Debbie Lai, directora do Centro do Bom Pastor | “Vítimas precisam de mais protecção”

A propósito do Dia Internacional da Mulher, que se celebrou em todo o mundo no sábado, o HM conversou com Debbie Lai, directora do Centro do Bom Pastor, uma das entidades que acolhe vítimas de violência doméstica no território. A responsável defende celeridade nas investigações de casos de violência doméstica e mais dias de licença de maternidade

 

 

No que respeita à violência doméstica, a lei continua a não ser revista, com muitos casos em que não se consegue acusar ou condenar o agressor. O que precisa ser alterado na legislação actual?

Deve-se acelerar o tempo gasto na investigação do caso, bem como fazer uma simples promoção da lei, para deixar as pessoas compreender o que vão enfrentar caso denunciem a situação à polícia. Continua a haver medo da denúncia à polícia, então o que acontece é que o agressor, perante uma denúncia, fica com raiva, volta novamente a cometer violência e a família fica partida.

Quantas mulheres estão actualmente no Centro do Bom Pastor?

De acordo com a licença de serviço concedida pelo Instituto de Acção Social (IAS), podemos acolher 14 pessoas, incluindo os filhos. Actualmente, temos 11 pessoas, seis mulheres, três crianças e duas raparigas a viver no nosso centro. Algumas destas mulheres têm problemas devido aos conflitos emocionais, e, apesar de já terem alguma estabilidade a esse nível, continuam a ter dificuldades financeiras. Muitas dessas mulheres não são residentes permanentes e, por isso, não têm condições para se candidatarem a habitação social do Governo, além de que precisam de mais tempo para poupar dinheiro para poderem pagar uma renda em Macau, que não é barata. No caso de existirem crianças pequenas, é mais difícil para elas encontrarem um emprego a tempo inteiro, pelo que estas mulheres não se conseguem mudar num curto espaço de tempo para uma casa, chegando a ficar um ano no nosso centro. E nesta situação, o centro não consegue ter mais quartos vazios para ajudar outras mulheres em crise.

Considera que são necessários mais centros de acolhimento para vítimas de violência em Macau, ou mais recursos para garantir a segurança da vítima, dado que o território é tão pequeno?

Penso que os recursos são suficientes, mas o processo de investigação é demorado. As vítimas precisam de mais protecção, pois há sempre o risco de o agressor continuar a ameaçá-las.

O que é necessário fazer para aumentar a taxa de natalidade e garantir que as mulheres continuem a ter acesso à igualdade de oportunidades económicas e de emprego?

A promoção precisa de ser contínua, e devem aumentar os dias de licença de maternidade, pois noutros países existem mais dias de licença de maternidade. Também se poderia diminuir o valor mensal das creches. Poderia ponderar-se também a atribuição de um subsídio por cada criança caso a família tenha problemas financeiros.

Há falta de apoio às famílias monoparentais, onde as mulheres ficam sozinhas com crianças dependentes, ou onde as mulheres são cuidadoras? Em termos concretos, o que precisa ser melhorado?

Penso que sim. Penso que algumas delas não sabem que existem recursos na sociedade para as ajudar, ou talvez não tenham motivação para procurar ajuda. Muitas destas mulheres também não querem confiar no Governo, nem mesmo nas associações ou organizações não governamentais que prestam serviços à família. Mas estas mulheres podem sempre candidatar-se ao subsídio atribuído pelo Instituto de Acção Social, que lhes dá algum dinheiro e permite ficar em casa a tomar conta dos filhos.

Como descreve as mulheres em Macau actualmente, especialmente a comunidade chinesa? Estão mais emancipadas e iguais aos homens no que respeita aos seus direitos?

Hoje em dia a capacidade das mulheres mudou muito, pois têm igualdade de oportunidades e direito de se desenvolverem. Muitas empresas locais já são presididas por mulheres, por exemplo. Além de terem força física, podem escolher o emprego que desejam, frequentar o ensino superior, casar e ter a capacidade para assumir posições de liderança. Porém, há muitas mulheres que vêm para Macau e se casam com residentes e que têm uma posição social mais baixa, sofrendo com vários problemas familiares. Falo do machismo que ainda existe, do vício do jogo, situações de toxicodependência ou falta de comunicação. Há homens que controlam tudo, criando um clima em que a mulher tem de ouvir o marido e fica desprovida de auto-estima para sair dessa situação. Nesses casos, é muito fácil haver discussões, conflitos e até casos de violência entre o casal. Trata-se de situações que, obviamente, também afectam os filhos.

Dia Internacional da Mulher celebrado em Macau

O Dia Internacional da Mulher foi celebrado em Macau de formas muito diversas. No caso da Sands China, foram oferecidas flores às trabalhadoras da operadora de jogo, como forma de expressar “o apreço pelas contribuições indispensáveis que as mulheres fazem no local de trabalho, na família e na sociedade”, pode ler-se num comunicado da empresa. Foi também organizado um debate que focou as questões em torno da mulher, organizado pela equipa voluntária da “Sands EmpowHER”, uma “iniciativa global de diversidade e inclusão liderada por mulheres, que tem como objectivo ligar os membros femininos da equipa para criar oportunidades de trabalho em rede”. Este evento foi transmitido em directo nas diversas plataformas digitais da Sands China.

O “Sands EmpowHER” dedica-se, sobretudo, na organização de acções de formação e mentoria para que as mulheres se possam desenvolver em termos profissionais e de carreira.

Na mesma nota, refere-se que a empresa “está empenhada em construir e manter um local de trabalho com respeito e igualdade”, defendendo e garantindo os direitos das mulheres. No tocante ao assédio sexual, a Sands afirma que tem levado a cabo uma campanha de prevenção da ocorrência de casos desde Julho de 2018, bem como acções que reduzam casos de discriminação contra mulheres.

Esta foi “a primeira em Macau”, tendo-se realizado ainda uma “acção de formação com todos os membros da equipa” sobre essas temáticas. Relativamente aos apoios à maternidade, “a empresa também disponibiliza salas de amamentação para mães e realiza uma grande variedade de actividades para pais e filhos para promover a harmonia familiar”.

Na Escola Portuguesa de Macau, o Dia Internacional da Mulher celebrou-se na sexta-feira com o projecto DAC – “Mulheres que Inspiram”, uma iniciativa organizada pelos docentes das disciplinas de Português, Filosofia e Matemática, entre outras. Os alunos do 10º ano desenvolveram vários trabalhos sobre mulheres inspiradoras nas mais diversas áreas. Uma delas foi a poetisa Maria Teresa Horta, recentemente falecida.

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