Alen Tagus ao vivo em estúdio

Alen Tagus ao vivo no Studio Canoa

[dropcap]S[/dropcap]im, de um lado Sines do outro Paris, uma linha pelo meio. Charlie Mancini encontrou Pamela Hute online e com o despertar da curiosidade, por empatia no gosto mútuo pela composição musical, estabeleceu a ligação e começou a enviar-lhe ficheiros sonoros com composições suas, elaboradas nas teclas do seu piano. A luzinha acendeu do outro lado e desse primeiro embate, Pam resolve colocar a sua técnica apurada e a voz, misturando os fios para a eternidade do que à partida seria um encontro efémero, na verdadeira glória da partilha electrónica.

Assim nasceram os Alen Tagus, nome que não é preciso descodificar. A conexão prosseguiu durante meses a fio, numa ligação criativa vivida apenas à distância. Os temas começaram a sair do forno como pãezinhos quentes e de repente tinham um álbum nas mãos para apresentar ao mundo, “Paris, Sines”. Em Portugal, passaram pelas rádios e novos brilhos se acenderam. O passo seguinte seria, finalmente, o encontro cara-a-cara e a formação física de uma banda. De novo de cá e de lá surgiram os outros elementos: Eva Tribolles, no baixo; Miguel Sousa Moreira, nas guitarras; e Pedro Sousa Moreira, na bateria. A simbiose para um equilíbrio perfeito.

A estreia deu-se no Festival Termómetro, um concurso musical que decorreu no último Outono/Inverno. Com datas marcadas para os primeiros concertos em Portugal e com uma residência artística agendada para Sines, deu-se o isolamento forçado pela pandemia mundial do vírus que deixa todos em casa. Sem a possibilidade da digressão prevista, o forno voltou a ter a sua chama e novos temas surgem com regularidade. O sabor é distinto, como uma iguaria da cuisine française elaborada no Alentejo.

ALEN TAGUS

Projecto franco-português, imaginado entre Sines e Paris, Alen Tagus criam uma indie-pop introspectiva influenciada pelos sons dos anos 70. O primeiro single questiona a evolução do amor e da amizade nas relações humanas e revela uma composição sensível e elegante. Nascida da inesperada associação entre o músico português Charlie Mancini – pianista e compositor de filmes – e a artista francesa Pamela Hute – melodista e roqueira no coração – Alen Tagus exploram bases musicais incomuns.

Alen Tagus

PAMELA HUTE, CHARLIE MANCINI, EVA TRIBOLLES, MIGUEL SOUSA MOREIRA, PEDRO SOUSA MOREIRA

27 Mar 2020

Da audição dos mapas

Metro, Lisboa, 20 Junho

 

[dropcap]G[/dropcap]ostava de o ter lido em Sines, por coisas que nada mudariam. «parágrafo único: salvar da/ devastação. Nomear… objectivar/ o Mundo, prendendo-o por/ liames decentes, ligaduras.» Os mapas só se mexem quando bastamente dobrados, encolhendo-se nos bolsos, recolhendo dos restos, cotão e agrafo, saliva e fiapo de pano, maneiras de reorganizar o horizonte. Anotemos as coordenadas: «Al Berto: A Busca. A Solidão, A Morte. E Sempre este Nosso Idioma [cartas inéditas e outras raridades, transcrição quase diplomática anotada por Paulo da Costa Domingos] (ed. viúva frenesi)». Atirado às feras leitoras para assinalar os setenta e um anos de Al Berto, esta compilação ergue-se testemunho de época, de grupo, até de geografias (coincidentes na santa catarina, quinta e bairro, ambas tornadas vizinhança), mas sobretudo de encontros. Ninguém como o Paulo para dizer política quando afirma o íntimo. Na literatice de hoje respira-se ambiente tóxico, com uma intimidade a ser castigada parvamente apenas por pertencer aos outros, quando se incensa esta tão só por pertencer aos nossos, ainda que os nossos durem fósforo antes de passarem a outros. Neste opúsculo acontece planta que dura um dia, ou antes efêmero insecto, ou, melhor, a extrema combinação de ambos: em torno de versos e sua leitura livre desponta uma amizade que floresceu de mil maneiras antes da morte a cercear. «Dias retorcidos a ferro, alguns com a suavidade/ do tweed, ou em lamúrias de sangue/ mal drogado pelas veias, e depois o tal regresso/ ao noticiário, ao mito, à museologia.» Insisto, só o Paulo para fazer da navalha algo que nos apeteça beijar.

Antena 2, Lisboa, 28 Junho

Estranho que a morada de um alcatifado silêncio, mesmo por entre as frases dos que falam, sejam os estúdios da rádio. O vermelho luminoso dos «No Ar», dentro por extenso, fora apenas no sonoro vermelho, impõem o respeito devido ao normal funcionamento da mais desabrida curiosidade. No corredor, sussurrados, no aquário, tudo se faz possível – ei-lo, o doméstico animal que cruza idealizado com concreto, bruto que às vezes morde, outras se aconchega para ser a pedir carícias. (Parece gato, assim descrito, mas não nos deixamos enganar).

Encontro-me, por acidente e na vez do exterior do vidro duplo, no miolo-estúdio do Paulo [Alves Guerra], enquanto este descasca camadas ao Levi [Condinho]. Assisto, na primeira fila, ao espectáculo em vias de extinção da esclarecida curiosidade: o jornalista a sobrevoar que nem vespa o maduro entrevistado em floresta de memórias e papéis e cd’s e o mais que nos vai ajudando a ser nas obsessões e outras identidades, picando nas carapaças, nas timidezes, nas agendas do que não posso deixar de dizer, até que os voos os soltam a ponto de apenas ser.

Para os ouvintes. Dou por mim a pensar que a rádio alarga o especto do silêncio, tal o humano faz à alma, que só ela sabe ser toda em si. Rodo o botão e sintonizo o Filipe Pires do «Canto Ecuménico», e o metal que se dobra de sonora maneira «Para vos falar de toda essa música do Universo/do Universo conhecido e criado na (tua) alma de barro eu digo miosótis…» e estendendo-se até «extensas palpitantes águas». Mas podia apanhar o Mahler em que concordámos, quando chamado à conversa, quando devia a escolha ser um dos jazz. Para sermos, precisamos de rios tornados próximos pela sede e pelo mergulho, nos quais aprender a dança e o detalhe da letra e da melodia.

A mesa do almoço acrescenta alguém que vem confirmar os meus laços ao Oeste, o das míticas ressonâncias. Fazendo contas de cabeça, cóbois só dois ou três, o Henrique [Manuel Bento Fialho], o João [Nazário] e, além dos que me escapam, este que agora se ajunta, o Bernardo [Trindade], mestre do laço laçado aos mais brutos animais. (Não vislumbro nem índios nem índias, por agora). O pudor, mais pela lamechice do que pela bruteza, não permite descrever o que aqui aconteceu em torno de Alcobaça e seus mosteiros, altaneiros ou rasteiros, o passado e suas estreitezas, o presente e suas possibilidades. A minha memória diz oboé, diz mamas, diz vanguarda, diz liberdade, tudo com anos de diferença e dores distintas. Falámos, como se ali estivesse, de Tarcísio Trindade, por estas e outras tantas razões: «Doze marcos quilométricos brancos/Actualizam a paisagem// Estáticos na berma da estrada/Ornamentam o itinerário da viagem». Paulo, bota aí Arnold Schönberg, só porque sim e por ser título do poema-mesa onde nos espelhamos, que lemos, no qual viajamos.

Artes e Letras, Óbidos, 29 Junho

A palma da mão marcava linha em direcção às míticas poltronas, cadeirões, maples que se fazem centro de um universo forrado a lombadas, imagens-fortes, restos de viagens e mapas, dos absolutamente irrequietos. O Luís [Gomes] mudou-se de armas e bagagens – as segundas já descritas, tomando por primeiras os caracteres de chumbo e demais ajudantes de pôr tinta no papel – para o Oeste. Convém distância do centro a certas artes, as de mastigar mistérios como as criar modos de viajar no desconhecido. Agora que nos perdemos nisto da rede, custa mais perceber que cada livraria, em o sendo, se deixa fazer igual às outras. Uma livraria, mais ainda a de fundos, e portanto agravada no caso dos alfarrabistas, ganha o feitio, o recorte, o perfil de quem a alimenta. Em boa verdade, desta ao quilo, que não a engano, freguesa, aplica-se a qualquer comerciante, um vedor de necessidades. Nisto, sinto-me em casa, só de estar por perto da máscara do astrolábio, dos tchokwe, da bússola do colonialista, do velhíssimo símbolo da fertilidade, daquela carta marítima onde os destinos confluem, do cavalo em madeirame parvamente calmo, quando devia ser baleia a esmagar-nos. Trouxe o mobiliário à colação, mas o essencial reside na conversa, no percurso único, no saber disperso e marinheiro, na presença do Luís, o único capaz de trazer o mar e por inteiro às bordas do castelo.

Alfa Pendular, algures, 6 Julho

Aguardo o momento em que escreva desço a norte, mas não será desta. Projecto comum faz-me subir a Campanhã com o Luiz [Pires dos Reys], que não carecia de pôr y no nome para agravar afinydades. Logo ali na estação, um dos seus autores, Côta Seixas, confessa-se-me devedor de um vinho caseiro, dos de gosto mal-educado. A memória não me ajuda nunca, estou a quase a abdicar da dita, ou pelo menos a castigá-la (não me lembro de como o fazer). Tinha o acontecido raízes nas Correntes da Póvoa. Haja quem faça contabilidade dos encontros e das conversas. Celebro a coincidência de livro na mão, este «Fabulário Amoral de Fauna & Flora» (ed. Edições Sem Nome), pequena colectânea de deliciosas absurdezas, ilustradas por Tiago Seixas, que desenha sobre a quadrícula das latitudes e longitudes. A que esta página contém ilustra o micro-conto «Rosa dos Ventos», que fala da convivência carnal entre as estações. Mas para ilustrar a delícia de desfazer quilómetros no vidro da janela do comboio trago «Adrede». «Por não ouvir, um surdo pede a um absurdo que, por escrito, lhe diga quem é.

Com caneta permanente, de tinta extinta, o absurdo que não houve responde ao surdo que não ouve:

– sou tudo o que há e não existe, o princípio do nada, o fim do infinito.”

10 Jul 2019

Costa : Sines como “nova porta” do gás natural na Europa

[dropcap style≠’circle’]O[/dropcap] primeiro-ministro desejou ontem que Sines se torne a “nova porta” de entrada do gás natural na Europa, melhorando assim a “segurança energética” do continente, ao invés da atual sujeição à Rússia ou à Argélia. “Por exemplo, a segurança da Europa em matéria energética tem tudo a ganhar com a criação e desenvolvimento de um novo terminal que nos permita receber gás natural na fachada atlântica, no Porto de Sines, e diversificar as fontes de abastecimento da Europa, hoje dependentes da Rússia ou da Argélia. Podemos ser a nova porta para melhorar a segurança energética da Europa”, disse António Costa. O líder do executivo socialista discursava num evento sobre a estratégia portuguesa para a próxima década, em Lisboa. “A defesa da Europa não se faz só com maior investimento em capacidade militar. Faz-se também investindo na ciência e desenvolvimento, novas competências e capacidades”, declarou.

França : Greenpeace “ataca” central nuclear

[dropcap style≠’circle’]U[/dropcap]m grupo de membros da Greenpeace entrou ontem na central nuclear de Cruas-Meysse, no sul de França, para denunciar a insegurança deste tipo de instalações e o seu fácil acesso. A organização não-governamental indicou que cerca de 20 activistas entraram na central pelas 6:20 para alertar contra a “extrema vulnerabilidade” das piscinas de combustível nuclear usado. Os activistas quiseram “denunciar a inacção” da energética EDF, operadora dos 58 reactores nucleares em solo francês, face aos alertas sobre o “risco nuclear”. Alguns dos activistas subiram a uma dessas piscinas, enquanto outros deixaram a marca da sua mão, para “demonstrar a sua acessibilidade”. A Greenpeace recordou que no passado dia 12 de Outubro outro grupo entrou na central de Cattenom, no noroeste do país, para evidenciar também a sua fragilidade. “Desde então, a EDF não fez nada”, acrescentou a ONG, que indicou que os seus activistas conseguiram entrar hoje no local “em menos de dez minutos” e alertou que as piscinas de combustível são as que mais radioactividade contêm e não estão suficientemente protegidas de ataques exteriores.

29 Nov 2017