Dupla de criativos publicou “O Pequeno Livro Amarelo” com frases de Xi

Uma dupla de criativos publicou um livro com centenas de frases do Presidente Xi Jinping. Conhecer melhor a forma como pensa o actual líder chinês foi a intenção criativa e – “algo absurda” – de Julie O’yand e Fernando Eloy

 

[dropcap]H[/dropcap]á um pequeno livro amarelo, à venda na internet, que reúne 300 citações do Presidente da República Popular da China, Xi Jinping, proferidas ao longo do seu mandato, iniciado em 2013. É uma obra de reflexão, entretenimento e alguma subversão, num estilo de leitura simples e atractivo, assinado pela jornalista e argumentista chinesa Julie O’yang e pelo jornalista e documentarista português Fernando Eloy.

“The Little Yellow Book” foi lançado em Fevereiro de 2019, por altura das comemorações do Ano Novo Chinês, quase um ano após o Congresso Nacional aprovar, com 2958 votos a favor, a deliberação de remover a limitação do termo de mandato presidencial, em Março de 2018, que antes era de dez anos no total. O actual líder, no final do seu primeiro mandato de cinco anos, passou a ter o poder de conduzir, por tempo indefinido, os destinos da grande China.

“A ideia de fazer este livro começou quando Xi Jinping tomou a decisão de retirar o limite ao termo da sua presidência, podendo permanecer para a vida no lugar. Esse foi para nós um momento de viragem e tivemos vontade de questionar pessoalmente o Presidente da China. Isso tornou-se um livro”, revelaram os autores ao HM.

A pergunta que Julie O’yang e Fernando Eloy quiseram colocar foi, antes de mais, quais as ideias essenciais que o Presidente Xi tinha para o desenvolvimento da nação. Qual o seu sonho para fazer o país avançar. Foi assim que começaram a coligir as suas frases e aforismos, para uma análise e divulgação dos princípios defendidos por Xi Jinping, à semelhança de um certo livro vermelho de propaganda, escrito por Mao Tse Tung em meados do século XX.

“O “Pequeno Livro Amarelo” espelha o seu famoso antecessor e segue o mesmo formato, com o mesmo padrão de narrativa. O “Pequeno Livro Vermelho” é o livro com mais tiragens no mundo, depois da Bíblia, sendo uma obra de propaganda que se tornou num ícone da China. O nosso não é um trabalho de propaganda, mas uma aproximação ao tradicional gosto chinês de coligir citações de sábios anciãos, incluindo o Confúcio e o ex-líder Mao. Sentimos que isso irá acontecer, mais cedo ou mais tarde, com os pensamentos de Xi. E quisemos abordar todas as suas considerações sobre a China”, afirmaram.

Integridade e ironia

A publicação, assumidamente uma “proposta de arte política, com um ângulo de certo modo absurdo”, foi um processo criativo de “comunicação com base na honestidade”, que pretende “convidar os leitores a questionarem” o que se está a passar no mundo. “O Presidente Donald Trump prometeu atacar este país sobre o qual poucas certezas se têm. E, enquanto isso, o domínio da China sobre o futuro global das nações tem estado em grande evidência, com a democracia ocidental em processo de autofagia a corroer-se por dentro”.

“A ambição do Partido Comunista Chinês tem sabido explorar bem o espectáculo desta crise política auto-infligida. E neste contexto actual globalizado, existe naturalmente ironia. A relevância e a integridade são coisas que nos interessam”, comentaram O’yang e Eloy, que dedicam este livro a “todos os leigos que têm curiosidade em saber algo mais sobre a China contemporânea. Sentimos que esta leitura devia ser uma espécie de viagem rápida e abrangente”.

Nesta versão não censurada, e não autorizada pelo próprio, os autores organizam as declarações de Xi Jinping em 23 capítulos sobre diversos temas pertinentes, como o “Sonho Chinês”, “Partido Comunista”, “Confucionismo”, “Meu País, Meu Povo”, “Um País, Dois Sistemas”, “Lei e Virtude”, “Liberdade de Expressão e Direitos Humanos”, “Corrupção e Disciplina”, “Internet e Dados”, “Media”, as “Relações Internacionais”, a “Guerra Comercial”, “Uma Faixa, Uma Rota”, e até a “Revolução da Casa de Banho” em que o Governo “tudo fará para solucionar os problemas que afectam a qualidade de vida das massas”, entre tantos outros temas, estando reservado um capítulo extra para considerações finais e um poema do grande Xi.

“Like” para os autores

A curadoria das frases do livro é da responsabilidade de O’yang, com edição e design de Eloy. Julie O’yang é uma ex-capitã do Exército de Libertação Chinês que se tornou autora, artista, empresária e argumentista, tendo procurado exílio na Europa durante os anos 1990, onde trabalha e reside, desenvolvendo projectos como jornalista e criadora de conteúdos de rádio e televisão na Holanda e Dinamarca. Fernando Eloy nasceu em Lisboa e iniciou a sua carreira profissional como jornalista e DJ nas rádios pirata dos anos 1980, tornando-se produtor de eventos e jornalista free-lancer para vários órgãos de comunicação. Veio para Macau em 2001, onde tem realizado documentários, produzido filmes promocionais e criado conteúdos para canais e aplicações online. Ambos foram colunistas do jornal Hoje Macau.

O livro tem 180 páginas e encontra-se à venda na Internet, em diversos formatos electrónicos, para Kindle, Kobo, iBooks e Google Play, por cerca de 8 dólares americanos, ou quase 65 patacas. “Quem no mundo não ama um bom líder?” é uma das frases proferidas pelo homem que “gostaria de pressionar o botão do “Like” a favor do grandioso povo chinês”. Há outras 298 para conhecer.

4 Jul 2019

Memórias de Alecrim

[dropcap style≠’circle’]A[/dropcap]lecrim não era um amigo íntimo, nem um amigo, longe disso. Terei trocado meia dúzia de frases com ele nesta década e meia que levo de Macau. Mas era impossível viver aqui todo este tempo e não saber quem era o Alecrim.
As suas histórias esvoaçaram sempre de ouvido em ouvido, exportadas de boca em boca, com a mesma ligeireza e alegria com que ele as contaria. Das mais libidinosas às mais heróicas, as histórias do Alecrim ecoam imagens de um passado que nos permitem ver para além deste mar de vidro e luz em que navegamos, sentar-nos nos recantos mais esquecidos da cidade, onde todos os passados ainda são possíveis, e tentar compreendê-la, senti-la, ficar mais próximo, desta urbe milenar que a tantos parece tão pouca coisa.
Alecrim era embaixador de um tempo (o passado parece sempre romântico porque, no fundo, a nossa dificuldade de relação é com o presente – o passado era bom e o futuro vai ser uma maravilha), uma verdadeira janela para um passado que nos permite ver esta cidade para além da mera percepção, esta terra que tanto acolhe como repela.
Alecrim era daquelas personagens maiores do que a vida, motivo de inspiração para qualquer romancista que se preze, como o era, também e por exemplo, o Padre Manuel Teixeira que ainda consegui ver no seu calcorrear diário da ponte Nobre de Carvalho.
São personagens com história e com histórias. Personagens que quando calhamos estar no mesmo espaço do que elas sabemos estar na presença de alguém fora do normal. São personagens como estas que encarnam a verdadeira dimensão desta terra que vai muito para além dos seus 28 kms, ou 29, ou 30, ou…
Alecrim era um símbolo de uma geração que viu o mundo transformar-se de uma forma inaudita. Da independência de Goa à invenção do iPhone 6, para ser mais prático. Os nossos filhos, seguramente, verão transformações superiores em menor espaço de tempo, mas o mundo de Alecrim não fica a dever ao deles em nada.
Para além de ofuscar as luzes, o Alecrim permitia-nos ver, e perceber, porque tantos estrangeiros escolheram Macau como casa ou abrigo de longa duração. “Porque às Costas do Sul da China arribam apenas loucos e aventureiros?”, interrogava-se um historiador chinês num qualquer livro que li algures. Alecrim caberia, provavelmente, na definição daquele historiador, como muitos de nós que para aqui andamos, imagino.
Alecrim era ainda um símbolo desses que, demandados para além de São Vicente, não mais voltaram encontrando “casa” num local tão improvável como Macau, sugerindo-nos interrogações muito pessoais sobre esse deixar, sobre esse permanecer.
Alecrim dedicou a vida a Macau, provavelmente porque a colecção de memórias que aqui congregou terá sido tão incomensurável que não mais poderiam ser deixadas. As memórias são a última energia que nos restará quando nada mais houver que nos sustenha. Fazer memórias é, por isso, mais do que uma necessidade, uma obrigação para connosco próprios se ambicionamos a uma velhice decente. Alecrim é um excelente lembrete dessa necessidade.
Porque se a memória de Alecrim é indissociável das suas memórias, a sua debanda deste mundo é uma oportunidade para reflectirmos na nossa própria fábrica de memórias e perceber se está a funcionar em pleno, se estamos de facto a extrair o máximo desta nossa vivência por estas bandas (que a nossa cultura crê exóticas) tal como Alecrim o fez.
Não desejo paz eterna ao Alecrim mas sim vivacidade eterna. Como desejo para mim, e para si caro(a) leitor(a).

Música da Semana

“Saviour Machine” (David Bowie, 1970)
“I need you flying, and I’ll show that dying
Is living beyond reason, sacred dimension of time
I perceive every sign, I can steal every mind”

6 Out 2016

Subtropical (episódio IV)

(final do episódio passado: “Talvez aguentasse mais um mês a andar, talvez mais, até aguentaria três se fosse poupadinho e soubesse preservar as energias.
“Para trás mija a burra” dizia-lhe a mãe tantas vezes quando ele era criança. Sorriu com a lembrança e teve a certeza que ainda não era altura para desistir. Para além disso, o Outono estava para chegar e previam-se dias bons para caminhar”)

[dropcap style≠’circle’]J[/dropcap]acinto caminhava há mais de uma semana. Talvez duas. Não tinha bem a certeza. O tempo ajudava mas para além disso nada mais contribuía para a sua esperança.
Pouco faltava para o dia acabar e Jacinto resolveu procurar o abrigo de uma árvore parecida com tantas outras junto às quais tinha pernoitado em noites que já eram incontáveis. Os três que ainda lhe restavam há umas semanas atrás estavam agora reduzidos a apenas um o que não contribuía em nada para lhe animar o espírito.
O desfiladeiro, esse, ali continuava como se não tivesse fim, largo e intransponível como sempre.
Do outro lado, o lado onde julgava morar o seu destino sonhado e que um dia quase jurava ter visto antes da tempestade desabar, nunca mais tinha surgido no horizonte. Tal facto levava Jacinto a pensar que talvez tivesse sido uma ilusão. Ele quase podia jurar que o destino escondia-se para lá do desfiladeiro, mas provavelmente não tão perto como um dia lhe pareceu. Talvez o desfiladeiro fosse curvo e, ao acompanhá-lo, ele estivesse a afastar-se.
As dúvidas sucediam-se, mas ele conforme podia lá as ia afastando para salvaguarda da sua própria sanidade. O mais estranho de tudo era não se lembrar da última vez que tinha encontrado alguém no caminho, como se estivesse para lá do fim do mundo num qualquer limbo da mente onde apenas ele e a sua obsessão viviam.
Jacinto sonhava com o mar. Tinha saudades do sal e do ruído, da inconstância e da violência do fantástico reino de Neptuno, dos buracos nas rochas prenhes de vida, dos crustáceos deliciosos e das caminhadas que em criança fazia com o pai, praia fora, a sonhar com viagens para além mar, escutando atentamente as fantásticas histórias de piratas que ele lhe contava em tão vívidos detalhes que faziam a sua alma de criança vogar bem para além do seu corpo finito, bem para além das estrelas, numa sensação de possibilidades infinitas.
Jacinto amava o mar e adorava barcos pois achava que água levava sempre a sítios fascinantes. “Desde que houvesse vento a favor”, pensou, pois neste momento sentia-se como um marinheiro, sim, mas ilhado no mar alto após semanas de acalmia e com as reservas de água doce a extinguirem-se perigosamente. Esse pensamento fê-lo estremecer, ou talvez fosse a mão que o abanava do seu torpor onírico avidamente alimentado pela ansiedade, pela fraqueza, pela falta de contacto humano, pelas dúvidas que teimosamente voltavam apesar de ele as afastar à varejada sempre que podia.
Jacinto abriu os olhos para ver a cara de um homem fortemente tisnado pelo sol, a olhar para ele. Vestia trajes demasiado sofisticados para aquelas paragens, ou talvez fosse a comparação com os seus andrajos que lhe suscitaram a ideia. O homem olhava para ele de uma forma que Jacinto se recorda de parecer estranha, com uma atitude de quem o conhecia muito bem apesar de ele ser capaz de jurar nunca na vida o ter visto.
A sensação aumentou quando o homem o chamou pelo nome. Queria saber que andava ele fazer por ali. Jacinto focou-se mais no estranho. As palavras teimavam em não lhe saltar da garganta talvez por espanto, talvez por não falar haver muitos dias, talvez por ter perdido o treino, talvez por medo.
Conforme o fixava, mudo, Jacinto lembrou-se, sem saber muito bem porquê, de um Rei Mago. Talvez fossem as vestes, talvez o porte, ou talvez a fosse a sua própria necessidade de se sentir menino, de se sentir acompanhado, ajudado. Analisando melhor, cedo percebeu que, a ser um Rei Mago, não era daqueles bonzinhos dos contos de Natal. Este apresentava um certo ar feroz, apesar do sorriso que lhe montava a expressão. Eram os olhos, aqueles olhos penetrantes que o fitavam, onde Jacinto pareceu notar uma certa inclemência e que o mantinham em estado de alerta.
“Mas como diabo sabe ele o meu nome?” Essa questão que abafava todas as outras. Passado uns momentos que pareceram eternos, Jacinto conseguiu finalmente mexer as cordas vocais interrogando o estranho mas não obtendo mais do que o acentuar daquele misterioso sorriso. Os olhos dele, todavia, pareceram acalmar. “Vê-se que precisas de ajuda”, disse-lhe o estranho e, simultaneamente, abriu o saco que trazia a tiracolo e de lá tirou dois. “É o que tenho comigo e dou-te”.
Jacinto não queria acreditar no que lhe estava a acontecer. Quem diabo seria aquele estranho que lhe estendia a mão daquela forma? Apesar de necessitado recusou a oferta, sabendo bem que quando a esmola é grande algo não bate certo mas o estranho insistiu de uma forma que acabou por se tornar irrecusável, sabendo Jacinto o que aqueles dois extra poderiam significar para a continuação da sua odisseia.
Talvez tenha verbalizado o pensamento, talvez não, mas o estrangeiro respondeu-lhe dizendo-lhe que o fazia por saber que ele precisava e não esperava nada em troca, pelo menos não para já. “Há algo em ti que me obriga a fazer isto”, disse-lhe, perguntando-lhe se era ou não verdade que ele corria atrás do sonho. Jacinto, pasmado, não sabia muito bem que dizer, ou fazer, acabou por assentir e o estranho lá o foi confortando garantindo-lhe que de onde aqueles dois vieram mais viriam. Jacinto continuava desconfiado tentando perceber as razões do outro. “Queres saber de onde me vem a riqueza?”, perguntou-lhe o estranho.
Jacinto assentiu com um menear de cabeça e o estranho respondeu-lhe sem rodeios: “Engano os incautos. Sou o que normalmente se chama um vigarista. A cupidez dos outros é o meu filão. É aí que me abasteço, é disso que vivo e vivo bem porque o mundo está cheio de gente assim.”
Jacinto estava embasbacado com tanta franqueza. Quis saber mais porquês, que tinha ele para merecer tamanha generosidade de um estranho. “Ainda tens, sonhos” disse-lhe o estranho, “algo que há muito perdi e vejo em ti aquele que um dia me vai ajudar a voltar mim. Porque já percebi que não é a cupidez que te move e isso é raro. Eu sei que procuras a passagem para o outro lado deste desfiladeiro. Não sei se ela existe mas se não existir eu vou ajudar-te a construir a ponte. Voltaremos a encontrar-nos no caminho.”
Jacinto acordou estremunhado, a noite ia alta e do estranho nem sinal. Interrogava-se se teria sonhado ou se algo teria mesmo acontecido. Acometido por um terror instantâneo, apalpou-se para perceber se estava inteiro mas nada de errado encontrou. Foi quando se lembrou de abrir a sacola, e eles ali estavam. Mais dois do que tinha no princípio daquele estranho dia.

MÚSICA DA SEMANA

“Space Oddity” (David Bowie, 1969)

“This is Ground Control 
to Major Tom
You’ve really made the grade
And the papers want to know whose shirts you wear
Now it’s time to leave the capsule 
if you dare

This is Major Tom to Ground Control
I’m stepping through the door
And I’m floating 
in a most peculiar way
And the stars look very different today”

21 Set 2016

Campeões Europeus da terra queimada

[dropcap style≠’circle’]F[/dropcap]alava eu com a família em Portugal quando sou questionado sobre a minha opinião do andar da carruagem lusitana. A primeira resposta que me ocorreu foi um “não sei, nem me interessa” porque cada vez mais é isso que sinto. Por várias razões, mas depois resolvi alongar resposta com o exemplo dos incêndios, com o absolutamente insuportável “espectáculo” quotidiano de mata a arder com que somos bombardeados Verão após Verão, com o desespero de perceber que apesar dos discursos inflamados que se vão fazendo no auge e nos rescaldos a verdade é que nada muda. Antes pelo contrário.
Estava aí a minha resposta sobre o que acho de Portugal. Uma cambada de inúteis armados em importantes, que falam muito mas pouco fazem. Um país de labregos que dá mais valor ao cromado de uma taça da bola do que ao verde que os ajuda a respirar.
Quando um país não consegue descobrir uma forma sequer de proteger um dos seus bens essenciais como é a floresta que mais há a dizer sobre as suas capacidades? Que mais existe para discorrer sobre o andar da dita carruagem? Muito pouco ou nada. Dez milhões, somos apenas 10 milhões e ninguém se entende, ninguém consegue descobrir uma forma de gerir o país sem andar tudo à cabeçada e dar passos de caranguejo.
Para quem olha o país a o partir do rectângulo parece muita gente mas quando se contempla de fora para dentro apercebemo-nos que esses 10 milhões não são mais do que meia dúzia a jogarem à sueca. Tomara o presidente da Câmara de Cantão ter apenas 10 milhões para cuidar… É triste, penoso e absurdo.
No caso dos incêndios, segundo os últimos dados disponíveis, apenas este ano, e até ao dia 15 de Agosto, já tinha ardido uma área três vezes superior à média dos últimos 10 anos!
Segundo um relatório provisório do Instituto de Conservação da Natureza e das Florestas foram 103.137 os hectares de mata que foram ao ar!!
De acordo com os dados disponibilizados pelo Sistema Europeu de Informação de Fogos Florestais (EFFIS na sigla em inglês) “em Portugal, já arderam cerca de 53,4% da área total ardida na União Europeia”!!!
Alguém poderá argumentar tratar-se de um país muito quente, sujeito a este tipo de situações. OK, seja. Por isso fui aos dados da Pordata e comparei os países europeus com probabilidades semelhantes, ou seja, Espanha, Itália, Grécia e, porque não, também a França e verifiquei que conseguimos batê-los a todos, sempre!
Entre 1990 até 2014, somos praticamente os campeões absolutos, conseguindo bater recordes ano após ano e, frequentemente, a deixar a “concorrência” a grande distância como convém nos campeonatos.
Se quiser verificar, siga esta ligação: bit.ly/areaardida e verificará não ser apenas no futebol que somos campeões europeus pois ninguém queima tanta terra como nós. E se não é o clima a explicar, porque também há calor nos outros países mediterrânicos mencionados, é o quê? Incompetência, pura e dura.
Segundo relata o Diário de Notícias, e cito, “os técnicos de protecção civil defendem que ‘este problema, estes números e estas consequências, não são da responsabilidade deste Governo, nem deste dispositivo operacional, antes, de anos e anos de medidas estratégicas mal tomadas, e decisões políticas de ordenamento florestal erradas, omissas e insuficientes’, além de só se falar de incêndios nos meses críticos e “exclusivamente sobre a resposta operacional”.
É óbvio. Num país de pavões onde tudo se trata sempre à flor da pele, que mais esperar?
Portugal é um país onde se grita muito e faz-se pouco, onde, noutro exemplo, se apregoa a importância das comunidades portuguesas espalhadas pelo mundo e se esquece da existência de fusos horários, como me aconteceu hoje ao tentar levantar o orwelliano Cartão de Cidadão no consulado local. “Está aqui sim”, responderam-me, “mas não o pode levantar porque o sistema em Portugal está em baixo. Sabe, é que só entram às 9 da manhã de Lisboa…” E ninguém, lá para aqueles lados, se lembra que talvez fosse necessário a existência de um piquete de prevenção para resolver este tipo de ocorrências? E se a pessoa tiver uma necessidade urgente do documento por uma qualquer razão? Lisboa não quer saber, Lisboa só entra às suas nove. É como os incêndios. Em breve virão as chuvas e com elas o esquecimento. Até para o ano, até não existirem mais árvores para queimar para ver se o problema se resolve por si próprio. Se calhar até é uma opção inteligente.
Que penso então do andar da carruagem lusitana? Penso que qualquer dia nem sequer carruagem há quanto mais andar.

MÚSICA DA SEMANA

“Don’t Let Me Down & Down” (David Bowie, 1993)

“I know there’s something in the wind
That crazy balance of my mind
What kind of fool are you and I?
Scared to death and tell me why
I’m sick and tired of telling you
Don’t let me down and down and down
Don’t let me down and down and down
Still I keep my love for you”

14 Set 2016

Os muros das lamentações

[dropcap style≠’circle’]A[/dropcap]s imagens valem mil palavras, certo? Então aqui ficam três. Acompanhadas de duas sugestões.

I. Com a falta de espaços bravios que tanta falta fazem ao desenvolvimento saudável das crianças porque se encerram os poucos que ainda por aí andam com estas cercas de má catadura? Temporários que sejam porque não deixar que sejam apreciados? As brincadeiras que eu ali não faria se tivesse 10 anos…

II. Mas já que gostam de os tapar, porque o verde é feio, ou porque as ervas picam, sei lá… porque é que o Governo não contrata (sim, contratar) os artistas locais para os decorarem? Será melhor andarmos entaipados por estas cercas de “amarelo-já-morri”?

Música da Semana

“Where Have All The Good Times Gone” (David Bowie, 1973)

(…)
“Won’t you tell me
Where have all the good times gone
Where have all the good times gone
Where have all the good times gone

Once we had an easy ride 
and always felt the same
Time was on our side 
and I had everything to gain
Let it be like yesterday
Please let me have happy days”
(…)

29 Jun 2016