Exposição | Clara Brito é a mentora do projecto “She Left Her Body”

“She Left Her Body” é o nome da exposição que a designer Clara Brito traz à Casa Garden a partir do dia 23 de Setembro, que reúne trabalhos seus e também das artistas locais Elsa Lei Pui Mio, artista de luzes, Lora Lo Iok Iong, estilista, e Mandy Cheuk Yin Kin, maquilhadora. A possibilidade de dissociação das emoções do corpo de quem as sente é, assim, revelada em diversas expressões artísticas

 

E se abandonássemos o nosso próprio corpo quando vivemos um momento difícil para não sentirmos todas as emoções negativas que brotam a partir dele? Deixando o corpo, não sentimos, e sobrevivemos numa espécie de piloto automático. É esta a ideia por detrás de “She Left Her Body” [Ela Deixou o Seu Corpo], uma exposição com mentoria e curadoria da designer Clara Brito e organizada através da Associação Cultural +853. Nesta mostra, Clara Brito reuniu os seus trabalhos juntando-se a mais três artistas locais de outras áreas, como é o caso de Elsa Lei Pui Mio, artista de luzes, Lora Lo Iok Iong, estilista, e Mandy Cheuk Yin Kin, maquilhadora. O público poderá, assim,observar trabalhos com recurso à caligrafia, instalação, colagem e desenho, entre outras expressões. A mostra nasce depois de uma residência artística realizada este ano pela própria Clara Brito na Casa Garden, apoiada por diversas entidades.

Ao HM, a designer disse que criar esta exposição foi um processo quase novo, com elementos que a própria está a “reavivar”. “Uma das coisas que encaro como sendo nova é o facto de ser a primeira exposição em que, apesar de ser a artista principal, a mentora do projecto e a curadora da exposição, ter convidado três mulheres com perfis, competências e um trabalho criativo diferente do meu. Há uma colaboração entre quatro criativas com experiências diferentes que narram este conceito de deixar o corpo.”

Neste processo, Clara Brito acabou por ir buscar elementos performativos que usava nos projectos que desenvolveu em Portugal antes de se mudar para Macau, há mais de 20 anos. Observa-se, assim, “um lado de fusão entre as indústrias tradicionais, o artesanato, os tecidos e a moda, mas também um lado cenográfico que estava muito presente nas minhas instalações de moda. Para Macau pode ser algo novo, o lado performativo da moda”.

Citada por um comunicado, Clara Brito explica melhor a parte emocional tão intrínseca neste projecto, que começou a ser desenvolvido em 2021. “Fiz algumas leituras e escrevi sobre a fase da vida em que estava a viver, na qual me sentia muito infeliz. Quando visualizo esses momentos, é quase como se eu tivesse deixado o meu próprio corpo, para deixar esse momento [em específico] e apagar as emoções.” Na área da psicologia, o acto inconsciente de colocar emoções de lado e continuar como se nada tivesse acontecido é entendido como uma dissociação.

O projecto pretende ainda passar alguma literacia emocional a quem o vê ou visita, “permitindo que os outros tenham uma vida melhor”. Ao mesmo tempo, Clara Brito recorreu aos materiais tradicionais usados a Oriente, explorando “a oportunidade de fazer uma grande pesquisa desses mesmos materiais e usando-os como uma ferramenta de comunicação, a fim de fazer um trabalho artístico que explora esses conceitos”, referiu ainda, segundo o mesmo comunicado.

Património do amanhã

“She Left Her Body” é um desafio que Clara impôs a si mesma, “[de pensar] o que poderiam ser, em termos artísticos e até filosóficos, os patrimónios do amanhã relacionados com as indústrias”. A mostra é também resultado “de um processo auto-biográfico criativo e artístico, especificamente ligado à ideia de dissociação”. É feito um cruzamento do lado emocional com as ideias de património e de auto-conhecimento. “Sou uma coleccionadora por natureza, uma designer que olha para os materiais e que tem apreço pela indústria e pelas tradições, por esse saber fazer, e pareceu-me um cruzamento interessante.”

A exposição acontece abrangida pelo projecto “Tomorrow’s Heritage” [O Património do Amanhã], no qual Clara Brito participa e que tem vindo a ser desenvolvido “de uma maneira intuitiva e inconsciente já há bastante tempo”, onde se faz um levantamento de materiais e indústrias tradicionais de Macau, Hong Kong e do sul da China. Algo que a designer tem vindo a pôr em prática com colaborações com a marca portuguesa Burel, que fabrica roupas e produtos têxteis com o burel, um tecido feito com lã de ovinos da Serra da Estrela.

“Todos estes projectos de correlação entre o Ocidente e o Oriente, desenhando cá e produzindo lá, e vice-versa, foram trazendo ao de cima uma ideia e uma vontade de fazer um cruzamento [de ideias] e um levantamento das indústrias tradicionais deste lado do mundo na minha relação com Portugal e os países de língua portuguesa”, disse a designer, que, depois de fazer o mapeamento, quis “aproveitar e desenvolver criativamente um projecto que trabalhasse estas indústrias”.

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