VozesAi Portugal, Portugal João Luz - 6 Mar 20208 Mar 2020 [dropcap]R[/dropcap]egressei de Lisboa no final de Fevereiro, depois de um mês de piadas hilariantes sobre coronavírus e trocadilhos originalíssimos com cervejas mexicanas. Nessa altura, o Covid- 19 era inspiração para comédia caseira de qualidade duvidosa e alvo de relativização digna de QI de dois dígitos. Uma coisa distante, menos grave que a gripe ou uma unha encravada, algo que pode ser curado com um café e um bagaço, coisa de chineses e da histeria colectiva dos medrosos. O coronavírus começou por ser o fartote da época nas redes sociais e fermento do merecido escárnio em relação à sangria desatada do ciclo de 24 horas de notícias, da telenovelização da informação. Apesar de haver quem apelasse ao equilíbrio, à prevenção racional, Portugal parece ter passado da relativização ao pânico num passo único. É sempre assim. Com meia dúzia de pessoas infectadas à altura que esta coluna é escrita, a corrida desenfreada à compra de máscaras esgotou o stock nas farmácias. Entretanto, a corrida à bagaceira curativa parece que nunca aconteceu. Apesar das críticas à capacidade de resposta do SNS, a solução não passa apenas pelo Governo. Além do mais, o SNS teve de ser cortado face à necessidade maior de encher a pancinha de um sistema bancário com ética do Cartel de Sinaloa. A verdade é que sem uma sociedade civil informada e adulta, não existem políticas, ou redes de apoio social, que resistam. Que se saiba, o chicoespertismo não tem efeitos terapêuticos.