Um homem velho a pescar sem anzol num rio frio

Ma Yuan (c.1160-1225), justamente admirado e ilustre pintor da dinastia Song do Sul, é geralmente reconhecido como a primeira pessoa a representar um carretel, a bobina em que se enrola a linha da cana de pesca.

Um pormenor singular numa surpreendente pintura figurativa em que apenas se mostra um homem Solitário pescando num rio frio (rolo vertical, tinta sobre seda, 141 x 36 cm, no Museu Nacional de Tóquio). E, de tal modo austera e desprovida de referências espaciais que, na sua abstração ela se percebe como um ponto-chave, não só daquilo que é a representação artística mas também como uma subtil inquirição à substância do tempo.

Quem olhasse aquela figura pescando numa embarcação poderia recordar um ditado: «Só os mais persistentes chegarão à linha de pesca de Jiang Taigong». Que refere a história de Jiang Ziya (1128-1015 a. C.), um estratega que serviu o último soberano da dinastia Shang (séculos 16 -11 a. C.) que se tornara um tirano e que, já com cerca de oitenta anos, os cabelos brancos, foi descoberto pelo rei Wen de Zhou sossegado a pescar sem isco ou anzol no rio Wei, perto da actual Xian. Ele esperava sabendo que os peixes viriam quando estivessem prontos. E foi assim que chegado o tempo favorável, o rei Wen o contratou para grande glória do seu reino.

Outra clara referência da pintura é o poema de Liu Zongyuan (773-819) Neve no rio, que termina com o verso Du diao han jiangxue, «Só, pescando no rio frio, à neve» em que a utilização da palavra du, traduzindo-se como «só», e não gu que seria «sozinho», «abandonado», prova que ele está ali por sua própria volição. Esse poema inspirador está na origem de muitas pinturas. E se um adepto budista poderia saber que um cenário frio como aquele pode ser o lugar propício para encontrar a iluminação espiritual, como prova o caso do «rapaz montanhas nevadas», nome de uma prévia encarnação do Buda Sakyamuni, uma pintura feita na dinastia Ming, levanta outras hipóteses quanto à razão de ele estar ali pescando.

Shi Zhong (1438 – depois de 1506), o autor da pintura e do poema da Paisagem de Inverno com um pescador (rolo vertical, tinta sobre papel, 142, 2 x 32,1 cm, no Metmuseum) foi um pintor profissional de Nanquim cuja pincelada áspera se adequava à pintura dos cenários escarpados do Inverno. No sopé de uma dessas montanhas, Shi colocou o seu pescador de costas com chapéu de bambu e abrigo de palha, elementos que mostram a sua adesão à natureza, e uma comprida cana de pesca que quase chega à margem, mas cujo fio parece estar enrolado para trás e não cai na água.

Subscrever
Notifique-me de
guest
0 Comentários
Mais Antigo
Mais Recente Mais Votado
Inline Feedbacks
Ver todos os comentários