Reportagem | Autocarros eléctricos são menos poluentes, mas pouco cativantes

Dois autocarros eléctricos estão a circular há já um mês em Macau. Menos ruído foi a mais valia apontada pela generalidade das pessoas que já o experimentaram, que, contudo, continuam a não ver no ambiente uma preocupação

[dropcap style≠’circle’]A[/dropcap] Direcção dos Serviços para os Assuntos de Tráfego (DSAT) tem desde 25 de Agosto dois autocarros E02 a circular nas ruas de Macau. Durante 30 dias, esta parceria entre duas empresas de transportes públicos – a TCM e a Nova Era – vai fazer testes que futuramente irão ditar a viabilidade de se implementar este tipo de transportes em Macau.
O HM quis saber como se comportam os veículos e como os avalia quem lá anda. A entrada no autocarro foi feita na Praça Ferreira do Amaral, em Macau.
Às 10h55 chega então o autocarro. São poucos os que entram. Lá dentro três passageiros apenas. Um deles é Elven. Residente em Macau, tem 26 anos e diz que o ambiente é uma questão que lhe interessa e com a qual se preocupa.
“Acho que é uma óptima ideia os autocarros serem eléctricos porque poupa muita energia e são menos poluentes. Para além disso são mais confortáveis e não fazem ruído. Estou muito satisfeito com esta medida e acho que devia ser para aplicar em definitivo. Além disso, este autocarro é muito pontual.”
Já Clara Castilho tem 70 anos e diz que já experimentou por duas vezes este autocarro eléctrico. Não porque se preocupe com as questões ambientais, mas porque lhe dá jeito para o percurso que habitualmente costuma fazer. O ambiente passa-lhe um pouco ao lado, assumindo que em casa a única preocupação que tem é a de desligar as luzes e todos os electrodomésticos, quando não estão a ser usados. Não notou grandes diferenças entre os veículos eléctricos e os que circulam a diesel. “Talvez o ruído seja menos intenso”, disse ao HM.
Um outro passageiro também quis partilhar a sua opinião com o HM. José (nome fictício) aponta o que considera como falhas. “Os assentos deste autocarro são mais estreitos e o design não é o melhor, nem o mais adequado para Macau, porque parece-me que levam menos passageiros em pé do que os outros autocarros. A porta demora muito tempo a abrir”, frisou.
Jenny discorda de José. A empregada doméstica filipina de 29 anos apanha o E02 várias vezes. Sobretudo porque faz um percurso que lhe “dá jeito”.
“São muito limpos, frescos, não fazem barulho e não poluem o ar”, diz ainda, acrescentando que gostaria de ver mais autocarros destes a circular. Quanto à sua contribuição para não poluir ou para ajudar o ambiente, admite ser pouca.
“Lá em casa não fazemos separação de lixo, mas desligamos sempre as luzes e os electrodomésticos.”

Andar devagar

Estamos quase a chegar à ponte que atravessa para a Taipa e um passageiro, que não se quis identificar, reclama da velocidade.
“Não passa dos 30 km, anda muito devagar e nas horas de ponta ninguém quer apanhar este autocarro. É bom porque não polui, mas se a velocidade for sempre esta, ninguém vai andar nele, as pessoas têm pressa”, diz. “Como estes autocarros não circulam durante o horário de ponta, não percebemos se se adequam às necessidades de Macau.”
O percurso, que termina no Edifício do Lago, tem 18 paragens e o período de circulação é das 10h00 às 13h30 e das 15h00 às 21h00, com cada trajecto a demorar uma média de uma hora.
Kuok não parece importar-se com esta questão. A cidadã diz ao HM que já andou várias vezes na carreira E02.
“Noto menos ruído, acho que são mais espaçosos, não sei se é por serem novos e limpos, e são mais confortáveis. Apoio esta acção porque é benéfica para o ambiente”, diz. Mas, quando questionada se esta é uma preocupação que a acompanha, admite que não. “Não faço nada para manter o ambiente mais verde.”
O motorista do E02 é o senhor Ip. Este é o primeiro dia que experimenta este veículo e, apesar de ainda estar em processo de adaptação, disse que nota “que a sensibilidade na condução é diferente de uns para os outros, nomeadamente na resposta às manobras”. “Este é mais lento”, frisa. Mais lenta também “é a abertura da porta e quando estão com pressa, os passageiros não gostam”, realça.
A DSAT está neste momento a proceder à recolha de opiniões, através de uns formulários que estão dentro dos veículos e que são preenchidos pelos passageiros e entregues no terminal, ou basta deixá-los dentro do transporte. Estas respostas vão ser analisadas e poder ter um peso na decisão futura de implementar, ou não, este tipo de transportes públicos.
No veículo, a distribuir os panfletos para recolher a opinião dos passageiros, estava Wong Hongwei, engenheiro que faz também a supervisão dos autocarros eléctricos. Todos os dias faz o percurso desta carreira com a missão de supervisionar o funcionamento em termos de número de passageiros, consumo de energia e performance em geral. A manutenção, garante este engenheiro que veio da China continental, sai mais barata neste tipo de autocarro.
“Os veículos a diesel, depois de circularem três mil a cinco mil quilómetros, já precisam de trocar o óleo de motor e outras pequenas peças. Mas os nossos autocarros eléctricos que já andaram cerca de seis mil quilómetros, ainda não têm essa necessidade. Ainda não trocámos nada”, diz, acrescentando que “só é preciso fazer os carregamentos de electricidade”.
Todas as noites os autocarros são carregados na oficina no Pac On. Basta um carregamento por dia. “Basta estarem a carregar durante uma hora que chega para fazer o percurso diário”, garante Wong Hongwei.
Por cada percurso completo, o E02 gasta “4% de electricidade, naquilo que se calcula serem 17 quilómetros”.

O futuro

Wong Hongwei admite ser um fervoroso defensor deste tipo de veículos e diz mesmo que “a longo prazo, é a tendência”. Quanto à velocidade máxima, “é limitada a cerca de 100km/h, mas geralmente só pode ser conduzido até 80 km/h. No entanto, é mais do que os veículos a diesel que não vão além dos 69km/h”.
Em relação à questão referida por alguns passageiros – de que a porta abria muito lentamente – o engenheiro avança que “isso não é possível porque o sistema utilizado é o mesmo: porta pneumática”.
Com capacidade para 80 passageiros, este veículo é um AVASS, marca Australiana, com capacidade para cerca de 400 km com apenas um carregamento, segundo este mesmo responsável. Quando o limite da bateria está quase a ser atingido, “quando falta cerca de 20% de carregamento”, tem um sistema especial que se chama de protecção, que entra em modo de economia e dá um aviso. Até ao momento este limite nunca foi atingido porque, “depois de um dia inteiro a rodar na estrada, a bateria indica ainda ter 40% de energia disponível”, frisa o engenheiro ao HM.
Questionada sobre que balanço faz relativamente ao serviço experimental dos autocarros, quantos passageiros circularam, se o prazo experimental vai ser alargado e se já alguma previsão para a sua introdução definitiva, a DSAT não respondeu ao HM até ao fecho desta edição.

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