Prémio Man Booker atribuído a “Milkman” da escritora Anna Burns

[dropcap]O[/dropcap] livro “Milkman”, da escritora irlandesa Anna Burns, venceu o Prémio Man Booker, anunciou a organização numa cerimónia em Londres.

Os seis livros finalistas do galardão eram “Washington Black”, de Esi Edugyan, “The Overstory”, de Richard Powers, “Milkman”, de Anna Burns, “The Long Take”, de Robin Robertson, “Everything Under”, de Daisy Johnson, e “The Mars Room”, de Rachel Kushner.

“Milkman”, publicado pela Faber & Faber, é a terceira novela desta autora de 55 anos, nascida em Belfast, na Irlanda do Norte, e tem recebido críticas entusiásticas por parte da maioria das publicações literárias na Grã-Bretanha. Narra a história dos encontros entre uma adolescente e um homem casado que tem a reputação de seduzir jovens, e que é membro de uma organização paramilitar.

O prémio Man Booker, no valor de 50 mil libras (mais de 56 mil euros), distingue anualmente um livro de ficção escrito em inglês e publicado no Reino Unido no ano do galardão, independentemente da nacionalidade do autor. Anna Burns é a 17.ª mulher a vencer este prémio e o primeiro autor da Irlanda do Norte a conquistá-lo.

Durante a cerimónia da entrega, a autora, num discurso breve e muito emocionado, agradeceu ao júri, aos editores dos seus livros, por terem acreditado no seu trabalho, e aos amigos e família que a apoiaram.

O presidente do júri, Kwame Anthony Appiah, disse: “Nenhum de nós leu algo assim antes. A voz altamente distintiva de Anna Burns desafia o pensamento e a forma convencionais, numa prosa surpreendente e imersiva”.

“É uma história de brutalidade, invasão sexual e resistência, envolvida em humor mordaz. Decorre numa sociedade dividida em si própria, explorando as formas insidiosas de opressão que podem surgir na vida quotidiana”, acrescentou.

Em 2017, o Prémio Man Booker foi atribuído ao norte-americano George Saunders, com o romance “Lincoln no Bardo” (“Lincoln in the Bardo”), publicado em Portugal pela Relógio d’Água.

De acordo com a organização, as vendas das obras premiadas sobem significativamente logo nas semanas após o anúncio do galardão, como aconteceu com a obra de Saunders, cujas vendas aumentaram 1.227%.

O presidente do júri responsável pela escolha das obras tinha considerado, quando foram anunciados os seus finalistas, que cada um daqueles títulos de ficção eram “um milagre da invenção estilística, em que a linguagem ocupa o centro do palco”.

A lista, que apresentava quatro mulheres e dois homens, abrangia uma ampla gama de assuntos, desde um escravo de 11 anos que escapou de uma plantação de açúcar em Barbados, até a um veterano do Dia D que vive com transtorno de stress pós-traumático, passando por uma mulher condenada a prisão perpétua, que é obrigada a deixar um filho pequeno.

Este é o quinto ano em que o Prémio Man Booker está aberto a escritores de qualquer nacionalidade que escrevam em inglês e publiquem no Reino Unido e na Irlanda.

A lista curta deste ano distinguia como finalistas três escritores do Reino Unido, dois dos Estados Unidos da América e um do Canadá.

Além de Rachel Kushner, que tem ainda publicados em Portugal, também na Relógio d’Água, “Os lança-chamas” e “Telex de Cuba”, outros dois autores nomeados têm obras traduzidas para português.

A canadiana Esi Edugyan está publicada em Portugal pela D. Quixote, através do seu livro finalista do Prémio Man Booker 2011, “Um blues mestiço”, e o norte-americano Richard Powers, com “O eco da memória”, vencedor do National Book Award e finalista do Prémio Pulitzer, em 2006.

17 Out 2018

Man Booker Prize | Paul Auster, Ali Smith e George Saunders entre os finalistas

Os escritores Paul Auster, Emily Fridlund, Mohsin Hamid, Fiona Mozley, George Saunders e Ali Smith são os seis finalistas do Prémio Man Booker. No próximo mês, é distinguida a melhor obra de ficção do ano escrita em língua inglesa

[dropcap style≠’circle’]O[/dropcap] anúncio foi feito ontem e a lista inclui “4 3 2 1”, de Paul Auster (ver texto nestas páginas), “History of Wolves”, de Emily Fridlund, “Exit West”, de Mohsin Hamid, “Elmet”, de Fiona Mozley, “Lincoln no Bardo”, de George Saunders, e “Outono”, de Ali Smith. Entre as obras finalistas, estão publicados em Portugal os livros de Paul Auster, Ali Smith e George Saunders.

Nesta edição do Man Booker prize, ficaram para trás “Days Without End”, de Sebastian Barry, “Solar Bones”, de Mike McCormack, “Reservoir 13”, de Jon McGregor, “O Ministério da Felicidade Suprema”, de Arundhati Roy, “Home Fire”, de Kamila Shamsie, “Swing Time”, de Zadie Smith, e “A Estrada Subterrânea”, por Colson Whitehead.

O júri do prémio Man Booker deste ano é presidido por Lola Young, antiga professora de Estudos Culturais da Universidade de Middlesex e responsável cultural da Autoridade da Grande Londres.

Entre os membros do júri encontram-se ainda as escritoras Lila Azam Zanganeh e Sarah Hall, bem como o artista Tom Phillips e o presidente da Real Sociedade Literária britânica, Colin Thubron.

Os membros do júri consideraram que os romances, cada um à sua maneira, desafiam e alteram suavemente os preconceitos – sobre a natureza do amor, sobre a experiência do tempo, sobre questões de identidade e até mesmo a morte.

A lista dos finalistas, que apresenta três mulheres e três homens, abrange uma ampla gama de assuntos, desde a luta de uma família que tenta manter a sua auto-suficiência na Inglaterra rural, até uma história de amor entre dois refugiados que tentam fugir de uma cidade sem nome, na agonia de guerra civil.

No quarto ano em que o prémio foi aberto a escritores de qualquer nacionalidade, a lista é composta por dois escritores britânicos, um britânico-paquistanês e três americanos.

Livros do desafio

“Com seis livros únicos e audazes que colectivamente pressionam as fronteiras da convenção, a lista curta deste ano reconhece autores estabelecidos e introduz novas vozes na cena literária. Jocosos, sinceros, inquietantes, ferozes: aqui está um conjunto de romances de tradição, mas também radicais e contemporâneos. O alcance emocional, cultural, político e intelectual destes livros é notável, e as formas como desafiam o nosso pensamento são um testemunho do poder da literatura”, considerou Lola Young.

Ali Smith faz parte da lista do Booker pela quarta vez, enquanto Fiona Mozley figura como a mais jovem autora da lista, com 29 anos, e uma das duas estreantes na corrida ao prémio, juntamente como Emily Fridlund, de 38 anos.

Os outros dois autores americanos são Paul Auster e George Saunders, o primeiro, de 70 anos, com o romance mais longo da lista, que lhe levou três anos e meio, trabalhando seis dias e meio por semana, a ser escrito, enquanto George Saunders, contista, se estreia com o seu primeiro romance.

O prémio Man Booker, no valor de 50 mil libras, distingue anualmente um livro de ficção escrito em inglês e publicado no Reino Unido no ano do galardão, independentemente da nacionalidade do autor. O vencedor vai ser anunciado no dia 17 de Outubro.

Em 2016, o Prémio Man Booker foi atribuído ao norte-americano Paul Beatty, com o romance “O Vendido” (“The Sellout”).

 

Quatro caminhos para um só homem no novo livro de Auster

O autor Paul Auster afirmou que a sua obra mais recente, “4 3 2 1”, resulta da combinação de circunstâncias inesperadas com o material genético, pré-existente, que compõe todos os seres humanos.

Paul Auster considerou, num encontro com jornalistas no âmbito do Festival Internacional de Cultura, que o romance procura responder à pergunta “E se…?”, delineando quatro caminhos distintos para um mesmo personagem, Archie Ferguson: “Em inglês há o termo ‘nature nurture’, que surge [da combinação] do ser natural e genético, com a maneira como se é educado ou o ambiente em que se cresce”, realidades que “estão interligadas e são impossíveis de separar”.

Este foi o mote fornecido pelo escritor norte-americano, de 70 anos, para abordar as questões feitas acerca do processo de escrita do romance, precedido por um hiato de sete anos, em que “a frequência com que algo inesperado acontece” foi, à semelhança de outras das suas obras, o dilema “que sempre o preocupou”.

Na opinião de Auster, o princípio de que diferentes circunstâncias conduzem, necessariamente, a pessoas de personalidades distintas, revela a importância de “dar espaço ao inesperado para viver a vida com algum tipo de coerência”. Como tal, aquilo a que gosta de chamar “os mecanismos da realidade” difere das crenças “no destino, na fé e na intervenção divina”, concepções nas quais o romancista recusa acreditar.

Ao escrever “4 3 2 1”, nomeado como candidato ao prémio Booker deste ano, Auster quer provar que “o estranho faz parte da normalidade” e que, no papel de arquitecto das suas narrativas, este “não manipula as personagens”, optando por “lhes dar vida” para depois “as seguir, sem as guiar” a um caminho concreto.

No decorrer da conversa, Auster frisou que “não escolheu tornar-se um escritor”, sendo que foi a profissão que o escolheu a ele: “Não se trata de uma opção. (…) Ser um artista de qualquer tipo é como apanhar uma doença da qual nunca se recupera. [Ser escritor] é uma obrigação.”

Na óptica de Auster, “o papel [social] da escrita mantém-se o mesmo há 500 anos”, algo que se complementa com o processo de leitura, “uma experiência muito íntima” que se faz individualmente. Posteriormente, ressalva que ler histórias “é uma forma excelente de confrontar medos ou ansiedades em relação ao mundo, de modo seguro”.

 

Auster avisa que Donald Trump está “apenas no início”

O escritor Paul Auster afirmou, de passagem por Portugal, que o mundo “entrou numa nova era” com o Presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, mas que “ainda não é possível fazer arte” baseada no Governo que este constituiu.

Num encontro com jornalistas, no âmbito do Festival Internacional de Cultura com o propósito de debater os temas suscitados pela sua nova obra, “4 3 2 1”, Auster debruçou-se sobre o panorama político do seu país de origem, voltando a tecer críticas a Trump, uma figura que classifica como um indivíduo “furioso, irracional, instável e narcisista: um perigo que se alimenta da atenção” que o mundo lhe dá.

O autor afirmou que Trump “está apenas no início”, o que impede reflexões artísticas exactas. Na óptica do escritor, primeiro cabe “aos jornalistas apurarem a verdade de tudo o que se passa agora”, partindo do princípio que o “bom jornalismo” é o “trabalho mais importante para o bem-estar do mundo”.

Auster adianta que a mesma profissão está “sob ataque”, colocando em risco “a fé das pessoas na verdade”, numa fase em que nunca os jornalistas foram tão necessários, numa discussão dentro do contexto da narrativa quadripartida do romance mais recente, em que uma das quatro versões do protagonista, Archie Ferguson, toma a decisão de enveredar pelo universo jornalístico.

O escritor, vencedor de múltiplos prémios literários, receia que Trump continue “a persuadir as pessoas de que as mentiras [que conta sejam] verdade”, já que o 45.º Chefe de Estado norte-americano utiliza “as mesmas tácticas que os Nazis nos anos 1930 e 1940”, tornando-se “uma pessoa perigosa para governar o país mais poderoso do mundo”.

Um país à parte

Apesar de todos os tumultos sociais que acontecem, diariamente, Auster insiste que a inspiração para as narrativas de ficção não parte do mundo exterior, mas antes “do inconsciente”, que depois se mistura com os factores sociais “de um país construído por imigrantes”, no qual Nova Iorque funciona como um antídoto contra a crescente divisão visível nos Estados Unidos.

“Nova Iorque é encarada como a cidade representante do ideal norte-americano, [sendo que] 40 por cento dos seus habitantes nasceram noutros países [mas], às vezes, acho que a cidade devia abandonar os Estados Unidos e transformar-se num estado separado, porque o resto do país não percebe [o que o local simboliza]”, disse.

Questionado mais directamente quanto às falhas do Partido Democrata, de acordo com Auster “tudo se alinhou perfeitamente” a favor do magnata, reduzindo as hipóteses de Hillary Clinton, que perdeu votos devido “a um país misógino”.

O romancista “queria que Hillary percorresse o país da mesma forma que Martin Luther King [aquando do Movimento dos Direitos Cívicos]”, contrastando com o método de Trump, ao escolher “incitar o pior da natureza humana”, com “30 a 35 por cento do país a adorar aquilo que ele faz”. Estas são as razões que levam Paul Auster a concluir que “uma grande percentagem do eleitorado americano jamais votaria” em Hillary Clinton.

Portugal foi o sétimo país europeu por que passou, no espaço de um mês, para promover “4 3 2 1”, algo que levou o autor a verificar que as mudanças e a “nova era” de que fala se tratam de “um fenómeno global” que coloca a Europa e os Estados Unidos em posições similares, seja devido aos resultados do Brexit [referendo que determinou a saída do Reino Unido da União Europeia], ou devido à vitória de Donald Trump.

14 Set 2017