Vaticano | China prolonga acordo sobre nomeação de bispos

A China anunciou ontem que chegou a acordo com o Vaticano para prolongar um acordo relativo à nomeação de bispos no país.

“Durante consultas amigáveis, as duas partes decidiram prolongar o acordo por mais quatro anos”, disse Lin Jian, porta-voz do Ministério dos Negócios Estrangeiros, em conferência de imprensa. Vaticano e Pequim assinaram um acordo em 2018 sobre a complexa questão da nomeação de bispos na China. O acordo, que dá a ambas as partes uma palavra a dizer sobre as nomeações, foi renovado pela última vez por dois anos em Outubro de 2022.

Pequim confirmou ontem que o acordo foi renovado e congratulou-se com a melhoria dos seus laços com o Vaticano. “China e Vaticano avaliaram positivamente os resultados da aplicação deste acordo”, afirmou Lin. “As duas partes prosseguirão as discussões num espírito construtivo e continuarão a promover a melhoria das relações entre a China e o Vaticano”, acrescentou. Estima-se que cerca de 12 milhões de católicos vivam na China.

23 Out 2024

Delegação do Vaticano está na China para discutir acordo

[dropcap]U[/dropcap]ma delegação do Vaticano encontra-se na China para discutir a implementação de um acordo histórico sobre a nomeação de bispos, uma viagem que especialistas dizem ser um passo para o restabelecimento das relações bilaterais.

De acordo com o jornal chinês Global Times, a delegação está na China para conversar com “funcionários da igreja e do Governo” e trabalhar em “medidas práticas” para implementar o acordo provisório celebrado em Setembro, disse ao jornal o director da assessoria de imprensa da Santa Sé, Greg Burke.

Em Setembro, o Governo chinês e o Vaticano assinaram um acordo provisório sobre a nomeação de bispos, principal causa de conflito entre as duas partes. Nesse sentido, o papa Francisco anulou a excomunhão de sete bispos nomeados pelo Governo chinês, reconhecendo-os e abrindo caminho para a normalização das relações diplomáticas.

A Santa Sé e Pequim não mantêm relações diplomáticas desde 1951 e cerca de 12 milhões de católicos chineses estão divididos entre uma igreja cujo o clero é aprovado pelas autoridades chinesas, e uma Igreja clandestina que apenas reconhece a autoridade do papa.

Macau e Hong Kong são os únicos locais em toda a China onde a autoridade papal na Igreja Católica Romana é aceite.

16 Dez 2018

Pequim trabalha com o Vaticano para melhorar relações

[dropcap style≠’circle’]A[/dropcap] China disse ontem que está a trabalhar com o Vaticano para melhorar as relações bilaterais, numa altura em que ambos os Estados estão prestes a assinar um acordo sobre a nomeação dos bispos, segundo observadores.

“A nossa posição é clara: estamos contentes por trabalhar com o Vaticano para melhorar as relações”, afirmou o porta-voz do ministério chinês dos Negócios Estrangeiros, Lu Kang, em conferência de imprensa.

Uma delegação de académicos chineses participa hoje e terça-feira, no Vaticano, numa conferência contra o tráfico de órgãos.

Sem avançar mais detalhes, Lu assegurou que Pequim está a tentar desenvolver as relações com a Santa Sé, não só naquela área.

Em declarações ao jornal oficial Global Times, Huang Jiefu, ex-vice-ministro chinês da Saúde e actual responsável pelo comité nacional de doações e transplante de órgãos, assegurou também que as “relações entre Pequim e as autoridades do Vaticano estão a avançar”. A conferência é uma oportunidade “para estender o contacto para além do sector da saúde”, notou.

Num outro sinal de aproximação, a igreja católica e os comunistas chineses concordaram trocar várias obras de arte para a realização de duas exposições simultâneas, a partir deste mês, na Cidade Proibida de Pequim, e no Museu do Vaticano.

13 Mar 2018

Diplomacia | 70 anos depois, Igreja católica entende-se com Pequim

Depois do corte dos laços diplomáticos entre a China e o Vaticano, que vigora desde os anos 50, a Igreja Católica volta a aproximar-se de Pequim. Entre a necessidade do Partido Comunista Chinês de controlar uma força externa a operar na sociedade e o vasto potencial de evangelização de quase 1,4 mil milhões almas, será firmado um acordo histórico para a nomeação de bispos. Um assunto que tem dividido o Vaticano e Pequim, desde que a Igreja excomungou os bispos nomeados pelo regime comunista

 

[dropcap style≠’circle’]N[/dropcap]o Seminário Católico da China, o maior convento de Pequim, a figura do papa Francisco surge no hall de entrada de todos os edifícios, numa impressão em cartão, à escala humana, a dar as boas-vindas. “Todos os católicos chineses gostariam que o Papa viesse à China”, conta à Lusa o seminarista Joseph, 28 anos e natural da província de Hebei, norte do país. “Como não pode, trazemo-lo assim aqui”, diz.

Pequim e a Santa Sé romperam os laços diplomáticos em 1951, depois de Pio XII excomungar os bispos designados pelo regime comunista chinês. Os católicos do país dividiram-se então entre duas igrejas: a Associação Católica Patriótica Chinesa (ACPC), aprovada por Pequim, e a clandestina, que continuou fiel ao Vaticano.

A ACPC gere e financia os seminários chineses, onde são formados as freiras e padres locais, visando assegurar que os católicos do país funcionam independentemente de forças externas e “promovem o socialismo e patriotismo através da religião”.

“Para as autoridades chinesas, a igreja católica representa um poder exterior, que está a coordenar coisas na China, o que para eles é impensável”, afirma à Lusa um padre europeu radicado em Pequim.

“Uma das lutas do Governo chinês é exactamente ‘achinesar’ muitos dos conceitos e da lógica das religiões não-asiáticas”, acrescenta.

A arquitectura do Seminário Católico da China ilustra esse processo. A igreja, erguida em 2000, é uma construção circular em tijolo vermelho e com um triplo telhado de telhas azuis. Uma espécie de miniatura da Sala da Oração pelas Boas Colheitas, um dos principais templos de Pequim.

Apenas os vitrais e uma discreta cruz no topo distinguem esta construção de um qualquer templo taoista; no interior, o altar, elevado por um degrau, é adornado com uma mesa tradicional chinesa de madeira. Um pequeno e discreto crucifixo é a única imagem religiosa aqui exposta. Mas há mais além do que se vê à superfície.

Descendo as escadas situadas por detrás do altar e um longo corredor chega-se à cave da igreja, onde, na quase total escuridão, se vislumbram vultos de crentes ajoelhados, em torno de uma imagem de cristo com mais de um metro, erguida por detrás de um altar de pedra.

Cruzes credo

Por toda a China, a falta de símbolos religiosos ocultará mesmo o ‘boom’ da fé cristã em curso na sociedade, diz Ian Johnson, jornalista radicado em Pequim há vinte anos e vencedor de um Prémio Pulitzer. “O Governo não gosta da face pública do cristianismo”, opina Johnson. “Não quer cruzes espalhadas pelo país”.

O sinólogo italiano Francesco Sisci, especialista nas relações entre Pequim e a Santa Sé, observa o mesmo fenómeno: “O Partido Comunista Chinês não quer que a religião fuja ao seu controlo”. Sisci diz, no entanto, que a liderança chinesa “reconhece a necessidade de religião na sociedade”, mas que se a Igreja católica quiser ser aceite deverá integrar-se na realidade local e “desprender-se de uma simbologia que é estranha à China”.

O especialista nas relações entre Pequim e a Santa Sé considera que a assinatura de um acordo entre a China e o Vaticano sobre a nomeação de bispos “não significa” que serão estabelecidos laços diplomáticos.

O acordo, que quebra mais de meio século de antagonismo entre Pequim e a igreja católica, “não significa necessariamente que o Vaticano vai cortar relações com Taiwan”, afirma à agência Lusa o sinólogo italiano, radicado na China há 20 anos.

A Santa Sé mantem, desde então, relações diplomáticas com a ilha de Taiwan, onde se refugiu o antigo Governo nacionalista chinês, após a instauração da República Popular, em 1949.

Num outro sinal de aproximação, a igreja católica e os comunistas chineses concordaram trocar várias obras de arte para a realização de duas exposições simultâneas, a partir deste mês, na Cidade Proibida de Pequim, e no Museu do Vaticano.

Sisci lembra, no entanto, que no que toca às relações diplomáticas, “a China está muito interessada em manter o ‘status quo’”. “Penso que a China não quer de todo antagonizar Taiwan neste momento”, nota Sisci, numa entrevista concedida na sua casa em Pequim, um dos raros ‘siheyuan’ – típicas residências chinesas construídas em torno de pátios espaçosos -, que não foi arrasado para dar lugar a construções em altura.

Formosa relação

“Pequim não sabe qual será a reacção caso hostilize Taiwan, que pode agir de impulso e declarar a independência”, acrescenta.

A China considera Taiwan parte do seu território, e não uma entidade política soberana, e ameaça usar a força caso Taipé declare independência. Pequim e Taipé concordam que existe uma só China, pelo que os países só podem manter relações diplomáticas com um dos Estados.

Na semana passada, independentistas taiwaneses lançaram uma campanha para a celebração de um referendo sobre a independência da ilha, em Abril de 2019, numa altura em que incursões de aviões militares chineses no espaço aéreo taiwanês se intensificam, levando analistas a considerarem como cada vez mais provável que a China invada Taiwan.

Em relação à assinatura do primeiro acordo entre China e Vaticano, o especialista em relações entre Pequim e a Santa Sé vê com bons olhos o marco que rompe com mais de meio século de antagonismo. “Estamos perto”, diz Sisci, numa entrevista à agência Lusa, na sua casa em Pequim, um dos raros ‘siheyuan’ – típicas residências chinesas construídas em torno de pátios espaçosos -, que não foi arrasado para dar lugar a construções em altura. “Acompanho isto há muitos anos. Muitas vezes tratou-se apenas de diálogo, mas nos últimos tempos gerou-se um ‘momentum'”, acrescenta.

A divisão esmoreceu nos anos 1980, quando o papa João Paulo II reconheceu 30 bispos designados pela igreja oficial chinesa. Em 2007, Bento XVI apelou a uma reconciliação entre a igreja clandestina e a oficial, mas em algumas áreas do país continuaram a existir divisões. Sisci, que está radicado na China desde 1988, mas que passou o último ano e meio entre Roma e a capital chinesa, garante agora que a questão da nomeação dos bispos está resolvida.

Exemplo vietnamita

“Existe já um acordo, no qual o Estado [chinês] e a igreja católica reconhecem os bispos”, diz Sisci, que há dois anos realizou a primeira entrevista ao papa Francisco exclusivamente sobre a China.

Vários observadores sugerem que o acordo poderá ser semelhante ao assinado em 1996 entre o Vaticano e o Vietname, país vizinho da China e também governado por comunistas. Neste caso, a Santa Sé propõe três bispos a Hanói, e o Governo vietnamita escolhe um deles.

Francesco Sisci considera o caso chinês “mais complicado”. “No Vietname, não existia a Associação Patriótica. E aqui, o grande obstáculo à normalização das relações tem sido o futuro da igreja oficial”, lembra.

O italiano nota ainda que o Partido Comunista do Vietname guarda boa memória da igreja católica: “Em muitos aspectos, os líderes [vietnamitas] não foram antagonizados pela igreja, alguns até estudaram em escolas católicas”, aponta. Já na China, existe “uma suspeição” face à igreja.

“Quando os comunistas tomaram o poder, em 1949, o núncio papal [representante diplomático permanente do Vaticano] ficou em Nanjing [a capital chinesa antes da revolução] e recusou-se a ir para Pequim”, lembra.

O Vaticano terá assim tomado partido pelo antigo Governo nacionalista chinês, que se refugiou então na ilha de Taiwan, onde se continua a identificar como governante de toda a China. “Existe esse ressentimento”, conclui Sisci.

Após mais de meio século de antagonismo, o Vaticano parece prestes a ceder, com a assinatura de um acordo no qual Pequim terá a última palavra na nomeação dos bispos.

O papa Francisco disse já que se dependesse dele “visitaria a China amanhã mesmo”. Para o seminarista Joseph, que sonha ir a Roma ver Francisco, que está prestes a completar cinco anos de eleição, isso seria o concretizar de um sonho. E quando se sugere que, talvez um dia, o papa venha mesmo a ser chinês, os seus olhos brilham e diz: “Nunca se sabe, o mundo dá muitas voltas”.

12 Mar 2018