Das Molucas a Espanha

Conduzidas por um junco chinês desde a ilha de Mindanao, as duas naus espanholas já nas Molucas ao passar por Mean e Zoar avistaram as montanhas vulcânicas nas ilhas de Ternate e Tidore. Chegaram a 8 de Novembro de 1521 a Tidore e no dia seguinte visitaram o sultão Almanzor a bordo do seu grande barangai, que muito bem os acolheu.

Como resultado, encheu-lhes as naus de cravinho a troco de bugigangas e indígenas capturados por corso, entre os quais três mulheres a pedido do sultão.

Os portugueses desde 1512 ligavam a Europa às Molucas pela rota oriental e agora, em 1521, eram as ilhas das Especiarias alcançadas desde Espanha pelo caminho ocidental, ficando assim o mundo englobado num todo.
Gómez de Espinosa ia como capitão da armada e da nau Trinidad e a Victoria era comandada por Sebastián de Elcano. Em Ternate visitaram a viúva e os filhos de Francisco Serrão e aí souberam terem os portugueses enviado António de Brito para aprisionar as naus de Magalhães, se estas chegassem às Molucas. Assim, para haver sucesso na viagem e pelo menos um chegar a Espanha, os dois capitães combinaram a Victoria seguir para Oeste, pelo mar português a dobrar o Cabo da Boa Esperança e a Trinidad retornaria por águas espanholas, como fora planeada a inicial viagem.

Com as naus bem carregadas de especiarias, a 18 de Dezembro de 1521 saiu do porto de Tidore primeiro a Victoria e como a Trinidad de repente estalou, começando logo a meter água, foi abortada a partida. A Victória aproveitou reforçar a calafetagem, mas a Trinidad teria de permanecer longo tempo a reparar e por isso, decidiu o capitão-mor Espinosa dar aval à partida de Elcano, o que ocorreu com vento favorável a 21 de Dezembro.

Espinosa, ficando com os cerca de cinquenta tripulantes em terra acolhidos com agrado por o sultão Almanzor, aproveitou para estabelecer contactos com outras ilhas vizinhas, onde em Gilolo, a troco de ajuda militar para aí controlar uma revolta, rapidamente solucionada pela precisão dos tiros de artilharia feitos por Pedro de Bruxelas, o soberano tornou-se também súbdito do Imperador Carlos V.

As especiarias eram trazidas em abundância e Almanzor disponibilizou-lhes homens para ajudar no reparo da Trinidad e na construção de um armazém para guardar a mercadoria. Concebendo-o para feitoria espanhola, Espinosa preparou-a, colocando-lhe torres de vigia e em frente, peças de artilharia provenientes da Concepción. A 14 de Fevereiro de 1522 em Tidore morria João Lopes de Carvalho.

Naquele paraíso, com uma população afectuosa passaram sem preocupações deliciosos tempos a recuperar das tormentas da já realizada meia viagem e a prepararem-se animicamente para o restante percurso, vivendo aí sem o medo de uma emboscada por parte dos locais. Como referido: .

Tentativa falhada

Após cinco meses, deixando uma pequena guarnição a tomar conta da feitoria de Tidore e ajudar militarmente os súbditos sultões das Molucas, a 16 de Abril de 1522 partia enfim a Trinidad para Leste. Estava então a nau Victória já em frente ao Cabo da Boa Esperança.

O capitão Espinosa, para a navegação da Trinidad tinha o mestre genovês Juan Bautista de Punzorol e o piloto León Pancaldo, que se tornou o cronista da viagem desta nau. Fizeram aguada durante uma semana em Halmahera, a maior ilha das Molucas também na dependência de Almanzor, e depois, rumando a Nordeste perceberam ter perdido o vento favorável para os levar ao continente americano, pois soprava agora para Oeste, sentido contrário ao que precisavam. Tal levou a mudar-se o rumo para Norte e sem o saber, estavam novamente na ilha dos Ladrões (Marianas). Avançaram ainda mais para Norte na procura de ventos favoráveis e a 43º Norte foram apanhados durante doze dias por um tufão, que destruiu todo o velame da nau.

Em Julho ainda pouco tinham avançado para Leste do Pacífico e já a fome, o frio e os enfermos apelavam ao retorno a Tidore, pois teriam o vento de feição. “Entre Setembro e Outubro morriam 25 tripulantes e entre eles estava o médico Juan de Morales”, segundo Núñez de la Fuente, de onde provem a maior parte das informações deste artigo. Sete meses a lutar contra condições adversas e já sem metade da tripulação encontravam-se a trinta léguas de Tidore, onde souberam por um barco de Gilolo que uma expedição portuguesa vinda de Ternate prendera a guarnição espanhola da feitoria de Tidore e roubara todo o cravinho.

Desesperado, sem meios para levar a nau para Tidore, Espinosa por carta pedia aos portugueses que os viessem salvar e por isso, António de Brito enviou primeiro uma embarcação a remos (caracoras) e depois a caravela São José para recolher a tripulação da Trinidad e aprisionar a sua preciosa carga, exigindo a rendição de Espinosa. Na nau a situação era de total calamidade, pois inanimada pela doença a tripulação moribunda não se conseguia levantar, metendo medo aos portugueses, quando ao pretender nela entrar se lhes deparou tal cenário, crendo-a empestada.

Confiscaram tudo o que encontraram na capitã nau, toda a documentação e registos da viagem, tal como o diário de Fernão de Magalhães ficou na posse dos portugueses. Levada para Ternate, a nau desfez-se contra as rochas no dito porto e a tripulação, que já nela não vinha, presa foi usada para construir o forte dos portugueses em Ternate, juntando-se aos três espanhóis capturados na feitoria de Tidore, pois um quarto conseguira fugir. Em finais de Fevereiro de 1523 foram transferidos para uma ilha de Banda, daí para Sunda e por fim levados para Malaca, seguindo depois para Goa, onde ficaram presos por ordem do Vice-Rei Vasco da Gama. Chegavam cinco a Lisboa a 24 de Julho de 1526, entre os quais Espinosa, onde permaneceram sete meses no cárcere, sendo libertados a pedido do Imperador Carlos V ao Rei de Portugal D. João III; D. Manuel morrera em Lisboa a 13 de Dezembro de 1521.

De Alguazil a Capitão

O espanhol Gonzalo Gómez de Espinosa (1474-1540?) partira de Sevilha na armada de Fernão de Magalhães como responsável da justiça (alguazil) e a ele se deveu o volte face da revolta dos capitães castelhanos na baía de San Julián a 2 de Abril de 1520, quando foi à nau Victoria para que o capitão Luís de Mendonza se rendesse e por este ter reagido mal o matou. Tal ocorreu ainda a armada navegava no Atlântico e durante a travessia do Pacífico, até à morte de Magalhães, foi de todos os tripulantes quem mais apoiou o capitão-general, provando-lhe sempre a sua grande dedicação. A ele muito se deve a viagem ter alcançado o objectivo, apesar da sua participação directa e já como capitão da armada ter-se ficado pelas Molucas. Resgatado aos portugueses, Carlos V numa Audiência em 1528 fez-lhe muitas mercês.

Solicitando à Casa de Contratación de las Indias o vencimento acordado no início da viagem em Sevilha de 800 maravedis por mês, os oficiais nas contas descontaram-lhe do salário os meses em que estivera preso dos portugueses.

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