Manchete ReportagemAnálise | Indústria norte-americana do jogo com pouca influência na política local Andreia Sofia Silva - 12 Set 201717 Set 2017 A presença da Wynn e da Sands China na indústria do jogo trouxe para Macau dois gigantes norte-americanos: Sheldon Adelson e Steve Wynn. Os dois magnatas têm uma enorme influência na política norte-americana e um pouco por onde estabelecem negócios. Por cá, passam despercebidos e não se metem no sufrágio que vai eleger o próximo elenco da Assembleia Legislativa. O HM falou com alguns analistas que desvendaram este discreto fenómeno [dropcap style≠’circle’]A[/dropcap]s eleições em Macau estão longe de estar inundadas com dinheiro de Super Pac, de anúncios televisivos milionários, grupos de lobbies a trabalhar com legisladores e outras emanações políticas norte-americanas. A curta duração da campanha eleitoral, em comparação com os quase três anos de angariação de dinheiro que os políticos norte-americanos têm de fazer para terem uma chance de eleição, mudam a forma como os grupos de interesse se podem aproximar dos centros de poder. Ainda assim, vista a composição da Assembleia Legislativa (AL), não falta representação de indústrias como a construção, imobiliário e, claro está, o jogo. Sheldon Adelson No entanto, os dois magnatas que têm uma influência tremenda em tudo o que são corridas eleitorais americanas, não apenas à Casa Branca, parecem afastados da eleição do próximo domingo. Uma das razões para tal acontecer passa pela própria legislação eleitoral que exige uma posição de neutralidade às concessionárias de jogo no que toca à qualquer vestígio de influência nas eleições. Isso não impede que tenham assento parlamentar figuras ligadas ao sector, tal como Angela Leong. “Não podem apoiar nenhum candidato, nem podem financiar directamente ninguém em específico. Se olharmos para Angela Leong, ou Melinda Chan, que estão ligadas à indústria dos casinos, reparamos que são candidatas que estão separadas do sector durante as eleições”, comenta o académico Larry So. Entre as pessoas com mais preponderância na política norte-americana oriundas do Estado do Nevada, onde fica Las Vegas, Adelson e Wynn surgem como duas figuras incontornáveis. Na campanha que viria a conduzir Donald Trump para a Casa Branca, Sheldon Adelson fez doações de mais de 82,5 milhões de dólares para candidatos republicanos e 40 mil dólares para democratas. O magnata e CEO da Sands já havia doado mais de 150 milhões de dólares na campanha que resultou na reeleição de Barack Obama. Estas são as somas que se conhecem, que foram declaradas à Comissão Federal de Eleições. Porém, existem formas de doar dinheiro anonimamente, através dos chamados Super Pac, que escapam a este controlo. Por cá, esta influência directa nos processos de eleição/nomeação não existe. Nem de forma sub-reptícia, de acordo com Larry So. “Não acredito que, mesmo de uma forma indirecta, apoiem candidaturas, não de uma forma tipicamente norte-americana, não compram candidatos ou influenciam as eleições”. Viragem histórica Steve Wynn Mas que não se pense que os interesses de quem financia o Super Pac e grupos de lobby fica pela predilecção de candidatos. Sheldon Adelson doou cerca de 20 milhões de dólares para um Super Pac, próximo do líder da maioria no Senado, Mitch McConnell, que resultou numa iniciativa legislativa que, efectivamente, iria banir o jogo online. Uma medida que o magnata do jogo há muito perseguia. As contribuições em dinheiro tornaram-se públicas no dia 20 de Setembro do ano passado; no dia 21 a legislação foi proposta ao Senado. Em Macau, este grau de interferência não se sente. Larry So entende que existe igualmente uma barreira cultural e de política internacional, ou seja, “as relações com norte-americanos podem levantar suspeitas”. O analista explica que os líderes do sector norte-americano do jogo em Macau podem ter alguém em mente, mas que esta proximidade não pode ser estrategicamente visível. A aproximação dos interesses norte-americanos ao poder local teria de implicar “uma abordagem mais diplomática”. O apoio directo a uma lista seria um óbvio erro para máquinas empresariais que estão habituadas a estar perto dos centros decisórios. “Eles preferem usar as suas práticas normais, sendo assim mais fácil tentar influenciar políticos que já estão no poder”, comenta Larry So. Numa outra perspectiva, Arnaldo Gonçalves entende que as operadoras de jogo não têm qualquer relação com a ida às urnas. “As eleições são para eleger representantes das comunidades locais, as operadoras são meros operadores económicos como os outros”, comenta. O académico considera que um comportamento deste género seria “uma intromissão nas questões internas da RAEM”, uma interferência que não se regista noutros sectores da sociedade. Aliás, no contexto do sufrágio que se avizinha, Arnaldo Gonçalves entende que “estas eleições marcam uma viragem na história, têm uma natureza completamente diferente das anteriores, são mais abertas, ligadas a grupos funcionais e a interesses da própria comunidade, não tanto como no passado, mais ligadas a casinos e a associações mais tradicionais”. O académico considera que Macau está a atravessar um período em que, “do ponto de vista político, há mais riqueza”. Pouca utilidade Arnaldo Gonçalves. Foto: Gonçalo Lobo Pinheiro Outra das questões que pode ser determinante para a não interferência dos grupos norte-americanos nas eleições que se avizinham é a proximidade da data de fim das actuais concessões. “Os empresários dos casinos não são estúpidos, estamos a alguns anos da revisão das licenças de jogo e esse comportamento seria um tiro no pé”, comenta Arnaldo Gonçalves. O académico acresce que tal estratégia representaria uma má aposta, uma perda de dinheiro e oportunidade. Na opinião de Arnaldo Gonçalves, a própria candidatura de Angela Leong, directora-executiva da Sociedade de Jogos de Macau, acontece do ponto de vista individual. O académico encara este tipo de candidaturas numa perspectiva da importância social de uma figura de relevo na sociedade que toma um papel de preponderância na esfera política. “Acho que vamos ver esta tendência no futuro. Por exemplo, nas eleições europeias, sobretudo as locais, temos pessoas importantes da comunidade a apresentar candidaturas independentes sem ligação a partidos”, comenta. Esta é uma tendência que Arnaldo Gonçalves encara que possa vir a ser cada vez mais frequente. As diferenças entre a política norte-americana, ou mesmo ocidental, e a de Macau são consideráveis no que à orgânica diz respeito. Como tal, a influência sobre o órgão legislativo pode não ser o alvo mais apetecível de interesses especiais. Aliás, já nas eleições de 2013 Adelson e Wynn se mantiveram afastados das eleições para a AL. Benjamin Wang, director do Centro Pedagógico e Científico da Área do Jogo, levanta a questão de que o verdadeiro poder não se encontra na AL. O académico é da opinião de que exercer influência no órgão legislativo não é uma estratégia eficaz. “Nestas eleições, apenas 14 deputados são eleitos directamente pelos cidadãos e, de qualquer forma, os legisladores não são a melhor via para fazer uma aproximação ao poder, porque não têm grande influência para a indústria”, teoriza o académico. Benjamim Wang não vê na AL o alvo mais apetecível para este tipo de sector. “Não acho que os legisladores sejam os melhores agentes para afectar o Governo, aliás, o sector tem muitos canais para passar a sua mensagem, tais como meios de comunicação social para moldarem a opinião pública”, explica. O investigador entende que para estabelecer um contacto mais directo seria mais útil uma aproximação à liderança da Direcção de Inspecção e Coordenação de Jogos, à Direcção dos Serviços de Finanças, a representantes do Governo mais elevados, incluindo o próprio Chefe do Executivo.