Economista do UBS desvaloriza abrandamento chinês e prevê estabilização do imobiliário

Por João Pimenta, da agência Lusa

Uma especialista na economia chinesa destacou ontem a importância de “não extrapolar” nem “misturar” desafios estruturais e cíclicos na segunda maior economia mundial, prevendo uma estabilização no mercado imobiliário do país em 2024.

“A economia chinesa enfrenta certamente enormes desafios, mas eu aconselho a não misturar desafios estruturais com desafios cíclicos, nem a tirar conclusões que extrapolam e concluem que as coisas vão piorar cada vez mais”, afirmou Wang Tao, atual economista-chefe para a China da filial do banco suíço UBS em Hong Kong, à agência Lusa.

“É preciso compreender que a China enfrentou desafios significativos nos últimos 40 anos [de reforma e abertura] e que, em quase todas as etapas, as políticas foram adaptáveis e pragmáticas”, vincou a também autora do livro “Making Sense of China’s Economy”, publicado este ano.

Segundo o FMI, a economia chinesa deve crescer 5,4% em 2023, mas abrandará para 4,6%, em 2024. A instituição previu que, a médio prazo, a economia chinesa vá sofrer um enfraquecimento gradual do ritmo de crescimento para cerca de 3,5%, em 2028, devido a fatores como “fraca produtividade” e o envelhecimento da população. Alguns economistas estão assim a reconsiderar previsões, até recentemente tidas como certas, sobre a ascensão do país asiático a maior economia mundial.

Em particular, o setor imobiliário, que representa entre 25% e 30% do PIB [Produto Interno Bruto], passou a constituir um peso na economia do país, face a uma crise de liquidez, após anos de forte crescimento alimentado pelo crédito. A crise tem fortes implicações para a classe média. Face a um mercado de capitais exíguo, o setor concentra uma enorme parcela da riqueza das famílias chinesas – cerca de 70%, segundo diferentes estimativas. A queda da confiança resultou assim em menos consumo.

Também as finanças das autarquias locais são afetadas pelo declínio na construção, à medida que a queda das receitas fiscais obriga a um corte nas despesas, incluindo salários. Reconhecendo que a recessão no imobiliário está a exercer “grande pressão” sobre a economia, Wang previu que o mercado vai estabilizar nos próximos meses.

“[O imobiliário] vai deixar de ser um motor de crescimento, como foi anteriormente, mas também vai deixar de ser um travão negativo, como foi nos últimos dois anos”, descreveu.

Ela considerou que Pequim podia fazer mais para apoiar a economia, incluindo aliviar a carga fiscal e aumentar as despesas com saúde, educação ou pensões. “As despesas sociais podem ajudar a melhorar a confiança dos consumidores e reduzir a sua taxa de poupança”, frisou.

Wang Tao espera também um aumento da emissão de dívida pública para financiar infraestruturas, o que deve elevar o défice do país para entre 3,5% e 3,8 % do PIB no próximo ano. A sequência de dados económicos negativos – deflação, crise imobiliária ou altas taxas de desemprego jovem – é também consequência da determinação de Pequim de abandonar um modelo de crescimento assente no endividamento insustentável, explicou Wang.

“A economia da China está a afastar-se do tradicional crescimento impulsionado pela dívida, construção e utilização intensiva de matérias-primas”, descreveu. “A China tem que avançar para novas áreas de crescimento para subir nas cadeias de valor”, acrescentou.

Alguns dos planos de Pequim estão a correr de feição: a China ultrapassou, este ano, o Japão como o maior exportador de automóveis do mundo e a transição energética a nível global depende dos painéis solares, turbinas eólicas e baterias produzidos no país.

Wang Tao afirmou, no entanto, que existem desafios, incluindo os crescentes entraves no acesso a alta tecnologia que os Estados Unidos, Europa e Japão estão a colocar à China. “Penso que isso vai ser, obviamente, um obstáculo ao avanço da China nos segmentos industriais avançados”, reconheceu.

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