Vistos | Câmara de Comércio Luso-Chinesa pede explicações sobre ausência de Portugal de isenção

A China decidiu isentar, a partir de hoje, os cidadãos de seis países europeus (Suíça, Irlanda, Hungria, Áustria, Bélgica e Luxemburgo) da obtenção de visto para entrar no país. A ausência de Portugal da lista levou a Câmara de Comércio Luso-Chinesa a questionar as autoridades chinesas sobre a matéria. Analistas afastam ligação à polémica com a Huawei e rede 5G

 

A partir de hoje quem tiver passaporte da Suíça, Irlanda, Hungria, Áustria, Bélgica e Luxemburgo está isento visto para entrar na China. A medida, anunciada pelo ministro dos Negócios Estrangeiros, Wang Yi, no passado dia 7 de Março, deixou surpresa a Câmara de Comércio e Investimento Luso-Chinesa (CCILC). Ao HM, o secretário-geral da câmara de comércio Bernardo Mendia confirmou que já foram feitos contactos junto da embaixada da República Popular da China (RPC) em Lisboa no sentido de compreender os motivos para esta ausência da lista de isenções de um país com históricas ligações à China.

“Tomámos iniciativas de solicitar que se aplique também a mesma isenção a Portugal e já tomámos diligências nesse sentido. Mas é, obviamente, uma questão que nos ultrapassa. Pedimos os contactos da entidade [chinesa] para termos uma audiência, para explicarmos porque é importante para os portugueses e comunidade empresarial beneficiar também dessa isenção.”

Para Bernardo Mendia, “justifica-se que Portugal esteja isento de vistos, [a começar] pela relação que tem com Macau, que não é comparável com a de nenhum outro país europeu, pois é uma relação de cinco séculos. Além disso, este ano comemoram-se os 25 anos do processo de transição da administração do território de Macau, que foi exemplar, e há ainda outros motivos históricos que são importantes. Temos também os motivos económicos e comerciais, pois é evidente que a isenção tem também benefícios. Temos esperança de que tenha sido apenas um lapso”, frisou.

Segundo a agência nacional Xinhua, o Ministro dos Negócios Estrangeiros chinês Wang Yi disse esperar, com este novo rol de isenções, que “mais países também ofereçam aos cidadãos chineses uma facilitação de vistos e que trabalhem connosco para construir redes rápidas para viagens transfronteiriças”, declarou. O governante frisou também a necessidade de “incentivo e rápida retomada de voos internacionais de passageiros”. As declarações do dirigente chinês foram feitas à margem da segunda sessão da 14ª Assembleia Popular Nacional.

Wang Yi disse também que esta isenção pode facilitar as viagens dos cidadãos chineses ao exterior, além de fazer com que “os amigos estrangeiros se sintam em casa na China”, tendo sido prometida uma maior cooperação “com as autoridades relevantes a fim de promover a assinatura de mais acordos de livre comércio de padrão elevado, expandir as áreas de livre comércio e manter as cadeias industriais e de fornecimento”, disse.

Y Ping Chow, presidente da Liga dos Chineses em Portugal, considera que esta decisão das autoridades chinesas não visa colocar o país em segundo plano, mas apenas estreitar as relações com as seis nações europeias.

“É fácil a um português de Portugal pedir o visto. Sendo Portugal um país amigo [da China], poucas pessoas podem ir contra essa situação. Possivelmente, a China pode querer uma maior aproximação a estes países a fim de facilitar [os negócios], e pode estar em causa o facto de estes países terem menores relações com a China. Esta isenção de visto pode levar a uma maior aproximação. Acredito que não haverá grande diferença [a ausência de isenção relativamente aos negócios].”

Já o advogado Óscar Madureira recordou que a nova vaga de isenções de vistos surge depois de em Novembro a China ter isentado de visto portadores de passaportes de França, Alemanha, Itália, Holanda e Espanha. “Já nessa altura Portugal ficou de fora e algumas entidades e pessoas lamentaram essa situação. Agora lamento a decisão. Não deixa de ser um pouco estranho e contraditório face ao que é apregoado pelas entidades de ambos os países, que afirmam estarmos no melhor momento das relações entre Portugal e a RPC. Não se percebe muito bem porque a China insiste em deixar Portugal de fora.”

5G, eis ou não a questão

Bernardo Mendia recordou que Portugal também não isentou de visto os cidadãos chineses, destacando que a recente polémica com o afastamento da Huawei do concurso para a entrada da rede 5G no país nada tem a ver com esta questão diplomática.

“Não acho que seja uma reacção ou retaliação. São questões muito distintas. A área da isenção de vistos nada tem a ver com as políticas económicas. Os portugueses também não isentam de visto os nacionais chineses e, nesse sentido, existe uma reciprocidade total. Mas vemos que há países que estão a ter esse tipo de tratamento apesar de eles próprios não isentarem os cidadãos chineses de visto, e obviamente que nos queremos posicionar na linha da frente.”

Importa realçar que Bernardo Mendia tem sido uma voz crítica contra a decisão das autoridades em afastar a Huawei. Em Junho do ano passado, em declarações ao jornal online de economia Eco, Mendia disse estar em causa uma “restrição artificial da concorrência”, com potencial “efeito negativo nos investidores e consequências no desenvolvimento de Portugal e nas excelentes relações entre Portugal e a República Popular da China”.

Nessa data, a CCILC chegou mesmo a propor uma auscultação dos accionistas e não uma “imposição de restrições à actividade da Huawei de forma indiscriminada”.

Óscar Madureira referiu ao HM uma eventual ligação entre esta polémica e a continuação da obrigatoriedade de visto para Portugal. “Há alguns rumores relacionados com o facto de Portugal ter excluído a Huawei do leilão da rede 5G. Se acontece por esse motivo acho mal, mas também não concordo que Portugal tenha excluído a Huawei desse concurso. Não me pareceu haver fundamento aceitável para que a empresa fosse excluída.”

Y Ping Chow, por sua vez, afasta por completo que o caso 5G esteja relacionado com esta questão. “Não são assuntos que estejam relacionados, pois outros países também se afastaram da Huawei antes de Portugal. Portugal foi, talvez, um dos últimos países a tomar essa decisão. Portanto, não há qualquer problema relacionado com essa matéria.”

Em Fevereiro, em declarações ao semanário Plataforma Macau, Bernardo Mendia voltou a reiterar a importância de se avançar para a isenção de vistos entre Portugal e a China. “A inclusão de Portugal no lote de países que não necessita de visto para entrar na China seria muito bem recebida por parte dos empresários”, rematou.

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