Desvalorização da educação

[dropcap]N[/dropcap]a sexta-feira da semana passada os jornais de Hong Kong publicaram a notícia do suicídio de uma jovem universitária. No bilhete que deixou, apelava à manutenção da luta contra o projecto de lei de extradição dos condenados em fuga. Lembrava que os esforços empreendidos por dois milhões de pessoas não podiam ser desperdiçados. A notícia também adiantava que a jovem tinha rompido com o namorado.

Durante o período de luta contra a lei de extradição já morreram duas pessoas. A primeira foi o homem que se suicidou em Admiralty e agora esta rapariga. Dois suicídios merecem alguma reflexão. Porque é que os jovens são actualmente tão frágeis? Porque é que encaram o suicídio como saída?

É compreensível que o suicídio possa ser visto como uma forma de fugir dos problema, mas não os resolve de forma alguma. Os adultos devem enfrentar as dificuldades e lidar com elas com calma. O suicídio, para além de ser uma forma de fuga, provoca grande sofrimento aos familiares. Praticar suicídio por causa da lei de extradição provoca sofrimento à sociedade em geral. Se estes suicídios provocarem problemas sociais desnecessários, então serão ainda mais inaceitáveis.

Muitas das pessoas envolvidas nas manifestações contra a lei de extradição são universitários e estudantes do secundário. Existirá um problema no sistema educativo que leve os estudantes a sair para a rua e defenderem as suas opiniões? Penso que a resposta a esta pergunta é muito complexa e não pode ser dada sucintamente. No entanto, uma coisa é certa. Hong Kong era relativamente pobre nos anos 60 e 70. Apenas uma percentagem mínima podia aceder ao ensino superior. Nos anos 80, Hong Kong começou a enriquecer. A pessoas compreenderam que a educação proporciona um futuro melhor. Por isso, nesta altura, houve uma corrida às Universidades, toda a gente queria ter um doutoramento. Pensavam que não teriam de se preocupar com o futuro nunca mais; a entrada na Universidade era um feito glorioso.

Nos anos 90, viveu-se a febre do investimento. Imensa gente investiu dinheiro na Bolsa e em vários negócios. Além disso o Governo criou mais cursos superiores para compensar a saída de especialistas para o estrangeiro. Em comparação com os anos 70 e 80, a cotação do ensino superior começou a baixar. Além disso tinha deixado de ser necessário um grau universitário para ganhar dinheiro.

Hoje em dia o preço das casas em Hong Kong e em Macau é altíssimo. Alguém que tenha acabado de se formar não consegue comprar um apartamento. A educação superior já não pode proporcionar um futuro radioso. Os jovens começam a desvalorizar o ensino universitário, e interrogam-se se vale a pena perder tempo a frequentar uma Faculdade. Trabalham apenas para a nota que garante passarem. Tudo o que vai para além disso é excessivo.

Como não concentram as suas energias nos estudos, aplicam-nas noutras coisas. Coisas essas que podem ser, por exemplo, lutas sociais. Questões de ordem social geram naturalmente problemas sociais. A participação dos estudantes nas manifestações está intimamente ligada à sua atitude perante o estudo.

Portanto, se não se ultrapassarem os problemas económicos e de qualidade de vida, será muito difícil Hong Kong voltar a ser uma sociedade harmoniosa e inclusiva.

 

Consultor Jurídico da Associação para a Promoção do Jazz em Macau
Professor Associado do Instituto Politécnico de Macau
Blog: http://blog.xuite.net/legalpublications/hkblog
Email: legalpublicationsreaders@yahoo.com.hk

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