O trabalho de Pedro Alexandrino em Angola

[dropcap style≠’circle’]E[/dropcap]m 1834, após as batalhas de Almoster, em Fevereiro e de Asseiceira, em Maio, ainda nesse mês foi eleita uma Câmara Constitucional e logo uma semana depois, o monarca absolutista D. Miguel abdicou, tendo-se exilado em Itália. O Rei D. Pedro IV vencia o seu irmão e pela vitória liberal, a burguesia recupera o poder no Estado, quando se realizou em Junho eleições para formar as Cortes. Segundo refere Luís Filipe Torgal, “O sufrágio era masculino, indirecto e censitário: só os maiores de 25 anos ou de 21 anos, conforme o estado civil e o estatuto profissional, detentores de um rendimento anual líquido não inferior a cem mil réis, poderiam votar nas assembleias paroquiais. Os escolhidos nestas, possuidores de um rendimento a partir de duzentos mil réis, reuniam-se depois nas capitais de província e elegiam, por sua vez, os deputados.” D. Pedro IV reinou até Setembro de 1834, quando faleceu, subindo assim ao trono de Portugal a sua filha D. Maria II (1834-53).

Pedro Alexandrino da Cunha, comandando a Corveta D. Isabel Maria saiu de Lisboa a 9 de Dezembro de 1836 e após se dirigir para as Ilhas de Cabo Verde, dali seguiu viagem para Pernambuco, estacionando na Baía com o fim de prestar auxílio aos súbditos portugueses aí residentes. “Algum tempo depois passou ao Rio de Janeiro para tomar mantimentos, e continuar na sua comissão para a Costa de África Ocidental, para onde seguiu viagem”, segundo o Boletim Oficial de 1851, cujo redactor era então Carlos José Caldeira.
“Nas possessões portuguesas da África atlântica, a realidade evoluía de forma peculiar pois estava muito dependente do mercado brasileiro. O impulso que Sá da Bandeira imprimira aos negócios do ultramar a partir de 1835-1836 começava a ter os primeiros efeitos, sobretudo em Angola”, segundo Maria Manuela Lucas.
“Abolido o monopólio do comércio do marfim, em 1834, e autorizada a colheita da urzela, ensaiam-se novas plantações, que incluem a cana e o café, com base no trabalho escravo”, como refere Maria Manuela Lucas, que complementa, “Desenvolvia-se agora o comércio dito legítimo, ao mesmo tempo que persistia a prática do tráfico de escravos, ilegal desde 1836 e cada vez mais severamente ameaçado, não obstante a luta dos negreiros contra o poder central e contra os seus próprios concorrentes, que utilizavam localmente a referida mão-de-obra”.

Das mudanças

Pedro Alexandrino da Cunha, que chegara a Angola entre finais de 1836, ou início de 1837, aí esteve em comissão durante perto de cinco anos.
“As primeiras décadas do liberalismo português coincidiram, em Angola com um período de transição histórica, no fim do qual a maioria dos principais habitantes da colónia tinham sido forçados, finalmente, a abandonar o comércio de escravos para o Brasil e a entrar numa nova relação económica com Portugal, baseada na exportação de outros produtos. Esta mudança verificava-se principalmente através das pressões de interesses e acontecimentos internacionais, e só muito parcialmente através de esforços metropolitanos para racionalizar as relações coloniais com Angola a partir dos anos de 1820. As tentativas feitas por sucessivos governos nacionais entre 1820 e 1850, no sentido de acabar com o comércio de escravos e de aproximar a colónia de Angola à metrópole, criando uma dependência económica e política mais estreita, foram fortemente resistidas pelos vários grupos de interesses de que se compunha a sociedade colonial. A violência e os conflitos políticos que caracterizavam a história daquela colónia neste período derivavam, basicamente, de divergências socioeconómicas profundas entre Angola e Portugal, e de uma confrontação clássica entre grupos de interesse coloniais e metropolitanos”, segundo Jill R. Dias, em A Sociedade Colonial de Angola e o liberalismo português (c.1820-1850), que segue referindo, “O carácter e a estrutura da sociedade da colónia angolana nos anos de 1820 reflectiam o seu envolvimento de longa data com o comércio de escravos para a exportação. Desde o século XVII, o comércio externo de Angola tinha sido principalmente um comércio de escravos, canalizado quase exclusivamente para as plantações e minas do Brasil e das Américas. As exportações legais de escravos a partir de Luanda e Benguela para o Brasil tinham aumentado regularmente ao longo do século XVIII. Este fluxo de mão-de-obra de Angola e de outras partes da África colonial portuguesa formava a base produtiva de todo o sistema comercial luso-brasileiro e das suas relações com a Europa do Norte, das quais dependia a prosperidade de Portugal nos princípios de 1800. Contudo, os mercadores metropolitanos eram excluídos em grande parte da participação directa no comércio de escravos angolano nesta data. O controlo financeiro estava centralizado principalmente nas mãos dos mercadores estabelecidos no Brasil. Eram eles que tratavam da exportação para Angola dos produtos europeus e asiáticos usados para comprar escravos, derivando o seu domínio de circunstâncias históricas, reforçado pela proximidade geográfica e pelos favoráveis ventos e correntes do Atlântico Sul”.

Do trabalho

Regressando ao Boletim do Governo da Província de Macao, Timor, e Solor de 1851, “Os importantes serviços que então [Pedro Alexandrino] prestou em Angola, já na repressão do tráfico da escravatura, e já no miúdo exame, que foi fazer à Costa do Sul de Benguela, são bem notórios, e se acham consignados, tanto nos seus Ofícios, dirigidos ao Ministério da Marina, como nas publicações que deles se fizeram nos Jornais Marítimos e Coloniais, e da Estatística das Possessões Ultramarinas, na parte que diz respeito a Moçâmedes, e que quase se pode dizer ele novamente descobriu, sendo causa da importância e impulso que hoje tem, e que por ventura virá a ter no futuro. Desta comissão de Angola, que durou perto de cinco anos, voltou ele ao Reino em 1841, sendo depois nomeado para Membro de diferentes Comissões. Eleito Deputado às Cortes pela Província de S. Tomé e Príncipe nelas tomou assento em 3 de Janeiro de 1843; mas sendo pedido à Câmara dos Deputados para uma nova comissão de serviço, saiu outra vez para Angola em 27 de Abril a bordo da Corveta Urunia que comandava. Chegando a Luanda, assumiu o comando de toda a Estação Naval, criando lá, (na Ilha chamada de Luanda) um pequeno Arsenal que no seu género podia servir de modelo a semelhantes estabelecimentos, e sem o qual não era possível manter a sobredita Estação. Durante este serviço foi promovido a Capitão-de-Fragata por Decreto de 14 de Fevereiro de 1844.
Em 31 de Maio do seguinte ano passou a Governador-Geral da Província de Angola, (lugar do que tomou posse aos 6 de Setembro), sendo então promovido a Capitão-de-Mar-e-Guerra. Pouco depois Sua Majestade o honrou com o título do seu Conselho, e a comutação da Comenda da Ordem de Cristo para a de Aviz”.

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