RAEM, 20 anos | Os grandes desafios para o novo Governo de Macau

[dropcap]M[/dropcap]acau inicia 2020 com um novo Governo que terá de estancar as perdas no jogo, a recessão económica e dotar efectivamente o território para a aventura da Grande Baía. Com o ano a acabar e depois de dois anos consecutivos de subida das receitas em mais de uma décima, as previsões apontam que a capital mundial do jogo, e único local na China onde os casinos são permitidos, registe perdas a rondar os 2,5%.
A diminuição do crescimento chinês, a guerra comercial travada entre China e Estados Unidos e a diminuição do investimento justificada pela incerteza do fim das licenças de jogo em 2022 contribuíram para que Macau registasse uma contração nos três primeiros trimestres do ano, entrando assim em recessão técnica.
A este quadro junta-se a recessão económica sentida no vizinho Hong Kong, um dos principais centros financeiros mundiais, provocados por mais de seis meses de protestos pró-democracia que desafiam diariamente Pequim e o Governo local.
É este o cenário que dá as boas-vindas ao novo executivo liderado por Ho Iat Seng, que toma possa no dia 20 de dezembro, o mesmo dia das celebrações dos 20 anos da passagem da administração do território de Portugal para a China.
Apesar destes números pouco animadores, Ho Iat Seng não vai receber ‘um presente envenenado’ do seu antecessor que esteve dez anos à frente do executivo, Chui Sai On: Macau tem significativas reservas orçamentais (suficientes para sustentar cerca de sete anos de despesa pública), uma taxa de desemprego de cerca de 1,8%, um PIB per capita de mais de 82.000 dólares (73.940 euros) em 2018, uma sociedade apolítica e genericamente satisfeita com estabilidade social, económica e segurança pública e, por isso, com um risco reduzido de ser contagiada com o ‘vírus pró-democracia’ da vizinha Hong Kong.

Licenças para jogar

Em relação ao jogo, a única indústria que faz mover a economia do território, Ho Iat Seng já se comprometeu a rever a legislação e a definir o número de licenças de concessão pós-2022, data em que terminam as actuais licenças (seis operadores exploram o jogo em Macau, três concessionárias e três subconcessionárias, metade chinesas e outra metade com maioria de capital norte-americano).

A obrigação de diversificar

Enquanto a indefinição sobre o futuro da indústria do jogo permanecer, a diversificação económica, um dos chavões dos anos recentes que na prática não saiu do papel, será uma figura importante na política do novo Governo.
O objectivo passa pela diversificação da estrutura industrial, apoiar as pequenas e médias empresas, melhorar a qualidade dos recursos humanos, fomentar indústrias de alta tecnologia e incentivar o regresso de talentos a Macau e reforçar a aposta do território como plataforma entre a China e os países de língua portuguesa.
Para esta função, Ho nomeou um novo titular da pasta para a Economia e Finanças, Lei Wai Nong.
Apesar de um dos objetivos passar por melhorar os indicadores das atividades não associadas ao jogo, Ho Iat Seng já assumiu a primazia aos ‘resorts’ integrados do território – apostando em gastronomia, entretenimento, festivais, conferências e exposições, de forma a tornar Macau num destino turístico mais alargado.
Uma tarefa que se avizinha difícil, já que o jogo representou em 2018 mais de 90% das receitas das concessionárias (37,44 mil milhões de euros) que controlam os ‘resorts’ integrados do território.

Baía da sorte

Para 2020, a Grande Baía deverá também ser uma das grandes apostas do elenco governativo para tomar as rédeas da diversificação económica. “Espero e acredito que o Executivo se unirá para liderar Macau e todos os sectores da sociedade a aproveitar as oportunidades trazidas pela construção da Grande Baía, visando acelerar o desenvolvimento diversificado de Macau”, afirmou o futuro líder do executivo, em Setembro, à saída de Pequim, depois ter sido nomeado chefe do executivo da Região Administrativa Especial de Macau pelo primeiro-ministro chinês, Li Keqiang.
O projecto da Grande Baía, apresentado oficialmente nos primeiros meses de 2019, pretende criar uma metrópole mundial que integra Hong Kong, Macau e nove cidades da província de Guangdong, numa região com cerca de 70 milhões de habitantes e com um Produto Interno Bruto (PIB) que ronda 1,2 biliões de euros, semelhante ao PIB de Austrália, Indonésia ou México, países que integram o G20.
Em paralelo, a tónica do discurso do próximo líder do executivo tem-se centrado no combate à corrupção, “na edificação de um Governo transparente” e ainda na reforma da Administração Pública através da racionalização de quadros e da simplificação administrativa, reformas essas que deverão ser iniciadas a partir de abril de 2020, data do período espectável para que seja aprovado o Orçamento retificativo.

Segurança para que te quero

Por fim, o reforço da segurança, numa das cidades mais seguras do mundo, vai ter também um papel importante no novo Executivo, que mantém Wong Sio Chak como secretário para a Segurança.
Analistas apontam que Macau tem mostrado sinais de querer continuar a ser ‘o bom aluno’ do princípio “Um País, Dois Sistemas” e Ho Iat Seng já afirmou que não haverá qualquer desvio nas “linhas vermelhas” definidas por Pequim: desrespeito pela soberania nacional e pelos símbolos do país, pelo desafio à autoridade do Governo central e à lei fundamental do território.
As recentes proibições de entrada no território a políticos ligados ao movimento democrático em Hong Kong, a jornalistas e líderes da Câmara Americana de Comércio (Am Cham) de Hong Kong, a proibição de manifestações contra a brutalidade policial no território vizinho e a detenção de dois jovens que colavam cartazes de apoio aos protestos na ex-colónia britânica comprovam isso mesmo.
Para já, a partir do primeiro trimestre de 2020, mais 800 câmaras de videovigilância vão ser instaladas e será iniciado um teste com câmaras de videovigilância com reconhecimento facial.

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