Hong Kong | Vistos ‘gold’ de Portugal são plano de contingência face a crise política na região

[dropcap]A[/dropcap] crescente fuga de capitais de Hong Kong, como plano de contingência dos residentes locais face à crise política na região semiautónoma, tem beneficiado o regime dos vistos ‘gold’ em Portugal, revelam profissionais do setor.

“Os clientes oriundos de Hong Kong deixaram de ser exceção e passaram a ser a regra no nosso escritório”, conta à agência Lusa um advogado da sociedade Caiado Guerreiro, Rosendo Guimarães da Costa, radicado há cinco anos em Pequim.

“Antes, os clientes de Hong Kong correspondiam a menos de 5% do total da procura na China, mas desde há três meses passaram a constituir cerca de 80%”, detalha.

O advogado nota que a “concorrência também tem tido bastantes clientes de Hong Kong” e que recentemente se passaram a realizar mais eventos no território para atração de investimento, não só para Portugal, mas também para Malta, Grécia, Espanha ou Chipre, outros países europeus que mantêm regimes semelhantes.

A imprensa de Hong Kong tem também noticiado o fenómeno: em agosto passado, agências de imobiliário de luxo citadas pelo jornal South China Morning Post (SCMP) revelaram crescentes pedidos de informação sobre a compra de propriedades em Portugal.

“Temos notado mais pedidos de informação sobre propriedades em Portugal por parte de compradores de Hong Kong, nos últimos meses. Muitos veem a residência portuguesa como uma opção alternativa na Europa”, disse então a diretora de operações da List Sotheby’s, Binoche Chan, citada pelo jornal.

Rosendo Guimarães da Costa nota, porém, que no caso da Caiado Guerreiro, a maioria dos processos de pedido de vistos ‘gold’ iniciados por clientes de Hong Kong são feitos por via de transferência de capital, em contraste com os clientes do continente, que investem sobretudo em imóveis.

“[Os clientes de Hong Kong] investem sobretudo em fundos de investimento, porque é um investimento líquido: uma forma de transferir dinheiro para Portugal que permite manter a liquidez”, explica.

O advogado nota ainda que os clientes da região semiautónoma chinesa recorrem sempre ao reagrupamento familiar, ao contrário de alguns dos clientes da China continental. A lei permite o reagrupamento familiar para os titulares de visto ‘gold’ a descendentes e ascendentes, desde que sejam seus dependentes.

“Demonstra que eles têm interesse em ter um pé na Europa”, aponta.

A procura surge numa altura em que milhares de residentes de Hong Kong estão a abrir contas bancárias em Singapura e em outros centros financeiros, como plano de contingência, face a um período prolongado de agitação no território.

A região é há seis meses palco de manifestações, cada vez mais violentas, na mais grave crise política desde a transferência de soberania do Reino Unido para a China, em 1997, desencadeada pela apresentação de uma proposta de alteração à lei da extradição, que permitiria extraditar suspeitos de crimes para jurisdições sem acordos prévios, como é o caso da China continental.

A proposta foi, entretanto, retirada, mas as manifestações generalizaram-se e reivindicam agora medidas para a implementação do sufrágio universal no território, a demissão da atual chefe do Governo, uma investigação independente à violência policial e a libertação dos detidos ao longo dos protestos.

Para a Região Especial Administrativa de Hong Kong foi acordado um período de 50 anos, com elevado grau de autonomia, a nível executivo, legislativo e judiciário, após a transferência da soberania pelo Reino Unido para a China.

Face ao agravar da crise no território, a Assembleia Nacional Popular – o órgão máximo legislativo da China, onde mais de 70% dos deputados são membros do Partido Comunista Chinês, partido único do poder no país – revelou que vai estabelecer e fortalecer o sistema legal e um mecanismo de execução para salvaguardar a segurança nacional em Hong Kong.

No mês passado, o Governo central alertou também que usaria a sua autoridade para invalidar a decisão de um tribunal de Hong Kong, que anulou a proibição do uso de máscaras faciais que permitem aos manifestantes proteger as suas identidades da polícia, numa tomada de posição inédita de Pequim que poderia abalar a independência do judiciário local.

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