Capitais Públicos | Companhias reflectem influência da elite local

A revelação pelo Executivo de Ho Iat Seng das participações e nomeações nas empresas com capitais públicos expõe a olho nu as ligações entre famílias tradicionais, membros do Conselho Executivo e Governo. Os elos de ligação são nomeações públicas, mas também dos investimentos conjuntos

 

[dropcap]O[/dropcap] Governo é responsável por, pelo menos, 3,45 mil milhões de patacas em participações sociais nas empresas que declararam dados no portal do Gabinete para o Planeamento da Supervisão dos Activos Públicos. O valor será mesmo superior, uma vez que faltam ser publicados dados de algumas companhias, enquanto outras optaram por não disponibilizar informação na plataforma.

Mais do que o valor das participações, as informações que começaram a ser reveladas por instruções de Ho Iat Seng permitem perceber ligações entre o Executivo e alguns empresários e políticos mais influentes. Esta realidade vai muito além da histórica ligação com a Sociedade de Turismo e Diversões de Macau (STDM).

As ligações surgem não só pelo do facto de o Governo ser accionista com os empresários em algumas das companhias com capitais públicos, mas também por os nomear como representantes em várias ocasiões. Um dos nomes em maior evidência é do empresário e ex-membro do Conselho Executivo Liu Chak Wan.

Além de ter sido nomeado pelo Executivo curador da Fundação Macau (FM) e do Fundo para o Desenvolvimento das Ciências de Tecnologia (FDCT), Liu é ainda parceiro minoritário de negócios com o Governo em pelo menos três empresas, nomeadamente no Centro de Produtividade e Transferência de Tecnologia de Macau (CPTTM), no Centro de Comércio Mundial de Macau (WTC, em inglês) – onde é presidente da mesa da Assembleia-Geral, e ainda na Companhia de Electricidade de Macau (CEM). No CPTTM, Liu tem uma participação de 100 mil patacas, ou seja 0,4 por cento do capital social, e no WTC a participação é de 750 mil patacas, o que representa 2,5 por cento do capital da empresa.

Como curador da FM e FDCT, o empresário tem a possibilidade de estar envolvido no Centro de Ciência de Macau, no Instituto para o Desenvolvimento e Qualidade Macau (IDQM), Sociedade do Metro Ligeiro e na Macau Renovação Urbana, em que a FM e FDCT são accionistas. Acresce que no caso do Centro de Ciência de Macau, Liu é também presidente da Assembleia-Geral.

O empresário é parceiro do Governo também na Companhia de Electricidade de Macau e secretário da mesa da Assembleia-Geral em nome da Liu’s Comércio e Indústria. A participação na CEM da empresa que Liu representa não é revelada, o portal da eléctrica releva que é inferior a dois por cento. Já a participação do Governo na CEM é de oito por cento.

(u)Ma família feliz

As informações reveladas no portal do Gabinete para o Planeamento da Supervisão dos Activos Públicos reflectem igualmente as ligações entre o família Ma e o Governo.

Apesar de ter morrido em 2014, o patriarca Ma Man Kei continua a ser apresentado como accionista do CPTTM com uma participação de 100 mil patacas, ou seja 0,4 por cento do capital social da empresa, que deverá ser gerida pelos herdeiros. Porém, as ligações entre o Governo e a família continuam através de, pelo menos, três filhos e um neto.

Também no CPTTM, o empresário Alexandre Ma Iao Lai surge com uma participação de 50 mil patacas, ou seja 0,2 por cento do capital social. O ex-membro do Conselho Executivo é ainda um dos sócios do Governo da empresa do Matadouro, com uma participação de 1 milhão de patacas, o que equivale a 2,5 por cento do capital social.

Igualmente no CPTTM, também o filho de Alexandre Ma, Frederico Ma Chi Ngai tem uma palavra a dizer, ainda que de forma indirecta. Além de ser membro do Conselho Executivo de Ho Iat Seng, Frederico é membro do Conselho da UM, o órgão mais elevado de decisão na instituição de ensino, que tem uma participação de 50 mil patacas, ou seja 0,2 por cento no CPTTM.

O membro de terceira geração do clã Ma é, de facto, o que mantem maiores ligações ao Executivo. Enquanto presidente do Fundo de Desenvolvimento das Ciências e da Tecnologia (FDCT), tem uma palavra a dizer na Macau Renovação Urbana, Metro Ligeiro e no Centro de Ciência de Macau. Em todas estas empresas, o FDCT tem participações de um por cento, o que corresponde a 1 milhão, 14 milhões e 100 mil patacas, respectivamente. Frederico Ma é ainda membro da mesa da Assembleia-Geral do Metro Ligeiro e vice-presidente da mesa da Assembleia-Geral do Centro de Ciência.

Presença na CAM e TDM

Já na empresa que gere o aeroporto de Macau, a CAM, mesmo sem ter uma participação em nome individual, a família Ma está representada por Ma Iao Hang, que é presidente do Conselho de Administração, por nomeação do Governo. A nomeação foi renovada em Março deste ano pelo secretário para os Transportes e Obras Públicas, Raimundo do Rosário. Ma é igualmente vogal da comissão de vencimentos.

Também por nomeação do Governo, pela mão do anterior Chefe do Executivo Chui Sai On, Ma Iao Hang é presidente da Mesa da Assembleia-Geral da Teledifusão de Macau (TDM).

As ligações do segundo filho mais velho de Ma Man Kei, e pai do deputado Ma Chi Seng, não acabam por aqui. No conselho de curadores da Fundação Macau tem também uma ligação indirecta ao CPTTM, Centro de Ciência e Instituto para o Desenvolvimento e Qualidade Macau.

O clã Ma está ainda envolvido directamente no Centro Mundial de Comércio, através do filho mais novo de Ma Man Kei, que é proprietário de 2,5 por cento da empresa, que representa um valor de 750 mil patacas.

Senhor “renovação urbana”

Outra elite que surge com bastante frequência nas informações disponibilizadas é Peter Lam, membro do Conselho Executivo e empresário da Sociedade de Investimento e Construção Cidade Nova.

Recentemente, Peter Lam assumiu mais protagonismo com a nomeação para presidir ao Conselho da Administração da empresa Macau Renovação Urbana, que vai, entre outros projectos, construir fracções para os lesados do Pearl Horizon e fazer obras no Bairro Novo Macau, na Ilha da Montanha.

No capítulo das nomeações, Peter Lam é o presidente do Conselho da Universidade de Macau, o órgão mais elevado da entidade que traça os planos para o futuro, além de escolher o reitor. A UM é accionista em empresas públicas como o CPTTM e o IDQM.

Ao nível de parcerias em investimentos, Lam é sócio do Governo em pelo menos duas empresas com capitais públicos. Um desses exemplo é o WTC, onde a RAEM é a principal accionista, com 18 milhões de patacas, que representa 60 por cento do capital da empresa. Já o investimento de Lam representa 2,5 por cento do capital, avaliado em 750 mil patacas. Lam assume no WTC as posições de director-executivo da Comissão Executivo e Vice-presidente do Conselho da Administração. As duas partes voltam a encontrar-se no Centro de Produtividade e Transferência de Tecnologia de Macau.

O clã Chui

Além da ligação com a família Ma, as informações mostram a relação entre o Executivo e os membros da família Chui, a que pertence o anterior líder do Governo Chui Sai On.

Como seria de esperar, e uma vez que o anterior Chefe do Executivo está em período de nojo após o mandato, as ligações são feitas com o irmão, Chui Sai Cheong, e o primo José Chui Sai Peng.

O irmão Chui Sai Cheong é um dos accionistas do Centro de Comércio Mundial de Macau, com um investimento de 750 mil patacas, uma participação de 2,5 por cento, onde também assume funções de membro do Conselho de Administração. Além disso, o irmão mais velho do ex-Chefe do Executivo está envolvido no CPTTM, com uma participação de 50 mil patacas, de 0,2 por cento de todo o capital.

Quanto ao primo, Chui Sai Peng, a ligação com as empresas da RAEM surge através do Centro de Ciência, onde foi nomeado para as funções de membro do Conselho de Administração.

A histórica STDM

Uma das parcerias mais frequentes relatada pela informação do Executivo, é a ligação entre o Governo e a Sociedade de Turismo e Diversões de Macau, que data aos anos da administração portuguesa.

A empresa fundada por Stanley Ho é a segunda maior accionista da CAM, com 34,1 por cento, que se traduz num valor 1,03 mil milhões de patacas. Além disso, a “sucessora” do magnata, Pansy Ho, assume os cargos de vice-presidente do Conselho de Administração e vogal do Conselho de Vencimentos. Também a irmã Daisy Ho aparece como administradora.

No que diz respeito à CAM, Winnie Ho, irmã falecida de Stanley Ho, tem uma participação de 0,35 por cento, que vale 10,7 milhões de patacas.

No entanto, a empresa que durante anos deteve o monopólio do jogo é ainda accionista no CPTTM e no Centro de Comércio Mundial. As participações têm valores de 250 mil e 750 mil patacas, respectivamente.

29 Jul 2020

Capitais públicos | CTM e CEM rejeitaram partilha de informações

As duas companhias foram as únicas a rejeitarem partilhar informações com o Gabinete para o Planeamento da Supervisão dos Activos Públicos da RAEM. Na lista agora publicada pelo Gabinete, entre os parceiros do Governo surgem vários nomes de membros do Conselho Executivo, deputados, elementos das famílias locais mais poderosas e até pessoas que já faleceram

 

[dropcap]A[/dropcap] Companhia de Telecomunicações de Macau (CTM) e a Companhia de Electricidade de Macau (CEM) recusaram seguir as instruções do Chefe do Executivo para partilharem informações de interesse público.

No mês passado, Ho Iat Seng assinou um despacho com “instruções para a divulgação pública de informações por empresas de capitais públicos”, que estipula os conteúdos e deveres das companhias com participação da RAEM.

Uma vez que o Governo de Macau tem participações minoritárias na CTM e CEM, estas empresas também tiverem de escolher se partilhavam informações como participações sociais, estrutura orgânica e demonstrações financeiras, entre outras, no portal do Gabinete para o Planeamento da Supervisão dos Activos Públicos da RAEM. Porém, as duas empresas recusaram essa possibilidade.

Quanto às restantes cinco empresas em que o Governo tem participações minoritárias optou-se por seguir apenas algumas das instruções. Estas companhias são Macauport, Laboratório de Engenharia Civil de Macau, Air Macau, Waterleau Macau e Fundo de Cooperação e Desenvolvimento China-Países de Língua Portuguesa de Sociedade Limitada. Até ontem, apenas as informações do LECM estavam disponíveis.

Outros ritmos

Quanto às empresas em que a RAEM é o principal accionista estão quase todas disponíveis à excepção da Macau Investimento e Desenvolvimento, responsável pelo Parque de Medicina Tradicional Chinesa no outro lado da fronteira, e da UMTEC limitada, ramo comercial da Universidade de Macau.

Entre os parceiros do Governo nas diferentes empresas surgem vários nomes de notáveis de Macau, desde deputados a membros de algumas das famílias mais representativas do território.

O Centro de Comércio Mundial (WTC, na sigla inglesa) é uma das empresas com mais accionistas “notáveis”, como Peter Lam, Liu Chak Wan, Chui Sai Cheong ou Tsui Wai Kwan. Outra entidade com vários accionistas bem conhecidos é o Centro de Produtividade e Transferência de Tecnologia de Macau, onde Peter Lam volta a surgir, tal como Chui Sai Cheong.

Em termos das entidades portuguesas, a Teixeira Duarte (Macau) está presente no Matadouro e o Laboratório Nacional de Engenharia faz parte dos accionistas Laboratório de Engenharia Civil de Macau.
Finalmente, quanto aos accionistas já falecidos, por exemplo na CAM – Sociedade do Aeroporto Internacional de Macau, surgem Winnie Ho, irmã de Stanley Ho, Cheng Yu Tung. Também Ma Man Kei, o patriarca da família Ma, surge como accionista do Centro de Produtividade e Transferência de Tecnologia de Macau.

28 Jul 2020

Capitais Públicos | Gabinete de Sónia Chan recebe 110 mil patacas

[dropcap]O[/dropcap] Gabinete para o Planeamento da Supervisão dos Activos Públicos, liderado pela ex-secretária para a Administração e Justiça, Sónia Chan, recebeu um fundo permanente de 110 mil patacas.

A criação deste fundo foi publicada ontem no Boletim Oficial e está autorizado pelo secretário para a Economia e Finanças, Lei Wai Nong. O Gabinete para o Planeamento da Supervisão dos Activos Públicos, criado pelo novo Governo, tem como funções analisar, estudar o modo de funcionamento e a gestão das empresas com participações financeiras detidas de forma directa ou indirecta pela RAEM.

23 Abr 2020

Empresa de capitais públicos para o Metro Ligeiro está para breve

[dropcap]O[/dropcap]Conselho Executivo deu luz verde ao projecto de regulamento administrativo sobre a constituição da Sociedade do Metro Ligeiro. A empresa de capitais públicos, que vai gerir o futuro sistema de transporte, vai nascer a meses da entrada em funcionamento da linha da Taipa, prevista para a segunda metade do ano.

A entrada em cena da nova empresa, com capitais exclusivamente públicos, implica a retirada do Gabinete de Infra-estruturas e Transportes (GIT) que, como confirmado ontem, vai ser extinto. “Não pode haver duas entidades a fazer a mesma coisa”, afirmou ontem o coordenador do GIT, Ho Cheong Kei, na conferência de imprensa do Conselho Executivo.

Na sequência do desaparecimento do GIT, organismo com natureza de equipa de projecto criado em 2007, os 93 funcionários têm agora duas opções em cima da mesa: mantêm-se na função pública ou transitam para a nova empresa. “É uma decisão de acordo com as duas partes”, explicou Ho Cheong Kei, dando conta de que se encontra na mesma situação: “Espero poder continuar a acompanhar o processo. Se o [meu] superior achar que não sou adequado [para mudar para nova empresa] estou disponível para servir em qualquer cargo”.

A Sociedade do Metro Ligeiro “só poderá operar” após firmado o contrato de concessão, pelo qual será preciso aguardar para se perceber exactamente qual será a relação entre a nova empresa e a MTR, de Hong Kong, à qual foi entregue as operações do metro ligeiro nos primeiros cinco anos de funcionamento. “Temos de aguardar pelo conteúdo para depois podermos ter os detalhes”, afirmou Ho Cheong Kei.

A empresa que vai explorar o metro ligeiro vai ser exclusivamente de capitais públicos porque vai ter “prejuízo certo”, como reconheceu o secretário para os Transportes e Obras Públicas, Raimundo do Rosário, que estimou anteriormente os gastos anuais de operação e manutenção em aproximadamente 900 milhões de patacas. “São apenas estimativas”, manteve o coordenador do GIT.

De resto, como anunciado anteriormente, a nova sociedade anónima vai arrancar com um capital social de 1,4 mil milhões de patacas. A RAEM figura como sócio maioritário (96 por cento) da empresa que tem ainda como accionistas o Fundo de Desenvolvimento Industrial e de Comercialização (3 por cento) e o Fundo para o Desenvolvimento das Ciências e Tecnologia (1 por cento).

15 Mar 2019