Dividendos em quarentena II

[dropcap]N[/dropcap]a sexta-feira passada, o Hongkong and Shanghai Banking Corporation efectuou uma reunião com os accionistas em Londres. Durante o encontro a direcção do HSBC declarou ter consciência de que a decisão de suspender o pagamento dos dividendos tinha desagradado aos accionistas. A direcção lamenta o sucedido e sublinha que, quando se ultrapassar o impacto da epidemia na economia, o pagamento dos dividendos será revisto.

Nesse mesmo dia, a comunicação social fez saber que o HSBC tinha doado 60 milhões para, em conjunto com instituições de solidariedade social, apoiar idosos e comunidades afectadas pela pandemia. Foram doadas 65.000 embalagens com alimentos e 13.000 embalagens com equipamentos de protecção. Esta acção inclui formação na área de protecção civil, primeiros socorros, prevenção da epidemia, etc. Teve como alvo 43.000 pessoas carenciadas.

Como é sabido, o HSBC está a seguir as directrizes do Governo britânico no sentido de acumular fundos suficientes que permitam suportar as consequências do surto epidémico, e por isso não está a pagar dividendos aos accionistas. Esta decisão dividiu a opinião pública. Há quem advogue que se o HSBC não vai pagar os dividendos, deveria ao menos pagar os bónus das acções, para que os investidores tivessem alguma compensação. A Shareholders Alliance (Aliança de Accionistas) espera conseguir juntar pelo menos 5% dos accionistas para pressionar o conselho administrativo a convocar uma reunião geral extraordinária.

Esta reunião seria convocada ao abrigo da Lei Comercial de Hong Kong para discutir a questão do pagamento de dividendos. Outra acção prevê o envio de uma carta por cada accionista dirigida ao HSBC e à Comissão Reguladora para a Segurança Financeira de Hong Kong, exigindo a resolução do problema. É evidente, que irão surgir várias propostas no sentido de proceder legalmente contra o HSBC, mas a Lei Comercial de Hong Kong não obriga ao pagamento de dividendos, mesmo que a empresa tenha tido lucro no ano anterior, pelo que a probabilidade destas acções virem a ser bem sucedidas será baixa.

Um membro do Conselho Legislativo de Hong Kong dirigiu-se por escrito ao Gabinete Financeiro e do Tesouro e à Comissão Reguladora para a Segurança Financeira solicitando uma intervenção junto do Governo britânico a fim de proteger os direitos dos accionistas minoritários.

Depois de ter tomado em consideração todas estas manifestações de desagrado, o HSBC, para além de ter lamentado o sucedido e de prometer rever assim que possível o pagamento dos dividendos, está a conceder empréstimos especiais aos clientes afectados pela pandemia, e a implementar um plano para adiar o pagamento das hipotecas. Algumas destas medidas são muito benéficas para os clientes. Na situação que vivemos, os trabalhadores estão preocupados com o desemprego e os empregadores com a falência dos seus negócios, todos precisam do apoio dos bancos.

No entanto, a situação dos accionistas é diferente. Estão obviamente desapontados com esta decisão. O HSBC distribuía dividendos quatro vezes por ano. Muitos investidores compraram acções do HSBC com a expectativa de receberem um rendimento fixo. Sobretudo em Hong Kong, muitos accionistas contavam com os dividendos do HSBC como um suplemento às suas reformas. Ao perderem este suplemento é natural que fiquem desagradados.

As acções de solidariedade social do HSBC são meritórias, mas estas acções divergem dos objectivos dos accionistas. Os próprios accionistas têm objectivos pessoais diferentes. Para alguns, o mais importante são os dividendos, outros procuram negociar com as acções. Estes últimos querem comprar acções a preços baixos e vendê-las por valores mais elevados. O impacto das medidas de solidariedade do HSBC nos accionistas é bastante questionável. A maior parte dos accionistas aposta nos proventos que obtém com os dividendos, nesse sentido, as medidas de solidariedade são uma panaceia em troca do não pagamentos desses montantes.

Claro que a forma mais eficaz de acabar com a insatisfação dos accionista era pagar-lhes os dividendos, mas essa decisão iria colocar o HSBC numa posição embaraçosa, pois implicava desobedecer às directrizes do Governo britânico.

É evidente que os accionistas ficaram descontentes por não lhes terem sido pagos os dividendos habituais e o HSBC não pode tomar decisões contrárias às ordens que recebe do Governo. Só nos resta esperar que as novas políticas do HSBC possam reduzir o descontentamento dos accionistas.

Consultor Jurídico da Associação para a Promoção do Jazz em Macau
Professor Associado da Escola Superior de Ciências de Gestão /Instituto Politécnico de Macau
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28 Abr 2020