Sara F. Costa Expectoração h | Artes, Letras e IdeiasFaça dinheiro a partir de casa Já escrevi sobre a geracão Z num artigo anterior. Isto de voltar a um tópico sobre “os jovens” e “os dias de hoje” pode perfeitamente parecer um conflito geracional mal resolvido – um daqueles que prometi que nunca iria ter. Vou antes encarar este interesse como uma forma de estar atenta à mudança e ser capaz de antecipar cenários (económicos, sociais e políticos). O meu sobrinho um dia destes perguntou-me se eu queria fazer parte de uma equipa de “mineração de bitcoin”. Aparentemente, só tinha que lhe emprestar a potência do meu computador para o deixar ligado a “minerar” a moeda digital. A mineração é, basicamente, a resolução de um problema matemático. Quanto mais pessoas existirem numa rede com computadores ligados a tentarem resolver uma equação, como por exemplo x – 2 = 0. O primeiro a chegar à solução “x = 2” recebe a recompensa pelo trabalho. Não é fácil o meu sobrinho convencer os avós sobre isto de tentar ficar rico já aos treze anos usando apenas um computador. Nunca existiu uma época como esta. Uma série de miúdos com acesso a comunidades e fóruns online como o discord, passam informação e conhecimento sobre procedimentos vários que lhes permitem começar a trabalhar quando quiserem, em casa, em frente ao – sim, adivinharam- computador. Mas se a existência digital é nova, o ditado é antigo “dinheiro gera dinheiro”. Aquele que conseguir convencer elementos da geração que o precede em relação à sua visão de negócio digital, pode mesmo vir a ter capital para investir. A partir daí, tudo vai depender de quantos vídeos viu no YouTube sobre como investir em criptomoedas, liderar esquemas de pirâmide, fazer marketing social ou aprender a vender coisas que não lhe pertencem. Perguntam-me os leitores muitíssimo interessados neste texto: como assim, vender coisas que não lhes pertencem? O termo é “dropshipping”. Numa forma de comércio tradicional, um vendedor vai fazer compras ao retalho e revender com a sua margem de lucro. Nesta fórmula, os produtos são também exibidos num website criado pelo jovem que entende de internet. Nesse site, ele coloca fotos e informações do produto e torna-o disponível para compra. Só que não o tem! As fotos e as informações foram retiradas de plataformas de e-commerce chinesas como o aliexpress ou o Alibaba e quando um pedido cai no website do revendedor, ele encomenda nesses sites e entrega ao consumidor final. O segredo do sucesso deste modelo passa pela observação minuciosa do comportamento das pessoas online. Existem sites que revelam exatamente toda a informação que o Facebook, o Instagram e o Tiktok têm sobre quantas pessoas reagiram a uma publicação para um produto específico (produtos de nicho). Ao analisar a tendência de interesse, o revendedor vai investir com pagamento de publicidades, criação de websites, lojas online, etc. Há tempos, estavam em voga uns calções de banho que mudavam de cor quando uma pessoa entrava na água. Afinal, é possível montar um negócio lucrativo sem acabar o secundário? De facto, para se ser rico, não é preciso saber-se muito mais sobre o mundo do que aprender a reproduzir lógicas de acumulação de capital e exploração de mão de obra. É desta forma que se alcança o sonho capitalista, desvalorizando qualquer tipo de experiência que não conduza a uma produtividade material. Resta-nos desejar que as artes, humanidades e ciências sociais (menos “produtivas”), permitam aos jovens serem jovens e que este continuem, como é seu papel, a sonhar em mudar o mundo e não a deixá-lo como está em nome do benefício próprio.