Imprensa | Bancas em risco de extinção. Títulos exclusivamente online daqui a dez anos

Macau corre o risco de se tornar num dos poucos territórios do mundo sem venda de jornais e revistas nas bancas tradicionais daqui a um punhado de anos. A era digital e os conteúdos online gratuitos ditam esse fim. Os velhos comerciantes mantêm as bancas que herdaram da família, com lucros magros

[dropcap style≠’circle’]C[/dropcap]ada banca tem o nome de família que vem dos tempos em que ainda não havia Internet e os jornalistas escreviam à máquina as notícias que seriam impressas. Já são raras mas persistem, sobretudo no Leal Senado. O negócio é fraco e quase não dá lucro, dizem os comerciantes com quem o HM falou. A existência de uma política de subsídios à imprensa portuguesa e chinesa permite que todos os conteúdos dos jornais estejam disponíveis online na íntegra, sem que o leitor tenha de fazer subscrições. Sem um mercado publicitário forte que sustente a imprensa, a era digital promete chegar ainda mais depressa do que o próprio futuro.

Apesar de as bibliotecas públicas estarem cheias de idosos a ler jornais, a verdade é que são poucos os que vão comprar o jornal diário à banca do costume, logo pela manhã. Chan Lam Kei, proprietário da banca “Chan Lam”, situada no Leal Senado, diz que as condições de negócio mudaram muito.

“A banca tem 60 anos de história e tem o nome do meu avô. A venda de jornais caiu duas vezes, com a consulta na Internet e a televisão com noticiários durante todo o dia. Só a geração mais velha é que tem o hábito de ler jornais com um copo de chá na mão, nos restaurantes de yum cha”, conta.

“Deixei de fazer entregas de jornais porque não há subscrições e não há praticamente jovens a comprar jornais, só o fazem para realizar os trabalhos de casa. Trabalhar neste sector é difícil, o horário de trabalho é longo. Não vão haver jovens a quererem fazer este trabalho”, acrescenta.

Na zona do Leal Senado persistem quatro bancas de jornais, mas outras quatro fecharam nos últimos anos, recorda Chan Lam Kei. Além da banca localizada na zona da Praia Grande, começa a ser raro encontrar um sítio que venda jornais.

Yan Kuanzhi, com quase 80 anos, é o dono da banca Wa Kei, na Almeida Ribeiro. Também para ele os tempos têm sido difíceis. “A banca era propriedade dos meus pais. O volume de negócios caiu cerca de 80 por cento.”

A chegada das lojas de conveniência, que também vendem jornais em chinês e inglês, “afectaram o negócio”, aponta o comerciante. As novas medidas de controlo do tabaco também. “A proibição de fumar fez com que a venda tenha caído 90 por cento. Ganho umas dezenas de patacas por dia. Não temos dinheiro e dependemos do que recebemos do Governo para sobreviver”, frisa Yan Kuanzhi.

Os livros da China

Uns passos mais acima, bem perto da Livraria Portuguesa, está Chong, proprietário da banca “Kuong Kei”, um negócio que começou nos anos 60. Chong não paga impostos pelo seu negócio porque o Governo resolveu isentar as bancas desse pagamento, mas antes pagava duas mil patacas por ano.

Apesar do panorama negro das bancas de jornais, Chong ainda tem um laivo de optimismo. “A Internet não afectou muito porque há sempre conteúdos que não se conseguem ler online, como os artigos de opinião ou os contos. Mas também é verdade que os jovens raramente lêem jornais.”

Chong revela que os turistas, ao invés dos jornais, preferem comprar livros de teor político que fazem algumas críticas ao Partido Comunista Chinês e que não se vendem no interior da China.

O jornal com maior número de circulação é o jornal Ou Mun, existindo outros títulos de língua chinesa como o Jornal do Cidadão ou o Jornal Va Kio. São ainda vendidos, com uma menor tiragem, jornais em língua portuguesa e inglesa, bem como alguns títulos de Hong Kong.

Até ao fecho desta edição não foi possível obter reacções das direcções dos jornais de língua chinesa sobre o esperado fim das tradicionais vendas em banca, e de como isso poderá afectar a fatia da população que ainda não consegue ler as notícias à distância de um clique.


Títulos exclusivamente online daqui a dez anos

O analista Larry So apresenta um futuro algo dramático para os jornais impressos, sejam eles chineses, portugueses ou ingleses: daqui a dez anos restará nas bancas um ou dois títulos, sendo que todos os outros passarão a estar disponíveis apenas online.

“Essa é uma tendência inevitável, e acredito que nem mesmo a política dos subsídios do Governo consiga evitar isso. Apenas um ou dois jornais irão sobreviver no seio da comunidade. E o resto dos jornais serão online. Isso irá acontecer dentro de dez anos”, disse ao HM.

O panorama não deverá ser diferente para o nicho luso. “Os jornais portugueses enfrentam o mesmo problema que os jornais chineses. Talvez daqui a uns anos haja apenas um jornal português e um inglês à venda. A circulação dos jornais ingleses e portugueses é muito baixa. Os jornais chineses de pequena dimensão são subsidiados, mas não é suficiente para a sua sobrevivência.”

O fim das bancas tradicionais de venda de imprensa poderá representar um problema para uma velha geração que não se soube adaptar ao computador. “Estamos a entrar na era digital e há muitos media que começaram a mudar para o online. Essa é uma das razões para o decréscimo da imprensa. A segunda razão é que temos jornais em formato papel mas têm distribuição gratuita. Com todos estes novos formatos temos uma queda. A geração mais velha está habituada a ler as notícias em papel e necessita de ter este meio para se informar. Isso poderá trazer alguns problemas à geração mais velha, que costuma ir às bibliotecas ler os jornais”, referiu Larry So.

O académico considera que o fim das bancas não trará um decréscimo da liberdade de informação e de expressão. “Isso não significa que os media online não irão manter essa liberdade de expressão e de publicação. É algo que não depende do formato de publicação. Haverá algumas limitações junto da sociedade. Tudo dependerá das políticas e da atitude do Governo em querer que se mantenha a democracia e a liberdade de expressão.”

Dez por cento de leitores

Agnes Lam, docente da Universidade de Macau (UM), realizou um inquérito em 2002 que dava conta de 60 por cento de leitores diários de jornais impressos. Anos depois, esse número baixou para dez por cento.

A académica e ex-jornalista fala de uma baixa circulação da imprensa. “Os valores de circulação dos jornais não ajudam à maioria dos títulos, e não geram lucros directos, são muito baixos. A importância de um jornal vai tornar-se menor e penso que poucos jornais hoje em dia têm verdadeiros lucros. Talvez o Ou Mun ou um título português.”

Ainda assim, Agnes Lam acredita que “há características importantes nos media tradicionais. “Prestam mais atenção aos factos, ajudam a criar uma agenda junto da sociedade. Isso é importante para a sociedade. Este é um factor fundamental para a democracia.”

Em Hong Kong, território com mais títulos e um forte mercado publicitário, onde não há subsídios públicos atribuídos aos media, o panorama é bem diferente, apontou Agnes Lam. A aquisição do South China Morning Post pelo milionário chinês Jack Ma fez dele um título gratuito online, mas nem por isso deixou de ser publicado em papel.

“A situação em Macau é diferente. Temos mais jornais chineses, mas penso que esta indústria não é muito normal, pois um proprietário de um jornal tem também alguma influência política. Muitos dos proprietários não se preocupam com a leitura que os jornais irão ter”, concluiu Agnes Lam.

5 Jan 2017

Cotai | Casos de vendas ilegais de comida já são quase uma centena

[dropcap style=’circle’]A[/dropcap]publicação Macau Concealers trouxe à praça pública a venda ilegal de produtos alimentares na áreas de construção do empreendimento Studio City. O Instituto para os Assuntos Cívicos e Municipais (IACM) já admitiu saber do caso e anunciou ter detectado pelo menos 88 casos.
De acordo com o jornal Macau Daily Times, duas carrinhas estacionam no local e de lá surgem três vendedores que, num abrir de portas, mostram disponíveis caixas de arroz, pão, bebidas e outros snacks. À volta surge então um aglomerado de pessoas, na sua maioria, lê-se, trabalhadores não residentes (TNR). A polícia está um pouco mais à frente, a filmar todo o aparato. Ao fim de dez minutos vai ao encontro dos vendedores, mas uma das carrinhas já está vazia e sem o proprietário por perto.
O caso chegou agora aos média, mas não parece ser recente. “Isto acontece há algum tempo, muito tempo, provavelmente desde o primeiro dia da obra”, disse à publicação Sou Cheong In, recém-licenciado a trabalhar no escritório do empreendimento. Os vendedores ambulantes, conta, têm actuado pelo menos nos últimos dois anos.
Segundo um comunicado emitido pelo IACM na terça-feira, em língua chinesa, o caso tem sido acompanhado. O IACM diz que tem dado toda a atenção à situação dos vendedores sem licenças, sobretudo na zona onde estão os grandes lotes no Cotai.
“Desde o início deste ano até ao momento, o IACM conseguiu detectar 88 casos de vendas sem licenças. Foram apreendidos e confiscados 1600 quilogramas de comidas confeccionadas, 3100 garrafas de bebidas, tendo sido de imediato apresentado às autoridades competentes para acusação”, pode ler-se no comunicado.
Para combater as actividades dos vendedores ilegais, o IACM afirmou que não só tem pessoal para inspeccionar os pontos onde mais surgem este tipo de vendas, mas tem também cooperado com as autoridades policiais para que possam ser levadas a cabo actividades de inspecções surpresas.
Relativamente aos TNR envolvidos nas vendas ilegais, o IACM vai, diz, transferir os casos para a Direcção dos Serviços para Assuntos Laborais (DSAL).

13 Ago 2015