Zeng Zhonglu, professor do Instituto Politécnico de Macau: “Macau está a ficar para trás”

O professor do Centro Pedagógico e Científico nas Áreas do Jogo e do Turismo do Instituto Politécnico de Macau, Zeng Zhonglu defendeu que as autoridades locais deveriam apostar na legalização do jogo online sob pena de atrasar-se face a outros mercadores. O académico sugere a aposta na área da inteligência artificial e afirma que adiar o concurso público para as novas licenças de jogo pode afectar o investimento

 

O especialista em turismo e jogo Zeng Zhonglu disse, em entrevista à agência Lusa, que Macau deve pensar em legalizar o jogo ‘online’ e apostar na importação de talentos que desenvolvem Inteligência Artificial (IA) na China. O professor do Centro Pedagógico e Científico nas Áreas do Jogo e do Turismo do Instituto Politécnico de Macau (IPM) defendeu que “a única forma de Macau desenvolver a tecnologia de IA na indústria do jogo é de recrutar talentos da China continental”.

“A IA é muito importante para o jogo ‘online’. Até ao momento, Macau não tem uma indústria de jogo ‘online’. No futuro, Macau devia considerar legalizar o jogo ‘online’, caso contrário vai atrasar-se, porque outros territórios, outros países, estão a desenvolver esta área muito rapidamente”, avisou, para concluir que, nesta área, “Macau está a ficar para trás”.

Ainda que Macau consiga oferecer casinos e hotéis de luxo, os melhores da Ásia, frisou o académico, hoje o jogo ‘online’ é “uma ameaça potencial para o negócio” para a capital mundial do jogo.

“A competição entre destinos, tornou-se cada vez mais feroz, cada vez mais intensa” e, por isso, “Macau deve distinguir-se (…), deve encontrar um novo caminho”, advertiu o académico, uma vez que os casinos reais de Macau podem começar a ser preteridos.

O docente do IPM sublinhou que um pouco por todo o mundo os jogos ‘online’ “estão a desenvolver-se muito rapidamente, especialmente durante a covid-19”, e que em muitos países, as receitas dos jogos de azar na Internet duplicaram.

Por outro lado, sustentou, o território “deve convidar algumas empresas de tecnologia de ponta, especialmente no sector dos jogos, empresas de ‘software’”, em especial dos Estados Unidos e Austrália, para virem a Macau e utilizarem o conhecimento [sobre o consumidor] de Macau (…) para fazerem produtos únicos”.

Em Macau “as empresas de jogo têm um contacto próximo com os clientes para que possam conhecer os comportamentos ou preferências dos clientes muito melhor do que outros locais”, explicou. Por isso, o território “deve utilizar estes conhecimentos para desenvolver jogos, ‘slot machines’ ou alguns outros produtos de jogo” para o mercado asiático, que conhece bem, afirmou.

Finalmente, Zeng Zhonglu assinalou que Macau tem ainda de encontrar novas formas de atrair turistas, uma vez que as promotoras de jogo já não podem ir à China angariar grandes apostadores, devido a uma mudança legislativa imposta por Pequim.

A questão do concurso

Na mesma entrevista, Zeng Zhonglu disse que o Governo deve manter o concurso de concessão de licenças para casinos em 2022 porque um adiamento pode trazer incerteza e afastar o investimento. Contudo, “se a pandemia continuar este ano e no próximo, o Governo deve ponderar adiar o concurso para as novas licenças”, defendeu o professor.

Ainda assim, sublinhou, “se a pandemia acabar rapidamente, talvez no fim deste ano, acho que o Governo deve seguir o plano inicial” e manter o calendário de 2022 para realizar o concurso para as licenças de jogo.

A razão é simples, justificou: “O adiamento, de uma forma geral, não é bom para a indústria [do jogo] por causa da incerteza”, que “não é boa para fazer investimentos e para se tomarem decisões”. Isto porque “Macau é um mercado muito importante que [as operadoras de casinos] não querem perder”, acrescentou.

O sector do jogo tem enfrentado uma crise devido às restrições nas fronteiras e à falta de turistas. Em 2019, os casinos obtiveram receitas de 292,4 mil milhões de patacas, mas, no ano passado, devido ao impacto causado pela pandemia, a indústria terminou 2020 com receitas de 60,4 mil milhões de patacas, uma quebra de 79,3 por cento em relação ao ano anterior. No ano anterior à pandemia, o território atraiu quase 40 milhões de visitantes.

Legado português já não chega

O especialista em turismo frisou também que o legado português não chega para ‘vender’ Macau aos turistas e que o território tem de descobrir outras narrativas históricas para promover produtos turísticos e reforçar a sua singularidade.

“Macau tem mais de 400 anos de cultura mista de portugueses e chineses. Esta cultura é única. É diferente”, começou por afirmar o académico. “Macau tem, naturalmente, muitos edifícios de arquitectura em estilo português, mas isto não é suficiente”, sublinhou.

A RAEM “deve estudar os 400 anos de história e encontrar mais histórias (…) para que possa desenvolver mais produtos” turísticos, explicou. E Zeng Zhonglu dá um exemplo: “Durante 400 anos, para muitos chineses Macau foi a única saída para países estrangeiros em toda a China. Naquela época, durante os 400 anos, muitos chineses famosos partiram de Macau para outros países. (…) Macau tem de desenterrar histórias”.

A ideia é criar valor acrescentado aos produtos turísticos: “Se o produto turístico tem uma história por detrás, o valor é bastante diferente na mente dos visitantes, por isso Macau deve encontrar os significados destes produtos e descobrir as formas eficazes de comunicar esses significados aos visitantes, para que Macau possa atrair os turistas da cultura a partir dos produtos artísticos, em vez de apenas comida, bebida e compras”.

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