Terceira viagem marítima de Zheng He (VI)

A Noroeste de Nanjing, na área exterior da muralha junto à Porta Yifeng, em Xiaguan desde 1407, por ordem do Imperador Yongle (1402-1424) a pedido de Zheng He, estava a ser construído o Templo em honra de Mazu, deusa que salvara a armada de um naufrágio na costa do Reino do Sião (Tailândia) em 1406, durante a primeira expedição.

Agora, no primeiro mês do sétimo ano do reinado de Yongle, em 1409 realizava-se a cerimónia da abertura do Longjiang Tian Fei Gong presidida pelo próprio Imperador, onde, além de conferir à divindade Mazu o título de Tian Fei (Concubina Imperial Celeste), deu a ordem para se realizar a terceira viagem marítima, endereçando-a a Zheng He, Wang Jinghong e Hou Xian. No entanto, andava Zheng He ainda por Malaca, pois só no final do Verão desse ano de 1409 regressaria a Nanjing, terminando assim a segunda expedição marítima.

Segundo o livro “Xin Cha ShengLang, ‘Levantamento dos Países Estrangeiros’”: “No 22.º dia da nona Lua do sétimo ano do reinado do Imperador Yongle (1409) o Imperador ordenou que Zheng He e Wang Jinghong partissem em missão aos territórios bárbaros com uma armada de 48 juncos e uma tripulação de 27 mil homens.” A terceira viagem seria similar à segunda, visitando mais ou menos os mesmos locais.

Do estuário do Rio Yangtzé, partindo do porto de Liujia (刘家港) em Taicang a armada chegou na 10.ª Lua a Changle, próximo de Fuzhou, onde Zheng He ainda nesse mês visitou o Templo a Tian Fei, tendo no 12.º mês saído de Changle e por Wuhumen entrou para o Mar do Sul da China.

A viagem até Champa durou dez dias e em Vijaya (Qui Nhon) a armada dividiu-se, partindo uma frota para o Sião, outra foi para Palembang e Surabaya e a armada principal dirigiu-se para Malaca.

Wang e Hou seguiram para o Sião, Semudera, Coulão e Cochim, enquanto a armada principal comandada por Zheng He foi a Malaca deixar o Rei Parameswara, que em 1409 partira na segunda viagem para visitar a China. Mas outras fontes referem ter o Rei de Malaca embarcado apenas na terceira viagem para pagar tributo ao Imperador chinês, pois quando em 1410 Zheng He chegou ao Reino de Malaca aí instalou o Rei Parameswara no trono, presenteando-o com um robe, chapéu e cinto de oficial e um carimbo de prata. O Almirante dirige-se depois para Calicute e no caminho ter-se-á reunido aos restantes juncos na ponta setentrional da ilha de Sumatra, em Samudra (actual Aché).

Daí acompanhado por a frota capitaneada por Wang Jinghong e Hou Xian, Zheng He na passagem por o Ceilão (Xilanshan, hoje Sri Lanka), em Galle colocou em 1410 uma estela feita em Nanjing a 15 da segunda Lua de 1409 que referia ser este porto vassalo do Império Ming. Estava escrita em três idiomas diferentes e cada um dos textos endereçava homenagem e orações respectivamente a Buda, no texto chinês, a Xiva no tamil e a Alá no texto árabe.

Em chinês podia-se ler: “O Grande Eunuco do Império Ming Zheng He e Wang Jinghong oraram a Buda com o seguinte desejo: Nós pedimos ao benevolente Buda que dê a sua bênção a quem vier ao Templo pedir a bênção. O Imperador Ming enviou-nos a visitar os países do Oceano do Oeste. A nossa viagem foi segura e pacífica. Nós nos lembraremos da benevolência de Buda e a sua protecção para sempre. O donativo que presenteamos ao templo inclui fundos para a construção em mil qian de ouro [3,78 kg], cinco mil qian de prata, 50 rolos de seda e tafetá, quatro pares de bandeiras bordadas a ouro (duas vermelhas, uma amarela e uma verde), cinco incensórios de bronze, cinco incensórios vermelhos, cinco pares de flores de lótus em ouro, 2500 cates de óleo, dez pares de velas e dez pares de incenso de sândalo.”

No final pedia-se a bênção e protecção para as viagens, seguindo a data, sétimo ano do reinado de Yongle (1409). [Esta estela foi levada por um engenheiro britânico em 1911.] O Almirante Zheng He ofereceu tributo a cada um dos deuses.

Viagem de regresso

De Galle, a armada entrando no Mar Arábico percorreu a costa do Malabar (hoje Kerala) na parte Sul do lado Ocidental da Índia, onde se situava Coulão, ou Quilon (Xiaogelan para os chineses), seguindo depois Cochim (Kezhi) e por fim Calicute, hoje Kozhikode. Zheng He apenas aportou em Calicute (Guli) para a sagração do novo Samorim Mana Vikraan, sendo a cidade o maior centro de comércio do Malabar e para além das especiarias era famosa por os panos de calico, ou chita.

Para o Golfo de Cambaia, a Noroeste da Índia (actual Gunjerate), terá seguido talvez a frota capitaneada por Wang Jinghong e Hou Xian, pois a cidade de Cambaia era na altura um importante centro de comércio, que privilegiava os tecidos de algodão (chader cambaiate) em vez das especiarias, mais enraizadas na Costa do Malabar.

No regresso de Calicute, Zheng He ao passar na costa Noroeste da ilha do Ceilão escutou muitas queixas dos reinos vizinhos, então tributários dos chineses, sobre os problemas criados e os actos hostis de pirataria levados a cabo por o autoritário Vira Alakesvara.

Este, também conhecido por Vijayabahu VI, entre 1397 e 1408 fora Rei de Gampola e já em 1406 criara problemas a Zheng He, na primeira viagem da armada chinesa quando passara por o Ceilão, resolvendo o Almirante deixar a ilha e seguir para o destino final, Calicute. Em 1408, Vira Alakesvara perdeu a soberania do reino de Gampura (1341-1410) afastado por Parakramabahu VI (1408-1410), que foi o último rei desse reino, e então dirigiu-se para Kotte, no Sudoeste do Ceilão, onde se instalou e na zona estendeu a governação.

Aí, no reinado de Vikramabahu III (1357-1374), ainda como ministro (1370-1385) do Reino de Gampola tinha feito uma fortaleza e fundara a cidade de Kotte. Agora, em 1411 nesta terceira viagem voltaram os problemas com Vira Alakesvara. Após a armada chinesa aportar em Colombo, Zheng He quis falar com Vira Alakesvara (Rei Alakeshivara) para o colocar na ordem, mas como ele se encontrava em Kotte (Sri Jayawardenepura Kotte), mandou um convite para o Almirante ir até à sua capital. Zheng He dirigiu-se a Kotte por terra com um séquito de 2000 soldados.

O plano de Vira Alakesvara era, enquanto Zheng He estivesse fora, cortar-lhe o caminho e separá-lo dos seus homens que ficaram nos barcos da armada, lançando um ataque-surpresa para os cingaleses pilharem os juncos em Colombo.

Ao saber o que estava a acontecer, Zheng He com a sua tropa e um contingente a ajudar de dois mil cingaleses, descontentes com o rei descendente tamil, invadiu e conquistou a capital Kotte. As tropas do Vira (Rei), à volta de 50 mil, cercaram a capital, mas as inúmeras tentativas falharam, não conseguindo reconquistá-la, pois perderam todas as batalhas.

Os chineses capturaram Vira Alakesvara e destronaram-no, colocando Parakramabahu VI, então Rei de Gampola entre 1409 a 1412, a governar Kotte, que desde então ficou a capital do Reino de Kotte (1412-1597). O ambiente hostil acalmou e a armada não teve mais problemas durante a estadia na ilha. Quando deixou o Ceilão, Zheng He levou preso para a China Vira Alakesvara, com toda a família e muitos oficiais cingaleses.

Voltando a Malaca (Manlajia), Zheng He opôs-se à pretensão do reino de Java no controlo do reino de Malaca e terá então embarcado o Rei Parameswara e esposa com um séquito de 540 pessoas para irem à China prestar tributo ao Imperador da China.

A armada chegou a Nanjing no dia 16 da sexta lua no nono ano do reinado de Yongle (1411). Alakeshvara foi levado à presença do Imperador, que ordenou a sua libertação e retornou no ano seguinte ao Ceilão, tal como o Rei Parameswara, que passou dois meses na capital chinesa.

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