Como Gu Bing Iluminou a História da Pintura

Michal Piotr Boym (Bu Migé, 1612-1659), o missionário jesuíta polaco, no seu infatigável labor de mostrar à Europa a língua, os costumes, a fauna e a flora que encontrava no Império do Meio, incluiu entre as inumeráveis revelações que acompanhavam o inédito mapa da Magna Cathay, cinco figuras desenhadas por um autor local e impressas em xilografias.

Entre ela a flor mu furong, o hibiscus mutabilis, ou rosa da China, que possui a admirável capacidade de, a cada manhã apresentar uma cor branca ou rosada e no fim do dia, ao entardecer, revelar a cor vermelha como se fora um prémio outorgado à sua existência sob a luz solar.

O autor dessas figuras, o pintor de Hangzhou Gu Bing, activo entre 1594 e 1603, realizara uma proeza notável e inédita na história da arte em qualquer lugar do mundo, ao juntar à enumeração dos nomes e biografias breves de pintores, poemas, comentários e ilustrações exemplares do seu estilo e modo de proceder. Reproduzidas em xilogravuras, no formato portátil de 26,9 x 41,9 cm, tinham o potencial de mostrar a um muito maior número de observadores uma arte até então reservada a um número limitado de pessoas.

A esse conjunto de cento e seis pintores, apresentados de modo cronológico, desde o lendário Gu Kaizhi à corrente dinastia Ming, editado em 1603, deu-lhe o nome de Lidai minggong huapu, «Álbum de senhores famosos através de sucessivas dinastias». De notar a palavra huapu, «registo de figuras» já usada antes para designar um tratado, uma colecção, um guia ou um manual. E o mais raro uso da palavra laudatória e reverencial gong, «senhores», para referir os pintores.

O álbum alcançaria grande divulgação, chegando até às ilhas do Japão onde foi particularmente acarinhado pelos pintores proíbidos de viajar ao estrangeiro. Conhecido também como Gushi Huapu, «Álbum de pinturas do mestre Gu», mesmo quando a figura do seu autor, que seguiu um percurso incomum, foi por vezes esquecida.

Gu Bing ficara orfão desde muito cedo mas tivera a sorte de ter um avô que o quis poupar ao fastidioso trabalho de decorar os clássicos, imprescindível para se apresentar aos exames imperiais e em vez disso lhe deu a ver os mais excelentes exemplos de caligrafias e pinturas. E depois, ele mesmo se deslocou às mais veneradas montanhas e visitou ilustres literatos, acabando por fixar a sua morada numa cabana no sopé da montanha Wu, a sudeste do Lago do Oeste.

Em 1599 aceitou, brevemente, uma posição na Cidade Proíbida no Wuying dian, o «Pavilhão do valor militar», na altura usado pelo imperador para se reunir com literatos como pintores ou poetas e onde terá tido oportunidade de observar reconhecidas obras da história da pintura. Que depois usou na sua obra, onde os traços esquemáticos na madeira jamais poderiam imitar a complexidade das pinturas mas seriam um precioso auxiliar da memória.

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