João Santos Filipe Grande Plano MancheteCriptomoeda | Frederico Rosário absolvido dos crimes de burla Apesar de ter de indemnizar cerca de 29 vítimas, numa quantia que pode chegar a 12 milhões de patacas, o filho de Rita Santos não vai ter de cumprir pena de prisão. Sobre a indemnização, a defesa ainda vai ponderar apresentar recurso Frederico Rosário, filho da Conselheira das Comunidades Portuguesas, Rita Santos, foi absolvido da prática de 47 crimes de burla de que era acusado pelo Ministério Público, no âmbito de um esquema de investimento em criptomoeda, que terá gerado perdas de 21 milhões de patacas. A decisão foi conhecida na sexta-feira, no Tribunal Judicial de Base, numa sessão em que o arguido voltou a estar ausente. Apesar de inocente do procedimento criminal, Frederico do Rosário vai ter de indemnizar 29 das vítimas. O desfecho foi encarado para advogado do filho de Rita Santos, Luís Almeida Pinto, como uma vitória, porque mais do que conseguir que o cliente fosse considerado inocente, o importante era que ficasse provado que não tinha cometido os crimes. “Decorre inequivocamente da sentença que Frederico Rosário não praticou qualquer crime. O tribunal foi claro nisso. Muitas vezes os arguidos são absolvidos na dúvida, […] porque há um princípio no direito, in dubio pro reo, que deve levar o tribunal a absolvê-los sempre que houver dúvidas”, começou por argumento o advogado. “Neste caso, Federico Rosário foi considerado não culpado, ou seja, que não era responsável pelos crimes de burla. Isto significa para Federico Rosário e para a família, que o tribunal de Macau lavou a sua honra”, acrescentou. “O tribunal com este acórdão decidiu que ele teve comportamentos negligentes, mas nunca e jamais que cometeu um crime, ou crimes de burla” completou. Por outro lado, o advogado destacou também que Frederico Rosário não pode ser visto como um criminoso ou delinquente, ao contrário do que pretendia o Ministério Público. “Perante a comunidade de Macau, Frederico Rosário jamais pode ser apontado como um criminoso ou delinquente, conforme havia sido na acusação do Ministério Público”, realçou. Sem dolo A condenação por crime de burla implica que se prove que os arguidos tiveram intenção de cometer o crime. E para o tribunal, foi esse aspecto que distinguiu o arguido Frederico Rosário do outro, Dennis Lau, condenado a uma pena efectiva de prisão de 10 anos. Segundo o acórdão lido pela juíza Cheong Weng Tong, Frederico do Rosário não teve intenção de fazer com que as vítimas perdessem o dinheiro, quando conseguiu que enviassem os seus investimentos para o outro arguido. “O segundo arguido [Frederico Rosário] teve uma conduta negligente, que não constitui crime”, afirmou Cheong, na leitura do acórdão. “Foi absolvido de todos os crimes, mas em relação a uma das acusações houve desistência, pelo que o crime foi extinto e não houve absolvição”, acrescentou. Por outro lado, o tribunal deu como provado que Dennis Lau, desde o início, teve como objectivo usar Frederico do Rosário para amealhar uma grande quantia de dinheiro. “O Tribunal tem a opinião de que o primeiro arguido agiu de acordo com o factos de que foi acusado e que são todos dados como provados. Tinha a intenção de enganar a vítimas e fê-lo através do segundo arguido”, concluiu. Banco vazio Como Dennis Lau está em Hong Kong, não deve cumprir a pena em Macau. Apesar disso, foi condenado a 10 anos de pena de prisão por cinco crimes de burla simples, 24 de burla de valor elevado e 16 crimes de burla de valor consideravelmente elevado. “A pena é de prisão para atingir os objectivos de penalização, a ilicitude é elevada, os ofendidos tiveram prejuízos e o dolo foi muito elevado, até na forma como recorreu a formas de investimento mais modernas, o que fez com que as pessoas aderissem aos seus planos. Também não indemnizou qualquer dos ofendidos”, destacou a juíza, face a um banco que esteve sempre vazio, no que diz respeito a Dennis Lau, ao longo de quase um ano de julgamento. Nas considerações sobre a pena aplicada ao criador das empresas Forgetech e Genesis, Cheong Weng Tong sublinhou igualmente que foram tidas em conta as “consequências muito graves” do esquema criado. Assumir responsabilidades Se a nível criminal Frederico Rosário não tem de enfrentar consequências, o mesmo não acontece ao nível dos pedidos de indemnização civil. O tribunal entendeu que o filho de Rita Santos vai ter de indemnizar 29 vítimas por ter responsabilidade solidária, a par de Dennis Lau, em factos ilícitos assim como culpa nas perdas geradas. “O tribunal é da opinião que [Frederico Rosário] agiu com negligência e que também não cumpriu o dever de prudência. Nessas circunstâncias, o tribunal considera que deve indemnizar os ofendidos porque está mais do que provado que teve responsabilidade pela entrega dos montantes”, foi considerado pelo tribunal. No entanto, a juíza Cheong Weng Tong não revelou o montante que vai ter de ser pago a cada vítima, limitou-se a ler o nome dos burlados que terão de ser indemnizados. Segundo as estimativas da defesa, o valor total deve ser inferior a 12 milhões de patacas. Contudo, Luís Almeida Pinto não afastou a possibilidade de recurso. “O Frederico Rosário não ficou com um avo do dinheiro das vítimas. Não deixa de ser estranho que seja condenado solidariamente a pagar indemnizações a 29 das vítimas, quando o tribunal reconhece inequivocamente que o dinheiro dos ofendidos foi apropriado pelo arguido de Hong Kong”, afirmou o advogado. “É matéria que vamos estudar e eventualmente recorrer”, sublinhou. Críticas a Rosário Apesar da vitória a nível criminal, a postura de Frederico Rosário foi alvo de críticas pela juíza, por não ter verificado se os planos de investimento eram viáveis, nem percebido como iriam funcionar as empresas Genesis e Forgetech, utilizadas na burla. “O segundo arguido apresentou todos estes planos de investimento, mas não foi prudente, não se inteirou sobre as empresas nem sobre programas que apresentou. Praticou os actos, para que os familiares, amigos e ele mesmo obtivessem comissões. […] Levou a que os ofendidos acreditassem nele, no seu poder de fiscalização sobre os investimentos e causou prejuízos”, afirmou a juíza. As críticas estenderam-se às apresentações feitas na sede da Associação de Trabalhadores da Função Pública de Macau e às alegações de Frederico Rosário que desconhecia a situação. “O segundo arguido compareceu em tribunal e negou prática dos factos. Referiu que foi enganado, e que todos os actos foram praticados pelo primeiro arguido, sem ter conhecimento. O tribunal considera que o arguido estava mais a par da situação do que disse”, atirou Cheong. “Quando investiu na companhia sabia que estava a participar nos planos de minerização e pretendia que mais pessoas participassem nos planos para ter uma recompensa para si e para os familiares”, destacou. Para indicar que Frederico Rosário percebia os planos de investimentos e que não se limitava a dedicar a atenção à parte do jogo electrónico, pelo menos na primeira sessão, a juíza recordou a conduta da mãe. “Na primeira sessão de apresentação [na ATFPM] o arguido podia não estar tão a par da situação como o primeiro arguido […] mas não tinha tão poucos conhecimentos como quis deixar parecer”, afirmou a juíza. “Na altura, a sua mãe entregou 200 mil patacas em numerário. Se a sua mãe não tivesse conhecimento do plano, será que teria imediatamente esta quantia consigo?”, questionou. “A experiência faz-nos acreditar que os planos já tinham sido apresentados, que havia pessoas que estavam a par e que estavam preparadas para fazer logo as transferências ou entregar o dinheiro”, justificou. Em baixo A leitura da sentença era para ter decorrido no mês passado, mas foi adiada. Na altura, Frederico Rosário também não compareceu na sessão, e Luís Almeida Pinto, advogado de defesa, afirmou ter sido informado que tal se deveu a um excesso de comprimidos. “Da outra vez ficou em casa com medicamentos. Está muito em baixo, penso que pode ter cedido um pouco a esta pressão”, contou o advogado à juíza. “Sei que da última vez tomou medicamentos e foi necessário fazer um tratamento. É uma coisa de grande pressão e é natural que em determinada altura as pessoas quebrem”, detalhou, momentos depois, já fora da sala da audiência. Práticas medievais À saída do tribunal, Luís Almeida Pinto criticou o procedimento da Polícia Judiciária que frequentemente enfia um capuz preto nos arguidos, para que sejam fotografados pela comunicação social, antes de serem levados para o Ministério Público. “Falei no procedimento de aparecer na televisão com um capuz enfiado na cabeça. É um procedimento de Idade Média da nossa Polícia Judiciária e que é reprovável”, criticou. “Desde esse momento até ao presente, podem imaginar a pressão que o Frederico Rosário sofreu no dia-a-dia, estando aqui, vivendo na comunidade, enfrentando os olhares das pessoas, lutando para fazer a prova da sua inocência. Podem calcular a carga emocional”, acrescentou. Rita Santos em lágrimas Foi com o filho absolvido e com a juíza fora da sala de audiência, que Rita Santos, Conselheira das Comunidades Portuguesas, se desfez em lágrimas, entre abraços ao pai do filho, Frederico Rosário, familiares presentes e à equipa de advogados. A também presidente da mesa da Assembleia Geral da ATFPM esteve sempre ao lado do filho em todo o julgamento e não faltou a qualquer sessão. No final, teve uma descarga de adrenalina.