Músico Pedro Abrunhosa exorciza angústias em “Espiritual”, o novo álbum

[dropcap]“E[/dropcap]spiritual”, o novo trabalho de Pedro Abrunhosa, é um disco com 15 canções, nas quais o músico exorciza angústias sobre vários assuntos, unidas pela “profundidade da palavra” e pelo som, “gravado à moda antiga”.

“A palavra é fundamental no registo da minha escrita de canções, na minha actividade de escritor de canções. Esta actividade é uma actividade de escrita, e, portanto, a palavra é primordial”, afirmou, em entrevista à Lusa, acrescentando que as letras “são o fio condutor” do disco, a ser editado na sexta-feira.

O conjunto de 15 canções, que escolheu de um total de 30 compostas ao longo dos últimos dois anos, “faz um bloco”, ao qual decidiu chamar “Espiritual” porque, “em tempo de frivolidades, de superficialidade”, a Arte “devolve esta profunda capacidade de contemplação, de usufruto, de estremecimento, de encantamento, de iluminação”.

O músico sublinha tratar-se de uma espiritualidade “que não é o monopólio das religiões, é uma espiritualidade que é obviamente humana, que é esta do transcendente que existe na Arte”. O que une este disco, o oitavo da carreira do músico, é “a profundidade da palavra” e a “organicidade do som”.

“Espiritual” foi produzido por João Bessa e Pedro Abrunhosa, no estúdio do segundo, e foi “gravado à moda antiga”, com os músicos, “às vezes dez ou doze, a gravar ao mesmo tempo, num espaço ‘armadilhado’ de microfones”.

O álbum inclui uma série de convidados, entre os quais seis cantores com quem Pedro Abrunhosa gravou outros tantos duetos: as portuguesas Ana Moura, com quem trabalha frequentemente, e Elisa Rodrigues, “uma emergente jovem que tem uma voz curiosíssima”, a francesa Carla Bruni, a norte-americana Lucinda Williams, a mexicana Lila Downs e o brasileiro Ney Matogrosso.

Lembrando a “grande ligação” que tem à música francesa e a sua “cultura luso-francesa, por questões de educação”, Pedro Abrunhosa partilhou que “Balada Descendente” “‘tem escrito’ Carla Bruni na sua génese”. “Quando começo a fazer a canção já estou a pensar na Carla Bruni”, contou.

O mesmo aconteceu com Lucinda Williams, embora “num outro universo, o universo norte-americano”. “Ela é uma das grandes resistentes do folk norte-americano, é uma das referências do [Bob] Dylan. Há um imaginário na Lucinda Williams que é absolutamente fundamental na minha música, que é o imaginário da planície norte-americana”, disse à Lusa.

Convidar a mexicana Lila Downs para com ele dar voz a “Amor entre muros”, escrita há dois anos “sobre os refugiados em geral”, foi uma “consequência natural”, já que a cantora “tem uma voz ativa neste assunto há muitos anos”, e “nada melhor para representar esta situação do que a situação corrente no México”.

Pedro Abrunhosa escreveu “Amor entre muros” a pensar nos movimentos dos migrantes, “pessoas que procuram Paz, procuram um chão onde educar os filhos, fogem da violência, procuram pão”.

“E esta questão é uma questão que infelizmente está a correr em paralelo com o populismo. Quanto mais nacionalismo, que é uma deturpação do patriotismo, mais as tribos se fecham. É um retrocesso civilizacional e os muros acontecem, de arame farpado, ou de tijolo, ou em ferro, em todo o mundo”, considerou.

A questão dos migrantes e dos refugiados é também abordada pelo músico em “Porque é que não fui eu”, tema no qual Ney Matogrosso “faz a voz de Deus”.

“É uma canção duríssima dedicada àquela criança [o sírio Alan Kurdi, de três anos] daquela imagem terrível que todos nós vimos da morte na praia [na Turquia, em 2015]”, contou à Lusa.

A letra da canção “é um diálogo entre Deus e uma criança”, e Abrunhosa achou “que a voz do Ney poderia simbolizar esse Deus em todos os seus aspetos, quer espirituais quer humanos”.

“São coisas que me marcam de tal maneira que eu, em vez de ir ao psiquiatra, sento-me ao piano e expulso de mim e partilho com os outros. É uma necessidade de exorcizar a minha própria angústia sobre um problema”, partilhou.

O mesmo aconteceu com “Dizes que gostas de mim”, sobre “uma realidade nefasta”, a da violência doméstica, e com “Meu querido filho, tão tarde que é”, que o músico escreveu depois dos grandes incêndios que assolaram Portugal no ano passado.

“É uma mãe que está a pensar ‘meu querido filho, que tarde que é’, ele não volta, e é uma expressão demasiadamente poética para passar ao meu lado. Eu sei que a criei, mas se eu a criei ela vai ter de encontrar o seu caminho para se afirmar num disco que conta histórias”, disse à Lusa.

O que o move a escrever estas e outras canções “não é uma consequência política, é uma consequência ética”. “Eu perante a minha consciência, não no sentido de um pensar na consequência que vai ter, mas naquilo que eu acho que é o bem”, afirmou.

O que o leva a essas letras são “ímpetos criativos”, “uma necessidade de expulsar a dor”, os mesmos que o levaram a escrever sobre Gisberta, a transexual brasileira assassinada no Porto em 2006, ou sobre o ‘Senhor do Adeus’, “uma personagem poética de Lisboa, que exemplificava de alguma forma a poesia possível na banalidade urbana” (em “Contramão”, de 2013).

Apesar de considerar que, “se calhar ninguém vai olhar para trás, daqui a cem anos, e querer perceber o que se passava em Portugal no meio artístico”, quando o mundo “viveu aquele momento de ‘multi-ditadores’, entre o norte-americano, o coreano e o russo e o turco”, Pedro Abrunhosa, cujo primeiro álbum, “Viagens” data de 1994, gostava de, “se olharem”, não ser visto como “uma voz silenciosa”.

Pedro Abrunhosa esteve recentemente em Macau onde deu um concerto no Centro Cultural de Macau, por ocasião das celebrações do dia 10 de Junho.

27 Nov 2018

Pedro Abrunhosa e António-Pedro Vasconcelos cabeças de cartaz no mês de Portugal

O cantor e o cineasta portugueses são os principais destaques da iniciativa Junho, mês de Portugal, que se celebra pelo terceiro ano consecutivo. Ao longo de 25 eventos, vão ser 35 os artistas a participar na iniciativa

 

O músico Pedro Abrunhosa e o cineasta António-Pedro Vasconcelos vão ser as figuras de destaque do grande público e vão estar presentes em Macau, durante o mês de Portugal. O programa dos 25 eventos que constituem a iniciativa organizada pelo Consulado de Portugal na RAEM, Casa de Portugal, Fundação Oriente e Instituto Português do Oriente (IPOR) foi apresentado ontem.

“Vai ser um concerto memorável e acredito que vai encher por completo a sala [Grande Auditório do Centro Cultural de Macau]”, disse Vítor Sereno, Cônsul-Geral de Portugal em Macau e Hong Kong, na cerimónia de apresentação, que decorreu no consulado.

“Em relação à nossa escolha de Pedro Abrunhosa, confesso que sou fã. Gostei muito da vinda dele há uns anos, quando foi convidado pelo Instituto Politécnico de Macau e pelo Dr. Carlos André”, acrescentou.

O concerto vai ter lugar a 8 de Junho, pelas 20h, no Grande Auditório do Centro Cultural de Macau. A entrada é livre e as pessoas podem começar a pedir os bilhetes a partir de 23 de Maio.

“Corremos durante estes anos os grandes nomes da música portuguesa, trouxemos gente consagrada e já, por várias vezes, tínhamos tido a sugestão e o empenho de algumas pessoas para que se trouxesse o Pedro Abrunhosa”, disse, por sua vez, Amélia António, presidente da Casa de Portugal.

“Achámos que tinha chegado o momento de satisfazer uma parte da comunidade que é fã do Pedro Abrunhosa. Todos os fãs vão ficar muito satisfeitos por, finalmente, se fazer um concerto com ele”, frisou.

Por sua vez, o realizador António-Pedro Vasconcelos vai estar em Macau a 7 de Junho, no Café Oriente do IPOR, para uma conferência. Além disso, o cineasta vai estar presente em três mostras de filmes que realizou, nomeadamente a película “Jaime”, a 7 de Junho pelas 20h30, os “Gatos Não Têm Vertigens”, a 11 de Junho pelas 18h45, e “Os Imortais”, a 12 de Junho pelas 18h30. Todas as mostras vão decorrer no Auditório Dr. Stanley Ho e no final António-Pedro Vasconcelos vai comentar os filmes.

 

25 eventos

Junho, o mês de Portugal, vai ser celebrado com um total de 25 eventos, em mais de 10 espaços cultural e institucionais, em que vão participar 35 artistas. Entre os eventos, ao nível da música, vai ainda decorrer, a 2 de Junho, o concerto “Era Uma Vez a Cantar em Português”, virado para as famílias, e, no Dia 29, o espectáculo Fados de Coimbra, no Teatro D. Pedro V, às 20h.

Ao nível das exposições, a arquitecta e artista Ana Aragão vai ter os seus trabalhos em exibição na Casa Garden, a partir de 14 de Junho, pelas 18h30. A artista também vai estar presente no território. Também o Consulado vai ter uma exposição com fotografias em que todos os membros da comunidades podem participar. Como tal, devem enviar fotografias sobre elementos em Macau que remetam para Portugal. Esta exposição abre no dia 5 de Junho na Galeria da Residência Consular.

“Ao valorizarmos estas expressões de matriz portuguesa, nestes 25 eventos, estamos obviamente a elevar o nome de Portugal e da comunidade portuguesa que reside aqui a outra patamar”, considerou Vítor Sereno.

Todos os eventos são grátis, no entanto, alguns devido à capacidade dos locais onde se realizam exigem o levantamentos de bilhetes, que poderá ser feitos junto da Casa de Portugal.

 

Roteiro Camilo Pessanha em Macau

Apesar de ainda não haver confirmação sobre a data e os pormenores, a organização quer que o mês de Portugal fique igualmente marcado pelo início do Roteiro Camilo Pessanha em Macau, organizado pelo IPOR em conjunto com a Direcção de Serviços de Turismo. Este será um roteiro sobre a presença do escritor em Macau, com passagens pelos locais mais icónicos da relação de Pessanha com o território, que vai estar disponível em português, chinês e inglês. Este será um projecto que se prolongará no tempo e que visa ser mais uma oferta cultural para o turismo no território.

18 Mai 2018