China / Ásia ManchetePortugal | Vinho, azeite ou cortiça cruzam Nova Rota da Seda Hoje Macau - 12 Jan 202512 Jan 2025 O transporte ferroviário assume-se cada vez mais como uma alternativa eficaz ao comércio por via marítima entre Portugal e a China Reportagem de João Pimenta, agência Lusa No centro do vasto território chinês, a mais de mil quilómetros do litoral, centenas de produtos portugueses chegam semanalmente em comboios de carga, reflectindo a crescente importância do transporte ferroviário no comércio China – Europa. Carregados com vinho, azeite, flor de sal, produtos de cortiça ou os tradicionais sabonetes Ach Brito, os contentores partem de Tilburg, nos Países Baixos, e percorrem quase 11.000 quilómetros, atravessando a Alemanha, Polónia, Bielorrússia, Rússia e Cazaquistão, até chegar a Chengdu, a capital da província de Sichuan. “É muito vantajoso: permitiu que a posição de Chengdu no interior da China se convertesse de periférica para central e reduziu o tempo de transporte, que foi afectado pela instabilidade no Mar Vermelho”, explicou à agência Lusa Ni Xiaozhen, co-fundadora do Pavilhão de Portugal, um espaço destinado à exposição e venda a grosso de produtos portugueses, situado no Porto Ferroviário Internacional de Chengdu. A crise no Mar Vermelho, suscitada pelos ataques dos rebeldes Houthis, forçou as empresas de transportes a desviar navios de mercadorias para o Cabo da Boa Esperança, o que triplicou os preços dos fretes e aumentou o tempo de viagem em 15 dias. “O transporte naval demora, pelo menos, quatro meses. A ligação ferroviária permite reduzir o tempo para apenas 13 dias”, explicou Ni, que emigrou para Portugal em 1998. O custo é também apenas um quinto do frete aéreo. Ainda antes da crise no Mar Vermelho, o transporte ferroviário de mercadorias pela Eurásia foi impulsionado pela pandemia da covid-19, beneficiando das interrupções nas vias aérea e marítima. Pequim construiu na última década alguns dos maiores portos secos do mundo nos países da Ásia Central, capazes de descarregar um comboio de contentores em menos de 50 minutos. A primeira ligação ferroviária foi inaugurada em 2013, com destino final em Almati, a maior cidade do Cazaquistão. Nos últimos anos, novas vias passaram a incluir o resto da Ásia Central, Médio Oriente e a região do Cáucaso, com paragem final na Alemanha, Países Baixos, Polónia, Bélgica ou Espanha. Bem público No ano passado, o valor das mercadorias transportadas por comboios representou mais de 7 por cento do comércio total entre a China e a Europa, segundo dados das alfândegas chinesas. O transporte ferroviário insere-se na Iniciativa Faixa e Rota, ou Nova Rota da Seda, um gigantesco projecto internacional de infraestruturas lançado por Pequim e inspirado nas milenares rotas comerciais que outrora ligaram a China Antiga ao mediterrâneo. “O serviço de comboios de mercadorias China – Europa é um importante vector de cooperação aberta e de benefício mútuo entre os países envolvidos na Iniciativa Faixa e Rota e uma nova rota de transporte, para todas as condições meteorológicas, de elevada capacidade e com baixas emissões de carbono, que se tornou num bem público internacional”, descreveu à Lusa um funcionário da Comissão Nacional de Desenvolvimento e Reforma, o órgão máximo de planeamento económico da China. A iniciativa aproximou Pequim da Ásia Central, região historicamente sob a órbita de Moscovo, composta por cinco repúblicas ex-soviéticas (Cazaquistão, Quirguistão, Tajiquistão, Turquemenistão e Uzbequistão). Na semana passada, o Presidente do Quirguizistão, Sadyr Japarov, deu início à construção da linha ferroviária China – Quirguizistão – Uzbequistão, que terá uma extensão total de 522,94 quilómetros. Presença regular Com uma área de 500 metros quadrados, o Pavilhão de Portugal foi inaugurado em 2021, resultado de uma parceria entre empresários portugueses e chineses. O espaço reúne dezenas de marcas portuguesas, incluindo vinhos, azeite, cortiça ou têxtil. Além do espaço de exposição e venda em Chengdu, o Pavilhão de Portugal tem uma presença regular em feiras especializadas de produtos internacionais na China. Situados em pontos opostos na vasta massa terrestre da Eurásia, Portugal e China distinguem-se também pela dimensão. Com cerca de 1,4 mil milhões de habitantes, o país asiático é a segunda maior economia do mundo e o principal mercado para diversos produtos, desde matérias-primas ou produtos alimentares a bens acabados. Esta escala, no entanto, nem sempre é compatível com a reduzida capacidade de produção das empresas portuguesas, alertou Ni Xiaozhen. “Existe mercado na China para os produtos portugueses, mas falta volume a Portugal para responder à dimensão das encomendas”, explicou. “Mas julgo que, desde que haja trabalho sério, será possível definir estratégias que fomentem o comércio”, vincou.