h | Artes, Letras e IdeiasVirtudes femininas Julie Oyang - 15 Nov 201717 Nov 2017 [dropcap style≠‘circle’]”O[/dropcap] melhor dote é a virgindade de uma mulher.” “A mulher que sofre violência doméstica deve aprender a aceitar o marido. Este género de mulheres não se enfurece com facilidade.” “É importante que uma mulher procure um marido dentro da mesma classe social. Desta forma garante que dará à luz uma criança de linhagem nobre.” Estes gravíssimos disparates Confucianos são ensinados na China dos nossos dias e, dificilmente se imaginará o povo a agradecer ao actual Presidente chinês, pela patifaria de ter ressuscitado a grande tradição chinesa. No entanto, o meu tópico de hoje não é a China, mas sim o documentário da BBC A filha da Índia. Fala-nos sobre uma violação que teve lugar em 2012, num autocarro para Nova Deli, capital da Índia. A 16 de Dezembro de 2012, uma estudante de medicina chamada Jyoti Singh, com 23 anos de idade, decidiu ir ao cinema ver A Vida de Pi com um amigo. Às 20.30, apanhou o autocarro para regressar a casa. Realizado por Leslee Udwin, este documentário, forte, corajoso e de cortar o coração, segue passo a passo, ao longo dos seus 63 minutos, o que se vai passando naquele autocarro em movimento, enquanto Jyoti é brutalmente violada por cinco homens e um adolescente de 17 anos e, de seguida, esventrada e atirada à rua. Mas, mais do que a violação, o que verdadeiramente me impressionou foram as entrevistas: Ficam aqui algumas frases memoráveis: “Uma rapariga decente não deve andar na rua às 9h da noite. A rapariga é mais responsável pela violação do que o rapaz.” Isto, segundo um dos violadores. “Uma rapariga é como um diamante precioso. Se pusermos o diamante no meio da rua, não podemos culpar quem o leva.” “Esclarece-nos” o advogado de defesa. “Uma rapariga não deve sair de casa à noite com o namorado. Não estamos a falar de violação, estamos a falar dos direitos do homem (de violá-la).” Declara um dos violadores. “Ela devia ter ficado calada e deixado que a violássemos.” “Eu tinha-a regado com gasolina e pegado fogo”, diz outro advogado de defesa que conhece as leis indianas. A Filha da Índia provoca desgosto e revolta, mas também pena pela ignorância. O documentário mostra como nos 30 dias que se seguiram, por toda a Índia, homens e mulheres se manifestaram na rua exigindo que a constituição indiana reconhecesse a igualdade dos sexos, o que nunca viria a acontecer. Estes acontecimentos marcaram aquilo a que o procurador geral, Gopal Subramaniam, chama no filme “uma expressão momentânea de esperança social”. Na Índia, uma mulher é violada a cada 20 minutos. No entanto, a maior parte destes casos não é denunciada. A exibição do documentário está actualmente proibida na Índia, por ser considerada nociva para a imagem do país.