Maria Ondina China

Presa ao mito duma princesa oriental, longilínea e distante, parecia curtir um impalpável ressentimento. Metade Lispector, metade Pearl Buck, havia tomara ainda jovem o barco do império. Foi ainda mais além. Voltou depois para chá com tristeza em Benfica. Braga foi a sua primeira China, Macau a segunda, a China nenhuma.

Mas os lusos não perdoam a quem é diferente. Não tinha cara nem de Quinta do Lago, nem de Moimenta da Beira. Vestia uma cabaia ruça, com botões verdes. Lembrava uma farda da revolução cultural. Assim, como queria que se lhe identificasse classe e proveniência imediatamente? Em Braga, não haveria nenhuma outra China a vestir?

Ninguém: ; a literatura portuguesa dos 50 aos 80: desinteressantes ficções sem referência depois de desinteressantes ficções com referências. Ah, muito telúricas, com torres, casas e outros totens. Mau tempo no, a torre de, a casa de.

Entretanto, todas as lutas da mulher, o conhecimento do outro, o palpar do si – tudo já está nela, diante de nós, à espera de ser encontrado. Chegamos quase às identidades contemporâneas et alii.

Tão distante da pastelosa Agustina com sua pataratice de Entre Douro e Minho (esse Terreiro do Paço mais a norte) e tão mais perto de autores que parecem provincianos mas não o são nada, como o Pascoaes.

Entretanto, os livros de Ondina apanham pó na biblioteca. As chaves para conhecer a China ou para conhecer o mundo (quase a mesma coisa) ficam no chaveiro. E quanta pedagogia da China (um cinto, uma estrada, um arredondamento de volta do mundo que também poderíamos nós outros formar) não nos poderia dar, quanto outro mundo?

E porque não leem também Wenceslau de Moraes? Aqui não há a desculpa de ser mulher. É por falar no Japão? Seria melhor falar de Telheiras? Mas não é o Japão, ou talvez o Tibete, o verdadeiro sentido da cultura portuguesa? Para morrer o mundo? Pode ser. Para quando uma Ondina tibetana, um Wenceslau malaio?

As pessoas gostam é que se fale dos seus Terreiros do Paço mentais: o de Lisboa, ou o de Times Square. O verdadeiro, por estes dias, nunca vão querer conhecer, senão daqui a largos anos – e aí já será tarde demais. É sempre longe demais, já dizia a Xana dos Rádio Macau. Et pour cause.

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