Macau”. Tendo sido “o único posto de venda organizado dos livros de Macau em Portugal”, é agora difícil integrar estas edições em outras livrarias. “A intensa actividade editorial em Portugal, mesmo com pandemia, não permite às livrarias do país ter disponíveis todos os títulos editados, optando [estas] pelos mais comercializáveis, designadamente os dos autores mais conhecidos. Portanto, não dá para encaixar os livros de Macau neste circuito comercial”, frisou. Que solução? Na opinião do editor da Livros do Oriente, “Macau precisará sempre de uma livraria em Lisboa, no Porto ou em Coimbra”, mas num espaço que seja “de fácil e atraente acesso”, e onde o leitor possa encontrar “os livros que quer”. Beltrão Coelho diz ainda que a aposta deveria passar também por um serviço de vendas online e por “muitas acções de promoção”. Só assim, e também com a presença na Feira do Livro de Lisboa, “se conseguirá manter e divulgar a presença lusófona de Macau e as edições chinesas produzidas” no território, apontou. João Botas, jornalista e um dos autores de obras sobre a história de Macau, diz ter ficado surpreendido com o encerramento da representação dos Serviços de Turismo de Macau em Lisboa e, por consequência, da livraria. “Respeito a decisão, mas não posso concordar [com ela], tendo em conta o elo especial que Portugal sempre teve e terá com Macau”, começou por dizer. Com livros publicados com a chancela do Instituto Cultural e do Instituto Internacional de Macau, incluindo edições de autor, João Botas destaca o facto de, para alguém que escreve livros, ser sempre difícil o encerramento de uma livraria, tendo em conta “a especificidade” do mercado editorial de Macau. João Botas frisou também “as múltiplas manifestações culturais sobre Macau que esta delegação fez ao longo das últimas décadas e que muito serviram para levar mais longe, de forma honrosa, o nome de Macau”. Alterações espaciais Numa entrevista concedida ao HM em Maio do ano passado, Paula Machado, então coordenadora da representação do Turismo de Macau em Lisboa, disse ter novos planos para dinamizar a livraria. “Acaba por ser um importante complemento às nossas actividades promocionais, pois participamos na Feira do Livro de Lisboa e na Festa do Livro de Belém. Nestas feiras acabamos por vender mais livros do que em nos outros meses do ano. Ainda assim, penso que ainda há muito a fazer para atrair mais pessoas às nossas instalações”, defendeu. Muito recentemente a livraria foi alvo de uma reestruturação, pedida por Paula Machado, tendo sido realizado um novo inventário, que implicou “a implementação de um novo sistema informático e o abate de livros antigos e desactualizados”. Além disso, “foram feitas obras no armazém para podermos organizar os livros por ordem alfabética e por autor”. Na mesma entrevista, Paula Machado revelava a vontade de criar “um novo sistema de gestão das consignações em conformidade com o que se faz nas outras livrarias em Portugal”, bem como um site reestruturado para a venda de obras. Paula Machado não quis prestar novas declarações sobre o encerramento da livraria, por não se encontrar em funções. O presidente da Casa de Macau em Portugal, Rodolfo Faustino, também se recusou a prestar comentários sobre o encerramento deste espaço. O HM tentou ainda chegar à fala com outras entidades ligadas a Macau, no sentido de perceber se uma nova livraria poderá abrir portas, mas até ao fecho desta edição não foram obtidas respostas.