Ho Iat Seng quer reformas administrativas e caminho gradual para sufrágio universal

O programa político de Ho Iat Seng destaca a reforma administrativa e a garantia de manutenção do número de funcionários públicos, o combate à burocracia administrativa, a lei sindical, o ensino de história da China para promover o amor à pátria e o caminho rumo à democracia. Num programa abrangente, o candidato a Chefe do Executivo salienta, entre os problemas a resolver, as necessidades de habitação para a classe média e a cooperação com o interior da China na gestão do turismo

 

[dropcap]E[/dropcap]ste fim-de-semana, Ho Iat Seng apresentou as ideias que tem para a governação de Macau. Reformar a Administração Pública para não desperdiçar recursos, combater a corrupção rumo a um Governo “impoluto”, desburocratizar a administração, avançar para a lei sindical e promover o amor à pátria através da formação em história de China são alguns dos pilares do programa político do único candidato ao mais alto cargo do Governo. As ideias foram apresentadas no sábado ao colégio eleitoral e à comunicação social.

Para Ho Iat Seng, a Administração Pública precisa de uma reforma, e apesar de não avançar de imediato para o fecho de direcções de serviço. “Vou estudar a reestruturação da administração pública para elevar o nível de eficiência. Espero que no futuro os 38 mil funcionários públicos possam trabalhar de forma mais equilibrada” acrescentou o candidato em resposta a questões dos membros do colégio eleitoral.

De acordo com Ho, a administração pública tem demasiadas direcções de serviços, o que “não é bom”. “Quero razoabilidade nos serviços e competências. Vamos tentar descentrar para que as actividades administrativas sejam mais competentes”, sublinhou.

Na conferência de imprensa, o candidato recordou que mesmo a China “tem apenas 26 ministros” pelo que considera necessário “fazer uma integração ou reestruturação sobre esta estrutura do Governo da RAEM”, sendo que “o facto de haver tantas direcções de serviços pode ter reduzido eficiência administrativa”.

Nesta reforma estão envolvidos os cerca de 38 mil funcionários públicos que existem actualmente na estrutura administrativa da RAEM, um número que Ho não pretende aumentar.

“Evidentemente que não vou aumentar o número de funcionários públicos. Sei que há falta de trabalhadores nalguns serviços e há outros que têm muitos. Neste momento, não há mobilidade de trabalhadores e por isso recruta-se. Se calhar, há trabalhadores que trabalham muito e outros que trabalham menos”, explicou o futuro Chefe do Executivo, salientando que “o mais importante é aumentar a eficácia dos serviços”.

O também ex-presidente da Assembleia Legislativa (AL) considera que o problema neste sector não é a falta de recursos humanos, avançando com a necessidade e uma maior coordenação entre os existentes. “Espero que os 38 mil funcionários públicos possam trabalhar em conjunto para aperfeiçoar a eficiência administrativa”, sublinhou.

Para que esta meta seja atingida, Ho quer acções de formação dirigidas aos funcionários públicos e administradas pelas instituições de ensino superior locais. “Temos a Universidade de Macau ou a MUST que podem ser locais para formação de funcionários públicos, em vez de ter uma instituição própria para formação de funcionários públicos”, referiu.

Simplex local

A par da reforma na Administração, Ho Iat Seng considera que existe demasiada burocracia, o que implica demoras prejudiciais ao desenvolvimento local, com consequências desencorajantes no investimento das PME.

Para o candidato, é necessária agilidade nos processos de licenciamento. “Muitas pessoas querem abrir um restaurante, no entanto, para terem licenças é preciso um ou dois anos, o que é um problema”, apontou. “Temos que o resolver este problema para que seja mais fácil desenvolver negócios em Macau”, afirmou.

Ho Iat Seng avançou ainda com a ideia de construir um edifício de escritórios “de alta qualidade” para “criar um ambiente bom para atrair investimento estrangeiro”.

Relativamente à escassez de recursos humanos, para o futuro Chefe do Executivo o mais importante é garantir que a mão-de-obra local não sai do território tendo em conta o contexto da Grande Baía. Neste sentido, a integração económica de Macau no projecto de cooperação inter-regional deve passar pelo investimento nas cidades que constituem a Grande Baía, mais do que com a participação local através da mão-de-obra. “Em Macau há falta de recursos humanos e se incentivamos os locais para irem para a Grande Baía pode causar muitos problemas, nomeadamente a falta de trabalhadores em Macau”, referiu, pelo que é necessário “incentivar os investidores a investirem na Grande Baía e não para irem trabalhar” para outras cidades envolvidas no projecto.

Esta cooperação com a Grande Baía deve ainda ser feita na área das exposições e convenções, apontando Ho para a necessidade e coordenação com as cidades envolvidas.

Um exemplo

A promoção sólida do princípio “Um País, Dois Sistemas” também está em destaque no programa político do candidato a Chefe do Executivo, que refere a ideia como fundamental enquanto exemplo para Taiwan, combatendo a imagem negativa que a situação de Hong Kong está a promover. “Temos que manter o princípio sem desvios para mostrar o seu sucesso, com isso podemos deixar que Taiwan saiba das vantagens deste princípio”.

O exemplo de Macau é ainda mais necessário devido às manifestações em Hong Kong que constituem um “desvio do princípio [na região vizinha]” que ameaça as três linhas vermelhas do Governo Central. “Até destruíram a bandeira e o emblema nacional. Nenhum país permite a destruição do seu símbolo nacional. Por isso, esta também é uma manifestação de desafio do princípio [‘Um País, Dois Sistemas´]”, disse.

Ainda a respeito de Hong Kong, Ho Iat Seng não deixou de referir que por cá já se fazem sentir algumas consequências, com a vinda de menos turistas. O candidato comparou a situação actual, caso continue, à crise vivida em 2003 com a epidemia de pneumonia atípica (SARS), uma altura em que “muitos casinos suspenderam o serviço e os hotéis não tinham clientes”, disse em conferência de imprensa. “Se a situação de Hong Kong continuar assim nós, se calhar, no segundo semestre vamos enfrentar um grande problema”, sublinhou, acrescentando espera que a região vizinha resolva “o seu próprio conflito”.

Educar para amar

De modo a solidificar o princípio “Um País, Dois Sistemas” em Macau é necessário promover o “amor à pátria, amor a Macau”, defendeu Ho. “Por enquanto, em Macau estamos a fazer muito bem e respeitamos todo esse princípio. Também é importante o ensino da História, e mostrar a comparação da História e da actualidade aos nossos jovens”, referiu Ho Iat Seng. Para isso, “também vamos continuar a aprofundar a sensibilização para esta ideologia, vamos reforçar o ensino de história da China e de Macau para que se conheçam bem estes temas”. Para o candidato ao mais alto cargo do Governo, “é muito importante saber a história da China, o sofrimento do povo durante as guerras e como se conseguiu superar as dificuldades”.

Rumo à democracia

A possibilidade de Macau vir a ser um território em que o Chefe do Executivo pode ser eleito através do sufrágio universal não é excluída por Ho Iat Seng que admite que a RAEM possa caminhar rumo a um sistema mais democrático.

No entanto, o caminho tem de ser gradual. “A Lei Básica vem da declaração conjunta e por isso temos que seguir os passos definido pela Lei Básica. Vamos atingir gradualmente o objectivo democrático do sufrágio universal”, apontou acrescentando que a mudança não deve ser feita “de um dia para o outro”. Nesta matéria, Ho Iat Seng entende que não caberá ao Governo avançar com a proposta de reforma política, mas sim à AL.

Participaram na apresentação do programa político de Ho Iat Seng 248 dos 400 membros que compõe o colégio eleitoral responsável pela eleição do sucessor de Chui Sai On. As eleições têm data marcada para o próximo dia 25 de Agosto.

 

Com lei sindical

Quando for eleito e formar Governo, Ho Iat Seng vai avançar com uma proposta de lei sindical. “No enquadramento da Lei Básica, essa legislação sindical pode ser implementada porque, em todas as cidades da China, só em Macau a lei sindical ainda não entrou em vigor”, referiu, esperando que “em breve possa apresentar à AL uma proposta de lei sindical para apreciação”, depois de o Governo da RAEM ter realizado muitos estudos sobre esta legislação.

Esperar por melhores dias

A proposta de criação de um Fundo para o Desenvolvimento e Investimento com recurso à reserva financeira local pode ficar adiada para outra altura em que as convulsões económicas globais sejam menos acentuadas. “Este ano, se calhar não é um ano oportuno para investimentos dada a situação económica global”, apontou o candidato ao Chefe do Executivo. Para Ho, o fundo que prevê o investimento de 60 mil milhões de patacas e que foi recentemente retirado pelo actual Governo para que possa ir a auscultação pública deve esperar pela estabilização económica mundial. “No futuro, se o ambiente económico global for mais favorável poderemos voltar a este fundo de investimento”, rematou Ho Iat Seng a este respeito.

Casas para a classe média

O problema da habitação foi também destacado por Ho Iat Seng que quer tomar medidas para resolver a aquisição de fracções por parte da classe média. Ho considera que a habitação social e económica o território já tem meios a médio prazo para ser atenuada pelo que é necessário agora pensar noutras faixas da população que enfrentam a mesma dificuldade. “Temos habitação social suficiente e não é preciso construir mais”, disse salientando o papel importante das fracções projectadas para a zona A dos novos aterros. “Vamos ter mais habitações públicas na zona A com mais 28 mil fracções”, recordou. O problema, como de costume, reside na escassez de terrenos, uma situação que não tem uma resolução simples. Mas, “se as 28 mil habitações na zona A conseguirem satisfazer as necessidades e se restarem, então podemos alargar o concurso à classe média”, referiu o candidato.

Seguro para todos

A existência de um seguro universal de saúde pode avançar com o Governo liderado por Ho Iat Seng. O objectivo é conseguir transferir a procura dos residentes pelos serviços públicos para entidades privadas. “Se pudermos ter um seguro médico podemos então desviar alguns serviços para o sector privado. Assim, consegue-se reduzir a pressão económica” dos residentes, disse Ho. Para já, não se compromete porque é “apenas um candidato” e só quando formar Governo pode avançar com medidas a este respeito, se necessário, evitando assim “ser criticado”.

Ordenar o turismo

Ho Iat Seng é contra as restrições de entrada de turistas em Macau. No entanto, defende a necessidade de coordenação com as entidades competentes, principalmente da China continental, de modo a aliviar a pressão do excesso de visitantes nas alturas de feriados. “O território é pequeno para os seus habitantes e 35 milhões de turistas por ano é muito pelo que vamos coordenar com as entidades competentes”, apontou salientando que “proibir a entrada de turistas não é uma conduta saudável, nem madura”.

Acompanhado de perto

O sector do jogo é fundamental para o desenvolvimento de Macau, sendo necessário um reforço da fiscalização apontou Ho Iat Seng. “A despesa e a receita são inseparáveis. Precisamos da receita do jogo”, disse o único candidato ao cargo de Chefe do Executivo. Ho evitou respostas acerca da renovação de licenças de exploração do sector, que terão lugar em 2022, sublinhando, no entanto, a necessidade de “melhorar os indicadores das atividades não jogo”.

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