Catalunha | Políticos independentistas condenados a penas exemplares

O Tribunal Supremo espanhol condenou ontem em Madrid os principais dirigentes políticos envolvidos na tentativa de independência da Catalunha a penas que vão até um máximo de 13 anos de prisão, no caso do ex-vice-presidente do governo catalão. No total, o grupo de dirigentes foram condenados a mais de um século de prisão

 
[dropcap]O[/dropcap] veredicto foi conhecido ontem e as penas são exemplares. O Tribunal Supremo espanhol condenou os principais políticos que lideraram a campanha independentista da Catalunha a penas de prisão que se situaram entre 9 e 13 anos de prisão. Os independentistas são na sua maioria condenados por crime de sedição e desvio de fundos públicos, uma decisão esperada que afasta o crime de rebelião defendido pelo Ministério Público, que tinha penas de prisão maiores.
A decisão era esperada com grande expectativa, principalmente na Catalunha para onde o Governo espanhol enviou nos últimos dias centenas de agentes para garantir a segurança da região, temendo-se as consequências para a ordem pública da esperada condenação dos líderes políticos independentistas.
O Tribunal Supremo condenou o ex-vice-presidente do Executivo catalão Oriol Junqueras, que aguarda a sentença em prisão, a 13 anos de prisão e o mesmo número de anos de “inabilitação absoluta”.
Três outros membros do Governo regional no poder aquando da tentativa de autodeterminação, Raul Romeva, Jordi Turull e Dolors Bassa, foram condenados a 12 anos de prisão e de inabilitação.
As quatro maiores penas são dadas por delito de sedição de grau médio e o delito de desvio de fundos públicos agravado em razão da quantia elevada dos mesmos.
Por outro lado, o tribunal condenou a ex-presidente do parlamento regional Carme Forcadell pelo delito de sedição à pena de 11,5 anos de prisão e de inabilitação, os conselheiros regionais Joaquim Forn e Josep Rull a 10,5 anos de prisão e de inabilitação, e os líderes de associações independentistas Jordi Sánchez e Jordi Cuixart a nove anos de prisão e de inabilitação.
Os três últimos, os únicos que aguardavam a leitura da sentença em liberdade, Santiago Vila, Meritxell Borràs e Carles Mundó, são condenados, cada um deles, como autores de um delito de desobediência a penas de 10 meses de multa, com o pagamento diário de 200 euros, e um ano e oito meses de “inabilitação especial”.
A sentença absolve os acusados Joaquim Forn, Josep Rull, Santiago Vila, Meritxell Borràs e Carles Mundó do delito de peculato.

A monte

Os magistrados acataram assim o que foi pedido pelo Advogado do Estado, sustentando que o ocorrido na Catalunha em 2017 não teve a violência suficiente para ser considerado rebelião, o que era defendido pelo Ministério Público. Enquanto esta instituição defendeu na audiência pública que decorreu no primeiro semestre do ano que o processo independentista devia ser equiparado a um “golpe de Estado” que procurou alterar a Constituição espanhola com “violência suficiente”, o advogado do Estado admitiu ter havido alguma violência, mas contrapôs que esse não foi o “elemento estrutural” do ocorrido.
Os actuais dirigentes regionais, também independentistas, fizeram apelos à “desobediência” caso o Tribunal Supremo condenasse os líderes do processo de independência falhado, embora não tenham especificado quais as acções ponderadas.
Ao todo são 12 os independentistas que aguardavam a leitura da sentença pelo seu envolvimento nos acontecimentos que levaram ao referendo ilegal sobre a autodeterminação da Catalunha realizado em 1 de Outubro de 2017 e à declaração de independência feita no final do mesmo mês.
Nove deles estão presos, mas o ex-presidente do executivo regional Carles Puigdemont faz parte de um grupo de separatistas que continuam no estrangeiro e que não foram julgados, porque o país não julga pessoas à revelia.

Aberratio Juris

Os líderes independentistas catalães classificaram como aberração e vingança as condenações anunciadas, prometendo reagir e continuar a lutar.
Numa carta aberta, Oriol Junqueras reafirmou ontem as suas “convicções democráticas e republicanas” e acusou o Estado de “actuar por vingança”.
Numa carta dirigida aos militantes do seu partido, a Esquerda Republicana da Catalunha (ERC), Oriol Junqueras afirmou que “hoje a independência é mais do que nunca uma necessidade para poder viver numa sociedade mais livre, mais justa e democrática”. “Hoje, quiseram acabar connosco, com toda uma geração de catalães que lutam pela liberdade”, declarou Junqueras, que deixa ainda uma promessa: “Nós voltaremos e voltaremos ainda mais fortes. Não tenham qualquer dúvida, nós voltaremos e ganharemos”.
O ex-presidente do Governo catalão Carles Puigdemont denunciou a “aberração” que foi a condenação dos independentistas catalães, dizendo que é “hora de reagir”. “Cem anos de prisão no total, uma aberração. Agora, mais do que nunca, ao vosso lado e das vossas famílias, é hora de reagir como nunca antes, pelo futuro dos nossos filhos e filhas. Pela Europa: pela Catalunha”, publicou na rede social Twitter o independentista, que vive na Bélgica após a tentativa fracassada de independência da Catalunha em 2017.
A ex-presidente do Parlamento catalão Carme Forcadell, depois de ouvir as sentenças que a condenam a 11 anos e meio de prisão, declarou que “a injustiça foi consumada” e lamentou que a democracia viva “um dia sombrio”. “A injustiça foi consumada. O debate parlamentar livre não é um crime, é um direito de exercê-lo e um dever de defendê-lo. Não nos cansaremos de dizê-lo o quanto necessário”, escreveu Forcadell na rede social Twitter.
A ex-presidente do Parlamento catalão alertou que “hoje a democracia vive um dia sombrio”, mas em momentos como esse pediu para não se deixarem abater pelo “derrotismo”. “Vamos avançar!”, disse ainda Carme Forcadell.
Por seu lado, o ex-conselheiro da Acção Externa Raül Romeva, condenado a 12 anos, denunciou que querem sentenciar “todo um movimento”, mas alertou que “estão errados”. Romeva ressaltou a esse respeito que “nenhuma sentença mudará as aspirações políticas de milhões de cidadãos”, enquanto pede para permanecerem “de pé, combativos e dignos”.

Acção e reacção

A resposta não se fez esperar. Centenas de independentistas catalães cortaram algumas avenidas de Barcelona e concentram-se em diversas zonas da cidade em protesto contra as condenações de ex-membros da administração autónoma por crimes de sedição e má gestão de fundos públicos.
Após serem conhecidas as sentenças, os grupos independentistas cortaram as artérias Ronda del Dat, Diagonal e Via Laietena, em Barcelona, e concentram-se neste momento frente à sede do organismo Òmnium Cultural e à sede do gabinete do conselheiro para as questões territoriais do Governo regional. Também a circulação ferroviária foi cortada cerca das 10h30 (16:30 em Macau) nas linhas R11 e RG1 por cerca de uma centena de pessoas que acedeu às linhas na estação de Celrà, em Girona.
O aumento da tensão na Catalunha poderá ter um efeito desestabilizador em Espanha, numa altura em que o país está politicamente bloqueado, depois de as eleições legislativas realizadas em 28 de Abril último e do fracasso em formar um novo Governo. O país está em plena pré-campanha eleitoral para as novas eleições legislativas antecipadas que se vão realizar a 10 de Novembro próximo.
Em Espanha a Advocacia do Estado está separada do Ministério Público, ao contrário do que acontece em países como Portugal.

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